Transtorno do estresse agudo e desastres naturais
O transtorno de estresse agudo (TEA) descreve pessoas com reações graves a estresse e que precisam de intervenção clínica. No Manual Estatístico e Diagnóstico de Transtornos Mentais, 5ª edição, texto revisado (DSM-5-TR) o diagnóstico é definido por cinco grupos de sintomas: intrusões do evento traumático, esquiva de estímulos relacionados ao evento, hiperexcitabilidade, alterações negativas do humor e sintomas dissociativos.
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Atenção em meio a desastres naturais
Eventos traumáticos são definidos como eventos nos quais o sujeito experimenta ou testemunha situações de morte, risco de morte ou de graves danos à própria integridade física ou a de terceiros.
Saber que o evento aconteceu com um familiar ou amigo próximo ou ser exposto de forma repetida ou extrema a detalhes desagradáveis do evento traumático, como ocorre com alguns profissionais, como socorristas, também é incluído no critério diagnóstico.
O diagnóstico não se aplica se a exposição for através de mídia eletrônica, televisão, filmes ou fotografias, exceto quando ela está relacionada ao trabalho. O TEA tem duração que varia de três dias a quatro semanas.
Reação aguda ao estresse
Na Classificação Internacional de Doenças – 11ª edição (CID-11), não temos a presença do diagnóstico de TEA, mas sim a reação aguda ao estresse, que se refere ao desenvolvimento de sintomas emocionais, somáticos, cognitivos ou comportamentais transitórios como resultado da exposição a um evento ou situação de natureza ameaçadora ou horrível, dentre eles desastres naturais.
Os sintomas podem ser taquicardia, sudorese, rubor, atordoamento, confusão, tristeza, ansiedade, raiva, desespero, hiperatividade, inatividade, retraimento social ou estupor. Tal resposta é considerada normal pela natureza do estressor e costuma diminuir gradualmente dentro de alguns dias após o evento.
Há bastante discussão quanto ao critério temporal proposto pelo DSM, uma vez que há uma grande demanda de ajuda nas primeiras 72 horas do trauma e que esta é uma janela de intervenção importante por conta da labilidade das memórias traumáticas ainda em consolidação.
Tratamento
Nesta direção, as propostas de tratamento do transtorno do estresse agudo devem considerar que a maioria das reações ao trauma são naturais, adaptativas e transitórias, tornando-se patológicas apenas quando duradouras ou intensas. É importante ainda salientar que a maior parte das pessoas expostas a uma situação traumática vão se recuperar com o passar do tempo, especialmente quando recebem ajuda e têm suas necessidades básicas asseguradas.
Assim, possui maior utilidade clínica pensar em intervenções possíveis em todos os traumatizados agudos, independente de preencherem critérios diagnósticos para TEA ou não.
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Intervenções no traumatizado agudo
O primeiro aspecto importante é evitar debriefing psicológico, ou seja, submeter o indivíduo a entrevistas sistematizadas, ou série de perguntas sobre o ocorrido.
Como alternativa ao debriefing psicológico, temos os primeiros cuidados psicológicos (PCP), modelo de extrema utilidade para profissionais da saúde trabalhando em situações de desastres naturais.
De modo geral, as medidas menos diretivas como suporte e acolhimento são preferíveis nas primeiras horas e dias após o trauma.
Os princípios dos primeiros cuidados psicológicos são:
Observar: verificar a segurança, se há pessoas com necessidades básicas urgentes ou com reações sérias de estresse psicológico.
Escutar: abordar pessoas que precisam de ajuda, perguntar sobre as preocupações e necessidades das pessoas, escutá-las e ajudá-las a se acalmarem.
Aproximar: ajudar as pessoas a resolver necessidades básicas e ter acesso a serviços, bem como lidar com problemas, aproximar as pessoas do seu apoio social.
Podemos sintetizar esses princípios do PCP em um guia prático para a aproximação das pessoas vítimas de desastres naturais:
- Apresentar-se e explicar qual sua função/especialidade;
- Perguntar se a pessoa gostaria de conversar;
- Oferecer algum conforto (pode ser gestos de conforto físico, como dar uma água);
- Ouvir de forma atenta e manter-se próximo à pessoa, mas sem pressionar para que ela fale. Vale lembrar que cada pessoa vivencia os acontecimentos de uma forma singular e que não é a “maior gravidade” do acontecimento que determina mais ou menos sofrimento;
- Validar a experiência emocional (evitar frases como: “Ainda bem que você está viva;” “Vão-se os anéis e ficam os dedos”; “Eu sei o que você está passando”. Formas possíveis de validação são falar: “Sinto muito pelo que houve”, Eu imagino o quão difícil esteja sendo para você”).
- Identifique as preocupações e necessidades da pessoa;
- Ofereça ajuda para contactar a rede de apoio e familiares.
Tratamento psicoterápico
Para pessoas que mantém sintomas após as intervenções iniciais descritas acima, a psicoterapia breve envolvendo psicoeducação é o passo subsequente. Nela os pacientes receberão orientação sobre as reações fisiológicas e emocionais esperadas, vão aprender técnicas de redução de estresse, serão estimulados a tarefas de autocuidado, encorajados quanto a sua habilidade pessoal de lidar com a situação, além de terem garantida a conexão com grupo de apoio.
Intervenções específicas como terapia cognitivo-comportamental focada no trauma, terapia de exposição prolongada e reestruturação cognitiva devem se restringir aos casos que mantém gravidade usualmente após duas semanas ou mais do evento.
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Tratamento farmacológico do transtorno de estresse agudo
Não há evidências que encorajem intervenções farmacológicas no tratamento do TEA. O uso de benzodiazepínicos está contraindicado no TEA por aumentar o risco de desenvolvimento de TEPT.
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