Um caso clínico muito interessante de torcicolo adquirido espontaneamente (TAE) foi apresentado no European Academy of Pediatrics Congress (EAP 2021).
O TAE é uma complicação frequente em Departamentos de Emergência Pediátrica (DEP). Na maioria dos casos, resulta de contratura muscular devido à má postura ou após infecções de vias aéreas superiores (IVAS) que causam linfadenite cervical. No entanto, é imperativa a exclusão de outras etiologias diante de um paciente com torcicolo persistente.
Torcicolo espontâneo
Ana Sofia Rodrigues e colaboradores (Portugal) relataram o caso de uma menina de 10 anos que deu entrada no DEP com história de 37 dias de dor cervical de início súbito e lateralização do pescoço para a esquerda. Essa paciente tinha um relato de perda de 7 anos de acompanhamento genético, devido a um fenótipo longilíneo, hiperfrouxidão ligamentar, palato ogival e afinamento capilar.
Não havia nenhum relato de trauma ou infecção prévios. Essa criança já havia sido atendida anteriormente outras vezes no DEP e foi medicada com anti-inflamatórios não esteroidais e relaxantes musculares, além de imobilização com colar cervical, porém sem nenhuma melhora.
Ao exame, a criança apresentava torcicolo doloroso com rotação cervical completa para a esquerda e elevação do ombro direito. Seu fenótipo era do tipo longilíneo com tronco curto, aracnodactilia, hiperfrouxidão ligamentar e deformidade vertebral com hipercifose sacrococcígea, todas sugestivas de doença do tecido conjuntivo. A avaliação puberal evidenciou Tanner III. O exame neurológico era normal. Foi realizada tomografia computadorizada (TC) cervical que revelou subluxação rotatória atlantoaxial à esquerda (cerca de 45 graus).
Essa paciente foi encaminhada ao Serviço de Ortopedia e Traumatologia de um hospital terciário português, onde foi realizada ressonância magnética da coluna cervical, evidenciando subluxação atlanto-occipital e subluxação rotatória de C1-C2 à esquerda.
Com base nessas imagens, foi então submetida a tração craniana, com TC confirmando a redução e atualmente aguarda fusão espinhal definitiva. Após a alta, ela segue mantendo acompanhamento multidisciplinar.
Os autores destacaram que o torcicolo espontâneo tem um amplo espectro de apresentação: benigno e autolimitado a quadros graves e potencialmente fatais, sendo essencial uma avaliação diagnóstica minuciosa. As subluxações atlanto-occipital e atlantoaxial não traumáticas são raras e secundárias a um quadro infeccioso ou, menos frequentemente, associadas a doenças reumatológicas ou síndromes genéticas.
Este caso é bastante intrigante e mostra uma causa rara de torcicolo e a relevância da anamnese e exame físico cuidadosos e completos, em busca de manifestações clínicas que possam indicar uma doença de base.
Estamos fazendo a cobertura do EAP 2021; acompanhe com a gente!
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