A coagulopatia induzida pelo trauma (TIC) é uma complicação comum em pacientes politraumatizados e é um fator determinante na mortalidade precoce desses pacientes, sendo responsável por exacerbar hemorragias e dificultar o controle do sangramento nas primeiras horas após o trauma. O manejo hemostático inicial ainda é controverso: os protocolos atuais de ressuscitação utilizam a administração precoce de plasma fresco congelado (FFP) em proporção equilibrada com hemácias e plaquetas (normalmente 1:1:1), especialmente em cenários de hemorragia maciça. O objetivo é corrigir rapidamente a TIC e restaurar a hemostasia. Já em alguns centros europeus, há preferência pelo uso de concentrados de fatores de coagulação, como o concentrado de fibrinogênio (FC) e o complexo protrombínico (PCC), por serem de fácil preparo, armazenamento prolongado e disponibilidade imediata.
O estudo FiiRST-2 foi um ensaio clínico randomizado, multicêntrico e controlado que teve como objetivo avaliar se a reposição com FC + PCC, em comparação ao uso de plasma fresco congelado (FP), reduziria o volume total de hemocomponentes alogênicos transfundidos nas primeiras 24 horas em pacientes com trauma grave.
O grupo FC-PCC recebeu 4 g de FC + 2000 UI de PCC nos dois primeiros pacotes do protocolo de hemorragia. O grupo FP recebeu 4 unidades de plasma em cada um dos dois primeiros pacotes. Ambos receberam 4 unidades de hemácias por pacote e 1 dose de plaquetas no segundo. Dos 217 pacientes randomizados, 137 compuseram a análise principal (66 FC-PCC e 71 FP).
Os resultados mostram que o uso antecipado de FC e PCC não reduziu o volume de transfusão nem melhorou desfechos clínicos comparado ao plasma. Esses achados estão alinhados aos ensaios CRYOSTAT-2 (2023) e PROCOAG (2023), que também não evidenciaram benefício em mortalidade ou complicações tromboembólicas com reposição empírica de fatores de coagulação no trauma grave.
A administração de FC-PCC é logisticamente mais simples e rápida que o FP, mas o benefício clínico permanece não comprovado. O estudo ainda ressaltou a necessidade de seleção mais refinada de pacientes com coagulopatia traumática e uso de testes viscoelásticos em tempo real.

Conclusão
O ensaio FiiRST-2 demonstra que, em pacientes com trauma grave e hemorragia maciça, o uso empírico de concentrados de fibrinogênio e complexo protrombínico não foi superior ao plasma fresco congelado em reduzir transfusões nas primeiras 24 horas nem em melhorar sobrevida ou segurança.
Na prática, esses achados reforçam o papel do plasma como padrão inicial de reposição hemostática, reservando o uso de FC e PCC para casos guiados por testes laboratoriais ou quando há indisponibilidade de plasma, especialmente em contextos remotos ou de transporte prolongado.
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