BIS vs avaliação RASS para monitorar sedação do paciente em VM
O Bispectral index (BIS) surgiu na década de 1990 (Sebel et al, J Clin Monit 1995), e é um derivado do eletroencefalograma (EEG), permitindo monitorar a profundidade do paciente durante a anestesia geral. Ele lê ondas cerebrais e estima o grau de despertar através de valores entre 0 e 100, sendo este último com paciente acordado. Como o paciente cirúrgico também é “curarizado”, fica difícil avaliar se o nível de consciência se superficializa no ato operatório, e um dos objetivos iniciais foi evitar este tipo de evento adverso. Secundariamente, é possível também calibrar a dose de anestésicos e sedativos para que não haja excesso de efeito anestésico, desta forma, poupando medicações também. Por fim, quando a cirurgia finaliza, é possível também ter um despertar mais acelerado se o nível de sedação não está tão profundo, e isto reduz o tempo de anestesia.
No entanto, tais efeitos não foram verificados em população crítica em UTI, em pacientes em ventilação mecânica (VM) e necessidade de sedação mais profunda. Neste estudo, os autores avaliaram o uso do BIS em um grupo de pacientes em VM, comparando com a avaliação clínica do nível de sedação habitualmente realizado.
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Metodologia
Foi um trabalho realizado entre 2019 e 2022, randomizando pacientes para titulação de sedativos com o uso do BIS versus avaliação clínica com o escore Richmond Agitation Sedation Scale (RASS). Foi realizado em 1 UTI argentina, incluindo 99 pacientes de um total de 366 incluídos (esta grande diferença foi devida à pandemia de covid-19 que ocorreu ao mesmo tempo e impedia as famílias de darem consentimento do trabalho a contento, a saber nas primeiras 8 horas de início da VM).
As medidas de BIS e RASS foram realizadas de 4 em 4 horas, e mediu-se também a ocorrência de coma ou delirium pela escala CAM-ICU.
O objetivo principal do estudo foi avaliar se havia redução de dias de coma ou delirium com o uso de BIS nos pacientes ventilados com necessidade de sedação profunda nas primeiras 24 horas (RASS -4 ou -5). Secundariamente, as doses de sedativos e o nível de consciência medido pelo BIS foram comparados. O alvo do índice BIS era manter entre 40 e 60 para obter sedação em nível adequado; enquanto pela avaliação clínica seria necessário manter o RASS entre -3 e -4.
Uma observação é que o grupo controle também foi monitorado com BIS, mas a tela do monitor era escondida e o resultado era anotado pelos pesquisadores sem mostrar às equipes médicas e de enfermagem. Se o paciente estivesse com BIS > 60 ou com RASS -5, os sedativos seriam reduzidos em 10%; se BIS < 40 ou RASS maior que -2, os sedativos seriam aumentados também em 10%.
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O grupo com BIS conseguiu maior número de dias sem coma ou delirium no período de 14 dias (mediana 9 vs 3 dias, mas sem significância estatística). No subgrupo de pacientes que precisaram sedação profunda por mais de 24 horas, o resultado foi positivo para o BIS, com redução significativa de coma e delirium.
Outro resultado interessante foi a redução da dose de propofol nos pacientes com BIS; mas não houve diferença com o midazolam. A analgesia foi realizada com fentanil em cerca de 60% dos pacientes nos dois grupos e com morfina no restante.
O nível do BIS foi instável no grupo controle de avaliação clínica: foi de cerca de 30 entre o 3o e 5o dia de VM, enquanto se manteve em torno de 45 no grupo de intervenção. Isto denota que o uso de BIS ajuda a manter o nível de sedação mais estável.
Conclusão
O uso de BIS não reduziu tanto os dias de coma e delirium nos pacientes com sedação profunda, embora tenha ajudado a reduzir as doses de propofol nos pacientes em VM. Para pacientes em VM por mais de 24 horas, houve benefício do BIS para minimizar os dias com coma/delirium.
Desde de que haja redução de custo, o BIS pode se mostrar uma monitoração adjuvante para melhorar a qualidade de uso de sedação em pacientes em VM, principalmente quando é necessária em níveis profundos e/ou com uso concomitante de bloqueadores neuromusculares.
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