A fibrilação atrial (FA) ocorre em até 40% dos pacientes submetidos à cirurgia cardíaca, com pico nas primeiras 72h, principalmente na presença dos fatores de risco, como aumento atrial esquerdo, pericardite, resposta inflamatória excessiva à circulação extracorpórea (CEC) e distúrbios eletrolíticos (em especial, do potássio e do magnésio).
Das diversas estratégias de prevenção, os betabloqueadores são os mais estudados. Um porém é que muitos doentes apresentam nesta fase uma pressão arterial baixa ou limítrofe, o que impede o uso de doses adequadas dos betabloqueadores.
Pericardiectomia peroperatória
No estudo PALACS, apresentado no congresso da American Heart Association (AHA 2021), os pesquisadores randomizaram 420 pacientes para dois grupos: placebo versus intervenção, que consistiu em pericardiectomia estendida para região posterior-esquerda, justamente próximo ao átrio esquerdo. A ideia foi reduzir o acúmulo de líquido nesta região, o que poderia ser um dos gatilhos para a FA.
A população do estudo tinha mediana de idade 62 anos, 76% eram homens, 45% das cirurgias foram revascularização do miocárdio e outros 53%, troca valvar aórtica; o tempo médio de CEC foi 103 min.
A intervenção foi associada a um risco menor de desenvolvimento de FA, com RR 0,44 (IC 95% 0,27-0,70) – 17% versus 32% de incidência de FA. A mortalidade em ambos os grupos foi baixa, 1%. Na análise de subgrupos, os pacientes com > 70 anos e os submetidos apenas à revascularização do miocárdio não atingiram significância estatística, porém a amostra era pequena, e isso pode ser devido a um “falso negativo” (falta de poder do estudo para um subgrupo tão pequeno).
A taxa de eventos adversos foi similar entre os grupos, em torno 2-3%, exceto derrame e tamponamento, cuja incidência foi menor no grupo da intervenção, justamente pela pericardiectomia.
Qual a mensagem prática?
O estudo precisa ser replicado em amostras maiores, principalmente nos subgrupos que deixaram dúvidas da eficácia. Porém, pelo baixo risco apresentado, pacientes de maior risco e cuja pericardiectomia possa ser feita sem prolongar em excesso o tempo cirúrgico, provavelmente já são candidatos a utilizar na vida real o benefício proposto no estudo.
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Referência bibliográfica:
- Gaudino M, Sanna T, Ballman K V, Robinson NB, Hameed I, Audisio K, et al. Posterior left pericardiotomy for the prevention of atrial fibrillation after cardiac surgery: an adaptive, single-centre, single-blind, randomised, controlled trial. Lancet [Internet]. 2021 Nov [cited 2021 Nov 14];0(0). Available from: http://www.thelancet.com/article/S0140673621024909/fulltext
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