O ano de 2025 acaba com muita discussão de evidências na área de Medicina Intensiva. Vários tópicos foram analisados e novas visões de dogmas antigos vieram à tona. Os temas mais prevalentes foram: sepse (37 textos), ventilação mecânica (24), hemodinâmica (18), nutrição (10) e paliativismo (10), e mais emergência, sedação, nefrologia e segurança/qualidade.
É claro que os conteudistas da nossa área têm suas preferências, mas algumas temas foram proeminentes e apresentaram novidades. Na área de infeçcões e sepse, houve debate sobre as definições atuais (até se existe pré-sepse), redefinição do escore SOFA (ampliação de alguns parâmetros e calibração da pontuação) e perspectivas de tratamentos antibióticos (mesmo que não existam novas drogas, o modo de administração e as doses estão em constante revisão). Os cuidados paliativos estão cada vez mais importantes na UTI, principalmente tentando definir quem deve ser incluído e como controlar sintomas de fim de vida. Os vasopressores foram muito “falados”, no sentido de como administrar (em acesso venoso periférico e em combinações ao invés de isoladamente). A ultrassonografia também foi muito comentada, orientando diagnósticos e uso de aminas vasoativas. Na área de ventilação, indicações de intubação traqueal e suas complicações, uso de ventilação não-invasiva de resgate, modos ventilatórios em situações especiais como o paciente neurológico também foram debatidos. Limitações e simplificações foram normatizadas quando o assunto foi suporte nutricional no paciente grave, como restrição de calorias no momento mais agudo e menor quantidade de proteínas.
1. Sepse
- Carga Global e Mortalidade: Em 2021, registraram-se 166 milhões de casos de sepse e 21,4 milhões de mortes relacionadas, representando 31% do total de mortes globais. A mortalidade por sepse não apresentou reduções significativas com novos tratamentos farmacológicos na era Sepsis-3, sugerindo que a heterogeneidade da síndrome dificulta a descoberta de terapias universais.
- Conceito de “Pré-Sepse“: Propõe-se o foco na “pré-sepse”, caracterizada por uma desregulação imune precoce que precede a disfunção orgânica estabelecida, visando permitir intervenções preventivas personalizadas.
- Uso de Antibióticos: Cerca de 80% dos pacientes com suspeita de sepse nas emergências recebem antibioticoterapia de espectro maior que o necessário, e 1 em cada 3 pode ter baixa probabilidade de infecção bacteriana real. Sobre a ordem de administração, priorizar o beta-lactâmico antes da vancomicina pode ser adequado para agilizar o tratamento, embora o impacto direto na mortalidade seja atenuado pelo tempo total de início da terapia.
- Subfenótipos e Prognóstico: A identificação de subfenótipos dinâmicos pode ajudar a personalizar tratamentos, mas ainda carece de validação prospectiva. Curiosamente, pacientes previamente saudáveis (sem comorbidades) apresentam mortalidade hospitalar semelhante aos doentes com comorbidades, possivelmente devido à subestimação da gravidade ou transferências hospitalares.
- Suporte Pós-Sepse: O programa STAR (via telessaúde) reduziu a mortalidade em 90 dias através de monitoramento proativo, embora tenha aumentado as readmissões hospitalares para tratar complicações infecciosas.
2. Hemodinâmica
- Ressuscitação e Fluidos: A dose de 30 ml/kg em até 3 horas permanece como base recomendada, com evidências de que volumes muito baixos ou atrasos acima de 6 horas aumentam a mortalidade. O uso de Ringer Lactato ou Solução Salina em larga escala hospitalar resultou em desfechos clínicos similares. Já a albumina pode oferecer benefícios específicos em pacientes com choque séptico, especialmente em idosos ou em doses mais elevadas.
- Monitorização e Vasopressores: A monitorização do tempo de enchimento capilar (CRT), aliada a sinais como pressão de pulso e ecocardiografia, mostrou-se eficaz para reduzir o tempo de suporte vital no protocolo ANDROMEDA-SHOCK-2. As diretrizes da ESICM 2025 agora focam na perfusão tecidual multimodal como eixo central.
- Estratégias de Suporte: O uso de vasopressores por via periférica mostrou-se seguro e prático, agilizando o tratamento inicial da hipotensão. O início precoce de vasopressina, auxiliado por algoritmos de inteligência artificial, reduziu a mortalidade em quase 20%. Além disso, o adiamento da cateterização arterial invasiva não alterou a mortalidade e reduziu infecções da corrente sanguínea.
3. Ventilação Mecânica
- Desmame Ventilatório: O método de pressão de suporte (PSV) foi superior à “peça T” em avaliações únicas diárias, reduzindo em 40% o tempo até a extubação bem-sucedida.
- Estratégias de Resgate e Posição Prona: O uso de ventilação não-invasiva (VNI) de resgate após falha na extubação reduziu a mortalidade na UTI, embora sem impacto na mortalidade hospitalar total. Na COVID-19, a posição prona ativa (em pacientes não intubados) por 8 a 12 horas diárias reduziu significativamente o risco de necessidade de intubação traqueal.
4. Cardiologia
- Alvos de Pressão Arterial (OPTPRESS): Em pacientes idosos com choque séptico, a manutenção de um alvo de PAM mais elevado (80–85 mmHg) aumentou a mortalidade e eventos adversos (como arritmias e isquemia) em comparação ao alvo padrão de 65–70 mmHg. Não houve benefício dessa estratégia nem mesmo em pacientes com histórico de hipertensão crônica.
5. Infecções
- Pneumonia e Corticoides: O uso de corticoides na pneumonia comunitária grave reduziu a necessidade de ventilação mecânica e o tempo de permanência na UTI. O uso de corticoides (dose equivalente a 60 mg/dia de prednisona) em pacientes com pneumonia comunitária grave não-viral reduziu a mortalidade em 30 dias.
- Infecções Fúngicas e Bacteremia: A prevalência de infecções fúngicas invasivas em UTIs é de cerca de 5%, sendo o Aspergillus spp. o patógeno mais frequente, seguido pela Candida spp. No caso de bacteremia, a febre isolada ou marcadores inflamatórios elevados não devem justificar o prolongamento do antibiótico se o paciente estiver estável; a recuperação de plaquetas e parâmetros hemodinâmicos são melhores preditores de sucesso.
- Multirresistência: Novas diretrizes da SBI orientam o tratamento de Gram-negativos multirresistentes (como A. baumannii e P. aeruginosa) focando em novos inibidores de beta-lactamase e na individualização baseada no mecanismo de resistência local.
6. Diversos
- Cuidados de Baixo Valor: Práticas como exames de sangue e radiografias de tórax de rotina, além da profilaxia universal de úlcera de estresse sem indicação clara, foram identificadas como intervenções de baixo benefício que aumentam custos e riscos.
- Politrauma: O estudo FiiRST-2 demonstrou que concentrados de fatores de coagulação (FC e PCC) não superaram o plasma fresco congelado na redução de transfusões em pacientes com hemorragia maciça.
- Toxicologia: A intoxicação por metanol (bebidas adulteradas) exige diagnóstico rápido para evitar cegueira e óbito; o tratamento envolve inibir a enzima ADH com fomepizol ou etanol, além de suporte intensivo e diálise.
Autoria

André Japiassú
Doutor em Ciências pela Fiocruz. Mestre em Clínica Médica pela UFRJ. Especialista em Medicina Intensiva pela AMIB. Residência Médica em Medicina Intensiva pela UFRJ. Médico graduado pela UFRJ.
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