Melhores práticas em Teleatendimento de UTI – Recomendações de especialistas
Poucos assuntos evoluíram tanto após 2020 quanto o uso de telemedicina. Ela avançou em vários campos, incluindo pronto atendimento, especialidades e psicologia. No entanto, o seu uso para unidades de Tratamento Intensivo (UTI) ainda carece de mais metodologia, objetivos e evidências práticas de desfechos.
Por isso, um conjunto de recomendações baseadas em consenso de especialistas foi realizado, com o intuito de estabelecer melhores práticas em cuidados críticos por telemedicina (CCT). O objetivo principal foi fornecer orientações abrangentes para o desenvolvimento e implementação eficaz de programas de CCT, especialmente diante do crescimento acelerado da telemedicina durante a pandemia de covid-19.
O consenso se baseou na metodologia Delphi modificada, onde um painel de especialistas revisou e votou em declarações de práticas recomendadas. Foram realizados três ciclos de votação, com um índice de concordância maior que o habitual (geralmente 70%) acima de 85% necessário para alcançar o consenso. Participaram do grupo de painelistas: 10 médicos, 5 enfermeiros, 1 farmacêutico e 2 assistentes de cuidado (podem atuar auxiliando médicos e enfermeiros, examinando, revisando exames complementares e auxiliando em procedimentos, talvez se aproximando de coordenadores de cuidado no Brasil). Todos os convidados precisavam ter exercido teleatendimento por um tempo prolongado e ter função de liderança nos locais onde trabalham.
O processo gerou 78 declarações finais organizadas em domínios principais:
- Definições e Terminologia: padronizar termos como “CCT contínuo” (há contato contínuo entre times locais e de CCT, com monitoração contínua de sinais fisiológicos e laboratoriais e de imagem e possibilidade de interação a qualquer momento), “episódico” (as interações entre times locais e de CCT é realizada em momentos específicos e combinados, com revisão de dados do prontuário e se limita a este tempo, às vezes com chamadas “SOS”) e “modelo hub & spoke” (o modelo hub & spoke é um design de rede em que o dispositivo central, ou hub, está conectado a vários outros dispositivos, ou spokes, sendo modelo intermediário entre contínuo e esporádico) para descrever estruturas de serviços. O modelo contínuo é reconhecido como de melhores resultados em alguns estudos, mas ainda está indefinido se deve ser sempre recomendado. Deve haver “handoffs” para passagem de informações entre os times locais e de CCT. É bom lembrar que o modelo episódico pode ser necessário durante situações emergenciais, como desastres e epidemias, porque tem menor complexidade e precisa de menos profissionais.
- Modelos de Entrega de Cuidados: flexibilidade nos modelos para atender necessidades locais; sem evidências suficientes para declarar superioridade de um modelo específico (ex.: contínuo vs. episódico). Isto é recomendado porque os locais que recebem CCT são heterogêneos e suas necessidades podem variar, já que esta modalidade de cuidados à distância ainda é recente e carece de mais evidências para saber a melhor performance entre os modelos.
- Modelos de Cobertura e Equipes: destaca a importância de equipes multidisciplinares com treinamento especializado em cuidados críticos e telemedicina. Sugere a adaptação das proporções de pacientes por profissional às características dos casos e recursos disponíveis.
- Confiança e construção de relacionamento: integrar a equipe local da UTI com o time de CCT é fundamental para aliar debate de casos e de condutas, promovendo entrosamento e demonstrando isso ao paciente e familiares. A documentação desta interação deve estar presente no prontuário do paciente.
- Considerações Tecnológicas e Ergonômicas: salienta a necessidade de infraestrutura confiável, interoperabilidade de sistemas e integração com registros eletrônicos de saúde. Mecanismos de “backup” de dados e vídeos são extremamente importantes.
- Confiança e Construção de Relacionamentos: reforça a importância de alinhar papéis e responsabilidades entre as equipes presenciais e virtuais para construir confiança e eficiência no atendimento. As jornadas devem ser limitadas a 12 horas, de preferência com intervalos regulares para descanso de “tela” e mudanças de posturas. Lugares de trabalhos agradáveis, silenciosos e com boa iluminação devem ser oferecidos para o time de CCT.
- Qualidade, Segurança e Eficiência: defende o uso de ferramentas como suporte à decisão clínica e análise preditiva, ajustadas às condições locais. O valor econômico do CCT é difícil de se avaliar, pois depende da interação com time local e questões relacionadas à segurança (como eventos adversos) são de custo indireto e não contabilizados de modo rotineiro.
- Licenciamento, Credenciamento e Certificação: enfatiza a padronização de processos de credenciamento para garantir a competência técnica e clínica dos profissionais de CCT. Times multidisciplinares, coleta de dados e auditoria no estilo “antes-depois”, incorporação de medicina baseada em evidências, análise estatística, repositórios de dados, informações sobre acesso e disparidade das populações e comparação com programas globais de CCT devem ser buscados na atenção integral digital.
- Agenda de Pesquisa e Advocacia: identifica a necessidade de mais pesquisas para melhorar a base de evidências em CCT. Recomenda esforços para promover políticas públicas e financiamento para programas de CCT e financiamento para formação de currículo e treinamento da equipe de teleatendimento.
Conclusões: melhores práticas em cuidados críticos por telemedicina
O sucesso do CCT depende de equipes especializadas, protocolos claros e tecnologias confiáveis. A implementação deve ser adaptada às condições locais para maximizar a eficácia. Embora a literatura ainda seja limitada, as declarações de consenso fornecem um guia inicial valioso para o desenvolvimento de programas de CCT de alta qualidade.
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