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Psiquiatria12 agosto 2024

Sintomas de Descontinuação de Antidepressivos

A descontinuação de antidepressivos pode provocar sintomas como tontura, dor de cabeça, náusea, insônia e irritabilidade.
Por Tayne Miranda

A descontinuação de antidepressivos pode provocar sintomas que são muito variáveis e inespecíficos, sendo os mais relatados tontura, dor de cabeça, náusea, insônia e irritabilidade. Os sintomas normalmente se iniciam poucos dias após a interrupção e costumam ser transitórios, mas há descrições de sintomas que duram de semana a meses.  

É controversa a incidência e gravidade dos sintomas de descontinuação, uma vez que os estudos disponíveis possuem importantes limitações metodológicas. Quantificar a ocorrência desses sintomas é difícil pelas diversas definições da síndrome de descontinuação e múltiplos procedimentos de avaliação, além do que diferentes antidepressivos apresentam riscos distintos de sintomas de descontinuação. Por fim, os sintomas de descontinuação podem ser confundidos com o retorno da sintomatologia da depressão e por conta da sua natureza inespecífica pode ocorrer mesmo em pessoas tomando placebo.  

Para dar conta de algumas lacunas na literatura, o trabalho de Henssler e colaboradores se propôs a responder três perguntas: qual a incidência dos sintomas de descontinuação, qual a incidência de sintomas de descontinuação entre pacientes tomando placebo e qual a frequência de sintomas graves de descontinuação.  

Leia mais: Revisão do manejo da depressão em adultos

mulher tomando antidepressivos

Método 

Trata-se de uma revisão sistemática com metanálise que seguiu as recomendações do Cochrane’s Handbook for Systematic Reviews of Interventions e as diretrizes PRISMA para relatórios de revisões sistemáticas.  

Estudos nos quais o uso de antidepressivo se desse por razão de transtorno mental, comportamental ou neurodesenvolvimental, incluindo transtornos do sono-vigília e transtornos associados à psicopatologia, como transtorno disfórico pré-menstrual foram incluídos. Estudos sobre condições físicas, como síndromes dolorosas devido a doenças orgânicas e estudos em pacientes neonatais foram excluídos. 

Foram incluídos ensaios clínicos controlados randomizados e não-randomizados e estudos observacionais (caso-controle e corte transversal).  

Resultados 

76 publicações abarcando 79 estudos foram incluídos, com um total de 21002 pacientes. A idade média foi 45 anos e 72% dos participantes eram do gênero feminino. As publicações foram feitas entre 1961 e 2019. 44 (56%) dos estudos eram ensaios clínicos randomizados e 35 (44%) eram estudos observacionais. A duração média do uso do antidepressivo antes da descontinuação variou de 1 a 156 semanas. Os sintomas de descontinuação duraram de 1,5 a 196 dias.  

A taxa de qualquer sintoma de descontinuação de antidepressivos foi de 0,31 (IC 95% 0,27 a 0,35). A meta-regressão não indicou associações significativas de incidência com duração do tratamento antidepressivo, diagnóstico (transtorno depressivo vs. transtorno de ansiedade), risco de viés como variável contínua, ano de publicação ou duração da observação. 

Entre os antidepressivos com evidências de dois ou mais estudos disponíveis, aqueles com maior incidência de qualquer sintoma de descontinuação foram imipramina (0,44; IC 95% 0,25-0,66) e venlafaxina/desvenlafaxina (0,40; IC 95% 0,35-0,45). As medicações com menores taxas de sintomas de descontinuação foram fluoxetina (0,15; IC 95% 0,01-0,80) e sertralina (0,18 IC 95% 0,08-0,35). A incidência de sintomas de descontinuação no grupo placebo foi de 0,17 (IC95% 0,14-0,21). Não houve associação entre essa incidência e o ano de publicação ou duração do tratamento com placebo.  

A incidência de sintomas graves de descontinuação dos antidepressivos foi de 0,028 (IC 95% 0,014-0,057). No grupo placebo a incidência de sintomas graves de descontinuação foi 0,006 (IC 95% 0,002-0,013). As taxas mais altas foram observadas após a descontinuação da imipramina 0,123 (IC 95% 0,015-0,577), paroxetina 0,053 (IC 95% 0,025-0,107) e venlafaxina/desvenlafaxina 0,056 (IC 95% 0,002-0,678).  

Síndromes de descontinuação (em oposição a sintomas) não foram incluídas como um resultado principal nesse estudo porque as definições variam amplamente, restringindo a comparabilidade entre estudos. No entanto, em uma análise post-hoc suplementar, a incidência encontrada foi semelhante entre síndrome e sintomas.  

Discussão 

A incidência dos sintomas de descontinuação é modificada pelo uso de antidepressivos específicos, pelo tipo de instrumento utilizado para detecção dos sintomas e pelo rigor do estudo, mas uma importante heterogeneidade se mantém. O tempo de observação dos estudos não foi um fator associado a incidência de sintomas de descontinuação. É plausível que a meia vida dos antidepressivos afetem não somente a gravidade dos sintomas de descontinuação, mas seu tempo de aparecimento, como evidencia o caso da fluoxetina que possui uma longa meia-vida. Um possível confundidor em ambos os braços é que os sintomas apresentados podem indicar sintomas residuais ou recorrência da depressão em vez de sintomas de descontinuação no sentido estrito. Não houve diferença entre os estudos que faziam uma descontinuação gradual e aqueles com uma interrupção abrupta. Descontinuação gradual dos antidepressivos é recomendada na maior parte das diretrizes e há pesquisas sugerindo que desmame hiperbólico (quando redução é feita de forma não linear, com diminuições menores à medida que a dose se torna mais baixa) substancialmente reduz os efeitos da retirada. Dada sua pequena viabilidade, o desmame hiperbólico não é recomendado a todos os pacientes descontinuando a medicação. 

Veja também: Como diferenças moleculares entre os antidepressivos podem guiar a prática clínica

Limitações 

Na avaliação de medicações específicas, com exceção da desvenlafaxina/venlafaxina, os intervalos de confiança e de predição são amplos, apontando para a natureza preliminar dos resultados. Nenhum estudo abordando o uso de mirtazapina, bupropiona e amitriptilina foi encontrado. 

O desenho e a metodologia do estudo foram objeto de várias análises de subgrupos e de sensibilidade, sugerindo taxas mais baixas de sintomas de descontinuação de antidepressivos em estudos com maior rigor metodológico. Os resultados categóricos não têm a granularidade de resultados contínuos, mas como grande parte da literatura se refere à presença ou ausência de sintomas de descontinuação de antidepressivos, eles foram utilizados dessa forma no trabalho. 

Impactos para a prática clínica 

  • Em todos os estudos e antidepressivos, aproximadamente um terço dos pacientes vão apresentar algum sintoma de descontinuação; 
  • Mesmo em estudos nos quais os pacientes estavam recebendo placebo, sintomas semelhantes à descontinuação ocorreram em 1/6 dos pacientes;  
  • Sintomas graves de descontinuação ocorrem em um a cada 30 pacientes interrompendo antidepressivos; 
  • Considerando os resultados no grupo placebo, aproximadamente metade dos sintomas de descontinuação dos antidepressivos podem ser atribuídos a expectativa e não a sintomas específicos. Desse modo um em cada seis ou sete pacientes tem sintomas de descontinuação de antidepressivos causados farmacologicamente; 
  • Imipranina, desvenlafaxina / venlafaxina e paroxetina têm as maiores incidência de sintomas de descontinuação e fluoxetina e sertralina as menores; 
  • Não houve diferença entre os estudos que faziam uma descontinuação gradual e aqueles com uma interrupção abrupta. 
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Referências bibliográficas

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