Principais tratamentos para tosse e resfriado comum em pediatria
As infecções das vias aéreas superiores (IVAS) consistem em doenças frequentes e autolimitadas, todavia trazem muito desconforto não somente para as crianças, mas também para seus familiares.
Embora existam inúmeros produtos destinados ao alívio da tosse e de outras manifestações clínicas das IVAS, infelizmente a qualidade das evidências sobre sua efetividade é baixa com um risco muito alto de viés. Destaca-se o fato de que a maior parte das pesquisas publicadas descreve não haver benefícios na redução da sintomatologia da tosse. Inclusive, algumas terapêuticas empregadas podem propiciar a ocorrência de riscos expressivos.
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Um artigo Practice Pointer, publicado recentemente no British Medical Journal, descreve terapias comuns para tosse e resfriado comum em pacientes pediátricos de até 12 anos de idade, incluindo dados sobre sua segurança e eficácia, além de fornecer recomendações para profissionais e pais sobre como manejar sintomas incômodos e reduzir o uso de tratamentos inadequados em crianças.
Destaques da publicação estão resumidos a seguir. É importante lembrar que os tratamentos para o resfriado comum não encurtam a duração da doença, mas podem aliviar o desconforto da criança, aliviando os efeitos dos sintomas mais incômodos.
Tratamento medicamentoso das IVAS
As principais classes medicamentosas (disponíveis isoladamente ou em combinação a outros componentes) focam no alívio dos sintomas.
Analgésicos e antipiréticos
- Acetaminofeno/paracetamol e ibuprofeno: indicados para alívio sintomático de dor e da febre em pediatria, seguindo uma abordagem multimodal;
- A combinação ou alternância desses medicamentos pode ser mais eficaz no controle da febre do que o uso isolado;
- Recomenda-se cautela na administração combinada para evitar erros de dosagem;
- A febre é uma resposta fisiológica à infecção: o uso de antipiréticos não diminui a ocorrência de convulsões febris;
- O foco deve ser sempre o manejo do desconforto, ao invés de focar somente na redução da temperatura corporal.
Lavagem nasal com solução salina
- Frequentemente recomendada para aliviar o acúmulo de secreções e a congestão nasal, especialmente em crianças pequenas;
- Reduz o uso de medicamentos descongestionantes. No entanto, as pesquisas são limitadas devido ao pequeno tamanho das amostras e ao alto risco de viés;
- Principal efeito colateral: desconforto durante a aplicação;
- Corticosteroides nasais e descongestionantes nasais não mostraram eficácia significativa considerando a segurança e qualidade das evidências.
Anti-histamínicos
- Reduzem a liberação de histamina;
- São usados frequentemente em combinação com descongestionantes e analgésicos para tratar os sintomas de resfriado;
- Uma revisão da Cochrane não encontrou evidências de sua eficácia para alívio de tosse, congestão nasal ou espirros em crianças pequenas (de 6 meses a 5 anos). Alguns benefícios potenciais foram observados em crianças mais velhas (de 5 a 12 anos). Não se mostraram mais eficazes do que o placebo e foram associados a uma maior incidência de eventos adversos.
Antitussígenos
- Antitussígenos (codeína e dextrometorfano, por exemplo): usados para suprimir o reflexo da tosse. No entanto, uma revisão da Cochrane constatou que eles não são mais eficazes do que o placebo em melhorar a tosse em crianças e uma elevada taxa de eventos adversos está associada ao seu uso;
- Expectorantes (como a guaifenesina): permitem que o muco fique menos espesso. Contudo, sua eficácia e segurança não foram avaliadas em ensaios clínicos em pacientes pediátricos.
Antibióticos
- A maioria das IVAS é viral;
- Têm pouco papel na resolução dos sintomas, exceto na tonsilite estreptocócica A.
Corticosteroides
- Não há ensaios que avaliem o uso de corticosteroides sistêmicos nas IVAS.
Umidificação do ar
- Nenhum ensaio foi identificado avaliando a eficácia do ar aquecido e umidificado em crianças com menos de 12 anos de idade (revisão da Cochrane).
Terapias dietéticas e herbais
- Terapias dietéticas e herbais, como o mel, probióticos e extratos de plantas como Fatsia japonica, são comercializadas para alívio de sintomas respiratórios em pacientes pediátricos;
- Mel: mostrou-se eficaz em reduzir a frequência, gravidade e duração da tosse em crianças com mais de um ano de idade;
- Probióticos: podem reduzir o número de dias de ausência da escola ou da creche (no entanto, há limitação de resultados devido à qualidade dos estudos);
- A Fatsia japonica: mostrou efeito positivo na melhoria dos sintomas (entretanto, as evidências são de baixa qualidade);
- Vaporub: mostrou uma pequena melhoria no sono, sem efeito na rinorreia ou tosse e com aumento de eventos adversos;
- Evidências para o uso de medicamentos patenteados chineses e outros extratos herbais: limitadas e de baixa qualidade.
Segurança
- Embora os riscos de danos em doses terapêuticas não pareçam aumentados, a falta de benefício claro e a baixa qualidade da evidência tornam o uso dessas terapias questionável;
- Ácido acetilsalicílico: nunca deve ser usado em crianças com IVAS (risco de síndrome de Reye);
- O uso excessivo de antibióticos é um problema de saúde global;
- Há preocupação com o risco de danos por exposição não intencional a doses tóxicas. Estudos mostraram um aumento nas internações hospitalares relacionadas a exposições a difenidramina e dextrometorfano;
- A OMS emitiu um alerta sobre xaropes contaminados de venda livre que foram associados a óbitos em crianças. Infelizmente, a proliferação desses produtos é facilitada pela carência de regulamentação de medicamentos em países de baixa e média renda.
Profissionais de saúde
- Podem auxiliar pais e cuidadores, esclarecendo rótulos, explicando riscos e indicando quando buscar atendimento médico adicional;
- Podem oferecer informações baseadas em evidências para a abordagem sintomática domiciliar, como estratégias farmacológicas, psicológicas e físicas, além de alertar sobre sinais de alerta;
- Devem fornecer dados sobre o curso das IVAS e adaptar recomendações à situação de cada criança, considerando idade, peso, história patológica pregressa e recursos financeiros;
- Podem orientar os pais sobre como as crianças podem consumir os medicamentos.
Leia mais: Efeitos da frenectomia em lactentes na amamentação: resultados de nova revisão
Comentários
Revisão bastante prática, mas não cita a dipirona como analgésico e antipirético. A dipirona é amplamente utilizada no Brasil e em outros países, especialmente na América Latina e Europa.
É particularmente popular no nosso país, além de ser acessível e disponível em várias formas farmacêuticas (comprimidos, gotas, solução injetável), sendo frequentemente usada em situações de dor leve, moderada ou intensa e em estados febris.
Em alguns países, especialmente nos Estados Unidos, a dipirona não é amplamente utilizada ou aprovada devido a preocupações com o risco de agranulocitose, uma condição rara, mas grave. Portanto, a ênfase do artigo em acetaminofeno/paracetamol e ibuprofeno reflete as práticas de prescrição e a disponibilidade de medicamentos em diferentes regiões (o artigo é canadense).
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