O teste ergométrico é uma das ferramentas mais úteis na avaliação cardiológica, sendo amplamente utilizada na prática clínica.
Trata-se de um texto de fácil acesso, baixo custo e de fácil reprodutibilidade, o que o torna um grande aliado na tomada de decisão de condutas ou mesmo na elucidação de alguns casos duvidosos.
Mas será que você sabe aproveitar todo o potencial desse exame e interpretar corretamente seus resultados? interpretar os resultados corretamente? Neste guia, você vai entender, de maneira simples e didática, como analisar as principais variáveis do teste ergométrico e como interpretá-las.

Como funciona o teste ergométrico?
O objetivo do teste ergométrico é colocar o paciente em uma esteira ou cicloergômetro e submetê-lo ao exercício incremental até o ponto de exaustão. Existem vários protocolos de exercício como o de Bruce, que visa incrementos programados na carga do esforço (velocidade e inclinação na esteira) com o intuito de atingir um número de METs (ver mais adiante) pré-estipulado. A principal limitação para esse protocolo é o fato de ser engessado e não se alterar de paciente para paciente, sendo bastante prejudicado por indivíduos com capacidade funcional ou mecânica limitadas.
Já o protocolo em rampa é mais flexível, os incrementos no exercício são definidos pelo médico examinador antes do exame. Sendo assim, o profissional pode levar em conta as limitações do paciente e executar um exame mais adequado. Existem outros protocolos para esteira como os de Ellestad, Balke, Naughton, esses menos utilizados na prática clínica.
Durante o teste: variáveis e monitoramento
Durante o teste serão monitorados pressão arterial, a frequência cardíaca, o traçado eletrocardiográfico, além dos sintomas do paciente. Os registros serão realizados no pré-procedimento, a cada dois minutos e no primeiro minuto da recuperação. As fases de exercício e recuperação sãos partes indispensáveis do exame não podendo ser menosprezadas ou encurtadas de maneira fútil.
Critérios relativos para interrupção do esforço
Uma vez iniciado o teste com o paciente na devida posição, devidamente monitorado com os registros pré-teste já realizados, inicia-se a fase de esforço que se encerra somente na exaustão do paciente, ou caso surja algum critério de interrupção do esforço. Em linhas gerais, podem ser considerados critérios relativos para sugerir o término do exercício:
- Elevação da pressão arterial diastólica (PAD) até 120mmHg nos normotensos;
- Elevação da PAD até 140mmHg nos hipertensos;
- Queda persistente da PAS maior que 10mmHg com o incremento de carga, elevação acentuada da PAS até 260mmHg;
- Manifestação clínica de desconforto torácico, exacerbada com o aumento da carga ou associada a alterações eletrocardiográficas de isquemia, ataxia, tontura, palidez, cianose e pré-síncope;
- Dispneia desproporcional à intensidade do esforço;
- Infradesnível do segmento ST de 0,3 mV ou 3 mm, adicional aos valores de repouso na presença de DAC suspeita ou conhecida;
- Supradesnível do segmento ST de 0,2mV ou 2 mm em derivação que observe região sem presença de onda Q;
- Arritmia ventricular complexa;
- Aparecimento de taquicardia supraventricular não sustentada e sustentada, taquicardia atrial, fibrilação atrial, bloqueio atrioventricular de segundo ou terceiro graus;
- Sinais sugestivos de insuficiência ventricular esquerda, com atenção especial no indivíduo idoso, uma vez que o achado de estertores crepitantes à ausculta pulmonar não é infrequente, mesmo na ausência de sintomas;
- Falência importante dos sistemas de monitorização e/ou registro.
Durante o teste, algumas variáveis devem ser avaliadas, elas serão apresentadas a seguir com seu significado e valor, tanto na fase de esforço quanto na fase de recuperação.
Como interpretar o teste ergométrico
Variáveis clínicas
Qualquer sinal ou sintoma observado pelo examinador ou relatado pelo paciente deve ser anotado no laudo do exame. O principal sintoma relatado no exame é o cansaço por parte do paciente, que não deve ser menosprezado em hipótese alguma, sendo uma variável responsável por cessar a fase de esforço. Como o cansaço é algo subjetivo, o médico pode lançar mão da escala de Borg (figura abaixo) a fim de objetivar ao máximo esse sintoma.
Sinais e sintomas como palidez, lipotimia, cianose, vertigem, dores nos membros inferiores devem ser anotados e avaliados conforme a situação. A dor precordial relatada pelo paciente deve ser minunciosamente analisada quanto localização, característica, intensidade e ser relacionada ao ECG, pressão arterial e frequência cardíaca. A dor precordial típica por si só é critério para isquemia no teste ergométrico.

Pressão arterial
Durante o exercício é normal que a pressão arterial sistólica suba de acordo com o incremento do esforço, enquanto a pressão arterial diastólica permanece estável ou cai. Conceitua-se resposta hiperreativa ao esforço o achado de valores de PAS >220 mmHg e/ou elevação de 15 mmHg ou mais de PAD, partindo-se de valores normais de pressão em repouso.
Caso a pressão arterial sistólica suba menos que 35mmHg pode-se pensar em doença isquêmica e dificuldade do miocárdio em contrair durante o esforço. A queda da pressão sistólica durante o exercício é sinal preocupante e está relacionada a doença cardíaca grave. Após o exercício, é normal que a pressão arterial retorne a níveis menores que os níveis basais. Casos em que a pressão arterial se mantenha alta ou aumente durante a fase de recuperação podem estar relacionados a doença isquêmica do coração.
Frequência cardíaca
A frequência cardíaca tende a aumentar conforme o incremento no exercício, o teste ergométrico é considerado satisfatório quando o paciente atinge mais que 85% da frequência cardíaca predita. A previsão da frequência cardíaca é feita através da fórmula: FCMAXIMA PREDITA = 220 – idade (Desvio Padrão = 11 bpm). A elevação exacerbada da FC, desproporcional à carga de trabalho, é usualmente encontrada em sedentários, em pacientes com elevado grau de ansiedade, na distonia neurovegetativa, no hipertiroidismo, nas condições que reduzem o volume vascular ou a resistência periférica, na anemia, nas alterações metabólicas, além de outras.
O uso de drogas com cornotropismo negativo, como betabloqueadores, anti-arrítmicos ou bloqueadores de canal de cálcio, bradiarritmias, hipotireoidismo e doença de Chagas podem resultar numa queda do incremento da frequência cardíaca durante o esforço. A frequência cardíaca reduzida por uso de drogas cronotópicas negativas pode ser corrigida pelo índice cronotrópico:

Assim como a pressão arterial sistólica, casos em que a frequência cardíaca cai durante o exercício demonstram doença cardíaca grave. A queda menor que 12 bpm no primeiro minuto da recuperação em relação ao pico do esforço representa baixa atividade vagal e está relacionada a maior mortalidade.
Alterações eletrocardiográficas
O teste ergométrico é o exame mais indicado para detectar arritmias desencadeadas no exercício, atenção especial deve ser dada a arritmias ameaçadoras a vida que levam a interrupção imediata do teste (citadas anteriormente).
Veja também: 5 dicas sobre arritmias que todo médico deveria saber
Quanto as alterações isquêmicas, essas devem ser interpretadas de maneira semelhante durante esforço e recuperação. Na detecção de isquemia miocárdica, valorizam-se as modificações do segmento ST e da onda U. As alterações do segmento ST incluem infradesnivelamento e supradesnivelamentos aferidos em relação à linha de base. Consideram-se anormais e sugestivas de isquemia induzida pelo esforço, as seguintes alterações do segmento ST, na fase de exercício ou recuperação:
- Infradesnivelamento com morfologia horizontal ou descendente (>1 mm, aferido no ponto J);
- Infradesnivelamento com morfologia ascendente >1,5 mm, em indivíduos de risco moderado ou alto de doença coronária; > 2 mm em indivíduos de baixo risco de doença coronária; aferido no ponto Y, ou seja, a 80 ms do ponto J.
Os supradesnivelamentos do segmento ST são infrequentes, podendo traduzir a ocorrência de grave isquemia miocárdica, espasmo coronário ou discinesia ventricular, assim como na ECG de repouso na síndrome coronária aguda com supra de ST, o supra no teste ergométrico pode indicar a parede acometida pela isquemia.
Consideram-se anormais, mas inespecíficos para o diagnóstico de isquemia miocárdica, a ocorrência de arritmias cardíacas complexas, bloqueios de ramo, dor torácica atípica, hipotensão e incompetência cronotrópica.
Consumo de O2 e MET
O MET ou equivalente metabólico é uma unidade de medida que representa o consumo de oxigênio por unidade de tempo e quilo de peso. Por convenção um MET representa 3,5 ml/kg/min de consumo de oxigênio no corpo de um ser humano em repouso. O consumo de O2 ou VO2 é proporcionalmente equivalente a quantidade de METs, ele é estimado, no teste ergométrico, multiplicando o número de METs atingido pelo paciente por 3,5 (a quantidade de METs consumida em repouso).
Na ergoespirometria ou teste cardiopulmonar o VO2 é medido diretamente. Esta variável está relacionada a mortalidade e valores baixos de VO2 estão relacionados a um prognóstico ruim, assim como níveis elevados de VO2 podem indicar maior sobrevida. Um VO2 muito baixo pode estar relacionado a doença isquêmica importante e pode ser definidor de condutas, inclusive em avaliações pré-cirúrgicas.
Conclusão
Após a apresentação dos conceitos esperamos que o teste ergométrico e sua interpretação fique mais clara e simples, sem deixar passar qualquer variável e sendo capaz de ler o teste como um todo e não apenas as conclusões contidas no laudo.
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*Este conteúdo foi atualizado em: 03/11/2025 pela equipe editorial do Portal Afya.
Autoria

Gabriel Quintino Lopes
Médico Cardiologista; Gerente Médico da Santa Casa de Barra Mansa; Coordenador do Serviço de Cardiologia e Cirurgia Cardíaca da Santa Casa de Barra Mansa; Médico de rotina do CTI da Santa Casa de Barra Mansa; Cardiologista ambulatorial em consultório particular; MBA em Gestão em Saúde pelo Instituto Israelita Albert Einstein (em andamento).
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