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Pediatria19 outubro 2024

EAPS 2024: Impactos do uso inapropriado de antibióticos em recém-nascidos

A discussão focou nos impactos negativos do uso dos antibióticos no microbioma infantil e no aumento da resistência antimicrobiana
Por Jôbert Neves

O Dr. Martin Stocker trouxe uma visão detalhada sobre o dilema do uso de antibióticos em recém-nascidos, propondo a abordagem de que “menos é mais”, durante o 10º congresso da European Academy of Paediatric Societies (EAPS 2024). Ele destacou a importância de evitar o uso excessivo de antibióticos em bebês, especialmente nos primeiros dias de vida, considerando os riscos associados ao uso indiscriminado desses medicamentos, devido ao impacto negativo dos antibióticos no microbioma infantil e no aumento da resistência antimicrobiana e suas consequências.

médica consultando recém-nascido

Uso de antibióticos em bebês

Vale lembrar que o foco da discussão não foi o tratamento de bebês com sepse confirmada, mas sim daqueles que são tratados preventivamente, sem confirmação ou sem sinais clínicos evidentes deste processo infeccioso. O palestrante reconheceu a importância de tratar a sepse neonatal, mas questionou a prática de administrar antibióticos antes que a infecção seja confirmada, o que ocorre com frequência em muitos hospitais, destacando os seguintes pontos:

  • Resistência antimicrobiana: A resistência aos antibióticos é um problema global crescente. O Dr. Stocker mencionou que mais de um milhão de mortes anuais são atribuídas a infecções resistentes a medicamentos. Essa questão, reconhecida há décadas, se tornou ainda mais relevante com o aumento da conscientização sobre as consequências a longo prazo do uso de antibióticos.
  • Impacto no microbioma: O desenvolvimento do microbioma infantil, especialmente nos primeiros dias de vida, desempenha um papel fundamental no futuro da saúde da criança. O Dr. Stocker menciona que perturbações no microbioma, causadas pelo uso precoce de antibióticos, podem afetar o desenvolvimento imunológico e metabólico, contribuindo para o aumento de doenças crônicas, como obesidade, diabetes e asma. Ele destaca estudos recentes que mostram que mesmo 48 horas de exposição a antibióticos podem ter um impacto duradouro no microbioma de bebês.
  • Outras influências: Além do impacto direto dos antibióticos, o Dr. Stocker menciona outros fatores que moldam o microbioma infantil, como a nutrição materna durante a gravidez, o aleitamento materno e até mesmo fatores psicológicos, como a ligação entre pais e bebês. Esses fatores, aliados à epigenética, mostram que a forma como cuidamos dos bebês no início da vida pode afetar não apenas sua saúde imediata, mas também seu bem-estar a longo prazo.

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Todos estes dados corroboram as evidências que mostram que bebês expostos a antibióticos nos primeiros dias de vida têm microbiomas alterados até um ano depois. Esses achados são preocupantes, pois indicam que o início do tratamento antibiótico pode ser mais prejudicial do que a duração do mesmo, trazendo um grande desafio para a prática clínica que é a ideia de encurtar a duração da terapia antibiótica, quando possível.

Seria o aleitamento materno uma potencial solução? A resposta é: em partes. A ideia de que o aleitamento materno possa compensar completamente os efeitos adversos dos antibióticos no microbioma infantil é real, porém, apesar do leite materno ser benéfico, o palestrante sugere que seu impacto positivo é limitado em comparação com os danos causados pela exposição precoce aos antibióticos.

Discrepância entre tratamento e incidência de sepse

As discussões sobre o uso racional de antibióticos, especialmente em lactentes jovens, é sustentada pela discrepância entre a quantidade de pacientes tratados e a incidência de sepse. O Dr. Stocker compartilhou dados de sua instituição na Suíça, onde 2% dos recém-nascidos são tratados com antibióticos para sepse suspeita, mas apenas 0,02% realmente têm sepse confirmada. Isso significa que, para cada 100 bebês tratados com antibióticos, apenas um realmente tem a doença. Esse desequilíbrio é alarmante e aponta para a necessidade de repensar os critérios de prescrição de antibióticos.

Mas quais as motivações por trás do uso excessivo de antibióticos?

O medo é um dos principais fatores que impulsionam a prescrição excessiva de antibióticos, já que médicos temem perder um caso grave de sepse, podendo levar a morte do paciente. Além disso, o Dr. Stocker menciona “viés e ruído” como influências significativas nas decisões médicas, além de uma tendência a preferir ações imediatas (como prescrever antibióticos) em vez de esperar por mais dados clínicos e laboratoriais.

Mensagem prática

Existe uma grande necessidade de uma abordagem mais equilibrada e criteriosa ao se prescrever antibióticos para recém-nascidos. A proposta feita pelo palestrante é de que, em vez de tratar profilaticamente todos os bebês com suspeita de sepse, os pediatras e neonatologistas devem se concentrar em aprimorar o processo de diagnóstico, reduzindo o uso desnecessário de antibióticos. O impacto no microbioma infantil e o risco de resistência antimicrobiana são preocupações sérias, e o objetivo deve ser encontrar formas de proteger os bebês tanto de infecções quanto dos efeitos adversos do uso excessivo de antibióticos.

Veja todos os destaques do evento aqui!

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