Como realizar anestesia local em cirurgia plástica
Cerca de 12 milhões de cirurgias plásticas são realizadas anualmente, sendo uma tendência a predileção por abordagens minimamente invasivas e com menos inconvenientes, como dor e limitação pós-operatória. Nesse contexto, a realização de procedimentos de pequeno e médio porte sob anestesia local, com possível associação de sedação, tem possibilitado conforto e manejo da dor de forma eficaz, além de vantagens como a não utilização de IOT, relaxantes musculares, gases e recuperação facilitada com redução de custos.
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Revisarmos, a seguir, os princípios da anestesia local em cirurgia plástica.
Princípios da anestesia local
Seleção do paciente
Fatores inerentes ao paciente devem ser considerados como idade, condição física geral, comorbidades, histórico medicamentoso e personalidade ou preferências. Características do procedimento como complexidade e tempo cirúrgico também influenciam diretamente nessa escolha. Em pacientes limítrofes, com personalidade instável e temores anormais, assim como adolescentes ou naqueles com baixo nível cognitivo à anestesia local deve ser evitada.
Seleção da sedação
Sedação possibilita depressão da consciência, promovendo conforto e reduzindo ansiedade durante o procedimento. Pode ser realizada desde o nível leve, em que o paciente permanece acordado e contactuante, até o nível profundo, com perda parcial ou completa de reflexos protetores. Inicia-se com pré-medicação, que auxilia na redução da ansiedade e de secreções gástricas, podendo ser administrada na noite anterior. Benzodiazepínicos, como lorazepam, são opções viáveis.
A sedoanalgesia é realizada rotineiramente com midazolam (tempo de ação: 3 a 4 horas), diazepam (TA: 6 a 12 horas) ou propofol (hipnótico de efeito muito curto) associada ao fentanil (neurodepressor) ou cetamina (neuroestimulador com efeito dissociativo). Em cirurgias de curta duração, normalmente associa-se midazolam e fentanil, sendo importante, ao selecionar tais medicações, considerar particularidades como tempo de ação e potenciais efeitos adversos.
Seleção do anestésico para anestesia local
A ação dos anestésicos locais ocorre por bloqueio químico direto, por efeitos mecânicos como compressão e distensão neural, além de isquemia nervosa pelos vasoconstritores. Sua ação é influenciada pela concentração, uso de epinefrina, vascularização local e particularidades na inervação.
A lidocaína é uma das mais utilizadas, sua duração é de, em média, 90 minutos, com dose máxima de 7g/kg (25 ml à 2% em um paciente de 70 kg). A bupivacaína é quatro vezes mais potente que a lidocaína, possui início de ação de 15 a 30 minutos e duração de 6 a 12 horas. Sua dose é 1,25 mg/kg (25 ml à 0,5% em uma pessoa de 70 kg).
A vasoconstrição é obtida por meio da epinefrina, em concentração padrão de 1:1000, podendo ser diluída em 100, 500 ou 1000ml. Sua ação tem duração entre 1 e 6 horas, causando isquemia de nervos periféricos e bloqueio de condução.
A adição de bicarbonato de sódio à solução possibilita mudança de pH (6,4 para 7,4), reduzindo estímulo álgico local.
Em cirurgias estéticas, a fórmula de mottura é frequentemente utilizada, consistindo na combinação de 20 ml de lidocaína 2% (7mg/kg) + 20 ml de bupivacaína 0,5% (1,5 mg/kg) + 1 ml de epinefrina (1:1000) diluídas em 400-1000 ml de SF ou RL.
Seleção da técnica
A infiltração é iniciada na região menos dolorosa com infusão lenta na pele com agulha fina e posterior substituição por agulha longa (abbocath 16, por exemplo) ou cânula.
Em ritidoplastias utiliza-se cerca de 150 ml no terço médio (75ml/lado) e 150 ml em pescoço, iniciando a infiltração no couro cabeludo e progredindo para fronte, borda orbital, bochechas e pescoço.
Em mamoplastias redutoras utiliza-se entre 400 e 600 ml de solução a depender do tamanho mamário. O bloqueio inicia-se com 20 a 40 ml no sulco infra mamário, progredindo para infiltração em leque a partir do sulco nos pontos medial (bloqueio dos ramos anteriores dos intercostais), lateral (bloqueio do perfurante lateral) e retroglandular (bloqueio dos perfurantes anteriores). Na sequência as linhas de incisão são infiltradas com 20 a 60 ml, devendo-se evitar o uso de epinefrina abaixo da aréola.
Em mamoplastias de aumento a abordagem é semelhante à redutora se o implante for subglandular. Se a abordagem for axilar o local de incisão deve ser infiltrado, seguido de bloqueio do 4°, 5° e 6° nervos intercostais.
Em abdominoplastias utiliza-se cerca de 600 a 800 ml infiltrados profundamente sobre a fáscia. Já na lipoaspiração pode-se realizar infiltração tumescente com até 3 litros.
Complicações da anestesia local
Reações alérgicas relacionadas à anestesia local são raras. As principais complicações estão associadas a doses excessivas dessas medicações. Os órgãos mais afetados são cérebro e coração, sendo o primeiro mais suscetível. Por isso os primeiros sintomas de toxicidade são neurológicos, como zumbido, vertigens, inconsciência e convulsões.
Sintomas de disfunção miocárdica são tardios. O diagnóstico e manejo precoce da intoxicação são fundamentais para um bom desfecho. Ofertar oxigenação em reservatório, máscara ou IOT, utilização de anticonvulsivantes se indicado (diazepam 10-20 mg ou tiopental 100 – 150 mg), manejo da hipotensão e ressuscitação cardiorespiratória em caso de parada são os princípios para suporte bem sucedido.
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Mensagem prática
A anestesia local é uma ferramenta capaz de amplificar e potencializar o leque de atuação do cirurgião plástico, visto que possibilita realização de procedimentos de pequeno e médio porte com segurança e manejo satisfatório de dor. A seleção minuciosa dos pacientes aptos a essa abordagem, assim como a adequada seleção, diluição e infiltração dos anestésicos, além de capacidade de manejar adequadamente potenciais efeitos adversos constituem os pilares necessários para o uso dessa ferramenta.
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