Clínica Médica11 março 2024
A ultrassonografia na avaliação da congestão venosa sistêmica
A dopplerfluxometria dos vasos hepáticos e renais permite a inferência sobre a presença e gravidade da congestão venosa sistêmica.
Na medicina hospitalar, frequentemente nos deparamos com indivíduos acometidos por hipotensão arterial, choque circulatório, oligúria e injúria renal aguda. Nesses cenários, o automatismo de conduta quase sempre culmina com a prescrição de expansão volêmica.
O racional para a expansão volêmica é a premissa de que será convertida em otimização do débito cardíaco e, por consequência, da perfusão tecidual, revertendo eventuais disfunções orgânicas. A resposta clínica, entretanto, pode ser adequada, nula e, em alguns casos, maléfica. De fato, a predição do status volêmico e da fluido-responsividade é um desafio reconhecido e persistente, temperado pela grande variação entre observadores.
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A avaliação pormenorizada da congestão venosa sistêmica pela ultrassonografia é uma das ferramentas que se tem utilizado para guiar a fluidoterapia e diureticoterapia.
A congestão venosa sistêmica, relacionada diretamente ao aumento da pressão venosa central (PVC), tem como principais etiologias a insuficiência cardíaca esquerda, a hipertensão pulmonar de outras naturezas e a insuficiência cardíaca direita.
A hipertensão venosa central gera reflexos hemodinâmicos retrógrados previsíveis sobre o leito venoso esplâncnico, sendo de maior interesse ultrassonográfico as seguintes estruturas:
A análise do diâmetro da veia cava inferior deve ser realizada a 2 cm da junção atriocaval por meio do seu eixo longo à janela subxifoide, estando o paciente em ventilação espontânea e em decúbito supino. O teste é sensibilizado com a manobra da fungada (sniff test), que padroniza o esforço inspiratório.
Dessa forma, como complementação da análise da veia cava inferior, há a proposta de análise da dopplerfluxometria das veias supra-hepáticas, veia porta e veias renais, sob o aspecto qualitativo.
Anormalidades graves no fluxo pelos vasos esplâncnicos:
- Veia cava inferior;
- Veias supra-hepáticas;
- Veia porta;
- Veias renais interlobares.
Veia cava inferior (cm) |
Índice de colapsibilidade (%) |
Pressão média no AD (mmHg) |
< 1,5 |
100% |
0 a 5 |
1,5 a 2,5 |
> 50% |
5 a 10 |
1,5 a 2,5 |
< 50% |
10 a 15 |
> 2,5 |
< 50% |
15 a 20 |
> 2,5 |
0% |
> 20 |
Qual o padrão normal de fluxo nos vasos hepáticos e renais e como ele se altera na presença de congestão venosa sistêmica?
[caption id="attachment_110516" align="aligncenter" width="600"] Onda A (contração atrial), S (sístole) e D (diástole). A onda A é positiva, pois se trata de fluxo retrógrado para a veia supra-hepática a partir da contração atrial. A onda S é negativa, pois se deve à tendência de redução de pressão atrial direita pela excursão do anel tricúspide em direção ao ápice cardíaco durante a sístole. A onda D é negativa, pois decorre da abertura da válvula tricúspide durante a diástole, com direcionamento do fluxo sanguíneo do átrio para o ventrículo direito. A pulsatilidade da veia porta > 30% é considerada anormal. Adaptado da referência abaixo.[/caption]
Protocolo VExUS | |||
Grau |
Congestão |
VCI | Anormalidade grave no doppler dos vasos esplâncnicos* |
0 |
Ausente |
< 2 cm |
Ausentes |
1 |
Leve |
> 2 cm |
Ausentes |
2 |
Moderada |
1 anormalidade | |
3 |
Grave |
2 ou mais anormalidades |
- Reversão da onda S na veia supra-hepática;
- Índice de pulsatilidade superior a 50% na veia porta;
- Padrão de fluxo monofásico na veia renal.
Conclusão e mensagens práticas
- A congestão venosa sistêmica gera repercussões hemodinâmicas retrógradas esperadas na veia cava inferior, veias supra-hepáticas, veia porta e veias renais pelo princípio dos vasos comunicantes.
- A dopplerfluxometria dos vasos hepáticos e renais permite a inferência sobre a presença e gravidade da congestão venosa sistêmica.
- A tomada de decisões quanto à fluidoterapia e diureticoterapia com base em dados ultrassonográficos do protocolo VExUS carece, no momento, de evidência científica mais sólida, sendo uma área profícua para a pesquisa.
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