EAPS 2024: Uso e abuso de analgésicos em pediatria
Durante o 10º congresso da European Academy of Paediatric Societies (EAPS 2024) o Dr. Karel Allegardt, professor de Neonatologia e Farmacologia Clínica nas Universidades de Logan e Rotterdam, fez contribuições significativas na sobre o manejo da dor pediátrica, abordando aspectos essenciais do tratamento da dor em crianças, com um foco em abordagens tanto farmacológicas quanto não farmacológicas, além de compartilhar suas experiências clínicas e de pesquisa, destacando as complexidades envolvidas no manejo eficaz da dor em crianças.
O Dr. Allegardt reforçou a importância de abordar a dor por meio de intervenções não farmacológicas, além dos tratamentos médicos tradicionais. Ele enfatiza que, ao tratar lesões físicas, como traumas, manejar esta lesão é muitas vezes a maneira mais eficaz de aliviar a dor, não sendo de responsabilidade exclusiva dos medicamentos.
Saiba os desafios no manejo da dor pediátrica
Durante sua apresentação, o Dr. Karel trouxe aspectos relacionados a sua própria pesquisa, destacando um problema chave no manejo da dor pediátrica: apesar de sistemas de saúde bem organizados e diretrizes claras, as crianças frequentemente recebem tratamento inadequado para dor após cirurgias ambulatoriais. Um estudo realizado nos Estados Unidos (EUA) apresentado durante a plenária revelou que muitas crianças não receberam os medicamentos prescritos após a alta hospitalar.
O Dr. Allegardt replicou um estudo semelhante em Leuven, na Bélgica, e descobriu que, mesmo quando os pais eram treinados para avaliar a dor e recebiam prescrições, muitos se mostravam relutantes em administrar os medicamentos devido ao medo de dependência, toxicidade ou a descrença de que seus filhos realmente estivessem com dor. Isso destaca a importância de educar pais e cuidadores sobre o manejo adequado da dor e combater equívocos comuns, sendo o pediatra peça fundamental desse processo de educação em saúde.
Qual o impacto das crenças dos pais na administração de medicamentos?
Uma das principais razões pelas quais as crianças não recebiam o alívio adequado da dor nos estudos de Allegardt era o desconforto ou a descrença dos pais sobre a necessidade do medicamento. Muitos pais temiam a dependência ou efeitos colaterais, ou acreditavam que seu filho demonstrava sinais claros de dor intensa se realmente estivesse sofrendo, o que não é uma verdade absoluta.
Todas estas evidências reforçam a necessidade do pediatra e/ou demais profissionais envolvidos no cuidado da criança, envolverem os pais nos planos de manejo da dor e abordarem suas preocupações diretamente, garantindo que as crianças recebam o tratamento adequado em casa.
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Eficácia dos diferentes analgésicos no tratamento da dor pediátrica
Foi explorado também durante a sessão a eficácia de diferentes tipos de analgésicos no tratamento da dor em crianças. O Dr. Karel explicou que analgésicos mais potentes, como os opioides, nem sempre são a melhor opção para tratar lesões comuns. Por exemplo, em casos de dor traumática, como um tornozelo torcido, o ibuprofeno é frequentemente mais eficaz do que o paracetamol ou a codeína, pois aborda tanto a dor quanto a inflamação. Isso destaca a importância de selecionar o analgésico mais apropriado para cada tipo específico de dor, em vez de depender de uma escalada padrão de medicamentos.
Nenhum medicamento é isento de efeitos colaterais, e isso inclui os mais comuns, como os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs), paracetamol e opioides, todos apresentando riscos que podem variar conforme o paciente e a condição que este paciente possui naquele momento. Os AINEs, como o ibuprofeno, embora eficazes para dor e inflamação, trazem preocupações específicas, como potenciais alterações renais, úlceras gástricas e aumento do risco de infecções em crianças com varicela.
Já o metamizol, popular em países de língua alemã, está relacionado à agranulocitose, um efeito colateral grave que pode ser exacerbado por fatores genéticos em populações específicas. Além disso, o paracetamol, apesar de sua ampla aceitação e tolerância, pode causar toxicidade hepática especialmente em doses elevadas, com crianças com doenças musculares sendo mais vulneráveis.
Uma visão diferente sobre a dor pediátrica foi apresentada, abordando aspectos da farmacogenética, que desempenha um papel crucial na resposta aos medicamentos, visto que a variação genética pode afetar a metabolização de opioides como codeína e tramadol, resultando em respostas variáveis entre pacientes. Essa variabilidade também se aplica a neonatos, onde a genética pode influenciar a efetividade de medicamentos administrados durante a gravidez, destacando a importância de considerar as características individuais na terapia medicamentosa
Mensagem prática
- Embora os medicamentos sejam essenciais para o manejo da dor e da febre, é crucial entender e reconhecer os riscos associados, especialmente em populações vulneráveis, como crianças com condições de saúde específicas ou diferenças genéticas;
- Não existem medicamentos sem efeitos colaterais. Os pediatras precisam estar atentos aos riscos específicos associados a fármacos de prescrição comum, como AINEs, paracetamol e opioides, e devem considerar sempre as variações genéticas individuais que podem influenciar as respostas inesperadas;
- Adaptar os tratamentos a esses fatores pode melhorar significativamente a segurança e a eficácia no cuidado dos pacientes.
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