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Infectologia14 abril 2025

Sarampo: principais aspectos de uma doença reemergente 

O sarampo é uma doença viral, que se propaga por meio de gotículas contaminadas transmitidas pelo contato ou pela dispersão no ar

O atual surto de sarampo nos EUA e em outras regiões do mundo acende o alerta em relação à possibilidade de reintrodução dessa doença em território nacional. Diante do alerta, é importante que os profissionais de saúde estejam atentos em relação ao diagnóstico e prevenção do sarampo. 

Etiologia e epidemiologia do sarampo

O sarampo é uma doença viral causada pelo vírus Morbillivirus, um vírus de RNA pertencente à família Paramyxoviridae. Trata-se de um vírus altamente contagioso, sendo um dos vírus com maior capacidade de transmissão entre pessoas. Os humanos são os únicos reservatórios naturais do vírus do sarampo, embora ele também possa afetar outros primatas. 

Embora seja sensível a ácidos, enzimas proteolíticas e ressecamento, o vírus pode permanecer infectante em gotículas no ar por várias horas, principalmente em condições de menor humidade relativa. A transmissão ocorre por contato direto com gotículas de secreções respiratórias ou por via respiratória a partir de pessoas infectadas. Estima-se que uma pessoa com a doença possa transmitir para até 90% de seus contatos próximos suscetíveis.  

A doença ocorre mundialmente. Sem vacinação, esperam-se que ocorram surtos que podem durar 3 a 4 meses a cada 2 a 5 anos. A imunização, entretanto, é capaz de diminuir de forma significativa o número de casos. 

Atualmente, devido à baixa cobertura vacinal, há uma recrudescência de casos de sarampo em diversos locais. Em 2023, foram registradas mais de 58.000 infecções em 41 países da Europa, o que a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou como “alarmante”. 

Os EUA vêm se destacando por estar em uma epidemia ativa. De janeiro de 2025 até o momento, mais de 600 casos já foram registrados nesse país, o que é mais do que o dobro do número de casos reportados ao Center for Disease Control and Prevention (CDC) norte-americano em todo o ano de 2024. 

Em novembro de 2024, o Brasil recebeu a recertificação de país livre do sarampo, que marca o país como um território livre de sarampo endêmico. O Brasil já havia recebido o certificado em 2016, porém, em 2018 houve reintrodução do vírus no país, que se manteve circulando em território nacional até o ano de 2019. Essa transmissão e circulação sustentadas de um mesmo genótipo (D8) por um período de pelo menos um ano caracterizou o retorno da doença ao status de endêmica. 

Com estratégias combinadas, a transmissão foi controlada e, em 2023, um grupo independente de especialistas convocado pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/MS) – a Comissão Regional de Monitoramento e Reverificação da Eliminação do Sarampo, Rubéola e Síndrome da Rubéola Congênita (SRC) na Região das Américas — categorizou o Brasil como “país pendente de reverificação”. Após um ano sem evidências de circulação sustentada do vírus com um mesmo genótipo, o Brasil foi certificado novamente como país livre do sarampo. 

Quadro clínico 

O período de incubação é de 10 a 14 dias, sendo geralmente um pouco mais longo em adultos do que em crianças. As manifestações iniciais configuram uma fase de pródromo que pode durar algumas semanas e caracteriza-se pela presença de mal estar, febre alta (> 38,5 °C), anorexia, conjuntivite e sintomas respiratórios, como tosse seca e coriza, de forma semelhante a uma infecção de vias aéreas superiores. 

A infecção de toda a mucosa respiratória é o fator patogênico que justifica os sintomas de tosse e coriza tipicamente encontrados. Além disso, o vírus do sarampo pode causar diretamente bronquiolite e pneumonia. O edema e perda de cílios no trato respiratório causado pelo vírus pode predispor a infecções bacterianas secundárias, resultando em complicações conhecidas do sarampo, como otite média e pneumonia. 

Ao final da fase de pródromo, surgem as manchas de Koplik, consideradas como patognomônicas da doença. São descritas como manchas cinza-azuladas sobre uma base vermelha que surgem na mucosa bucal. Mais frequentemente, localizam-se na mucosa oposta aos segundos molares, mas, em casos graves, toda a mucosa oral pode ficar comprometida. As manchas de Koplik podem persistir por vários dias e começam a desaparecer com o início do rash, mas é frequente que não sejam percebidas. 

O rash típico do sarampo é eritematoso e maculopapular e começa na face para posteriormente se espalhar de forma descendente, comprometendo por último as extremidades, incluindo palmas e plantas. À medida que o rash progride, ele se torna confluente, especialmente em face e pescoço. Após um período de aproximadamente cinco dias, começa a fase de cura, com desaparecimento do rash na mesma ordem de sua progressão. Descamação, exceto em palmas e plantas, pode ocorrer nessa fase. 

Uma forma mais branda da doença já foi descrita em pessoas com imunidade passiva parcial, como crianças com menos de 1 ano com anticorpos maternos. Os sintomas são variados e alguns sintomas clássicos, como conjuntivite, manchas de Koplik e rash, podem estar ausentes. O período de incubação também pode estar alterado, sendo mais longo. 

Complicações  

As complicações do sarampo mais frequentes envolvem o sistema respiratório e o sistema nervoso central. Evidências radiográficas de pneumonia são comuns, mesmo em casos aparentemente não complicados. Em crianças menores, pneumonia é responsável por cerca de 60% dos óbitos, enquanto, em crianças entre 10 e 14 anos, as complicações de encefalite aguda são as principais causas de óbito. 

Entre as principais complicações relacionadas com sarampo, destacam-se: 

  • Pneumonia 
  • Otite média aguda 
  • Encefalite aguda 
  • Panencefalite esclerosante subaguda. 

Diagnóstico

Na presença de sinais e sintomas clássicos, o diagnóstico pode ser realizado somente em bases clínicas. Entretanto, idealmente deve-se procurar confirmação laboratorial. 

A sorologia é o método mais frequente, baseada na detecção de anticorpos IgM específicos ou no aumento de sua titulação em amostras pareadas. A primeira amostra de sangue deve ser coletada entre o 1° e 30° dia do aparecimento do rash, enquanto a segunda deve ser coletada entre 15 e 25 dias após a coleta da primeira amostra. 

Outro método laboratorial é a detecção viral por meio de RT-PCR em amostras de secreção nasofaríngea, orofaríngea ou urina. As amostras para realização de diagnóstico molecular devem ser coletadas até o 7° dia de aparecimento do rash. 

Diagnósticos diferenciais 

Entre os diagnósticos diferenciais, vale ressaltar: 

  • Rubéola e outras doenças exantemáticas 
  • Doença de Kawasaki 
  • Escarlatina 
  • Roséola 
  • Mononucleose infecciosa 
  • Enteroviroses 
  • Adenoviroses 
  • Rickketsioses 

Tratamento do sarampo

O tratamento é prioritariamente de suporte, com sintomáticos e terapia de complicações. Para os casos não complicados, devem-se manter hidratação e suporte nutricional adequados e diminuir hipertermia. 

Recomenda-se administração de vitamina A, após avaliação clínica e nutricional, para todas as crianças com suspeita de sarampo em dosagens segundo a faixa etária, com o objetivo de reduzir mortalidade e prevenção de complicações. 

Prevenção 

A principal forma de prevenção é a vacinação. A vacina está liberada a partir dos 6 meses de idade, estando disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) a partir dos 12 meses. 

Atualmente, recomenda-se a vacinação em todas as pessoas entre 12 meses e 59 anos, com duas doses. A vacina contra o sarampo é uma vacina atenuada e, por esse motivo, está contraindicada em gestantes e pessoas com imunossupressão. Duas vacinas estão disponíveis no SUS: tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola) e a tetra viral (sarampo, caxumba, rubéola e varicela). Até o momento, pelo cenário epidemiológico nacional, não há recomendação de vacinação de crianças entre 6 e 12 meses de idade. 

A vacina também pode ser utilizada como forma de profilaxia pós-exposição, quando administrada rapidamente. Indivíduos suscetíveis com contraindicação à vacina e que tenham tido exposição recente (até 6 dias) podem receber imunoglobulina humana como forma de prevenção. 

A vacina é altamente eficiente, porém, devido à alta transmissibilidade do vírus, são necessárias altas coberturas vacinais (aproximadamente 95%) para evitar que haja circulação viral em uma população. Por esse motivo, é essencial reforçar a vacinação em todos os indivíduos suscetíveis em que não haja contraindicações. É importante ressaltar que não há relação da administração da vacina contra o sarampo e o desenvolvimento de condições como o autismo.

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Referências bibliográficas

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