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Pediatria24 março 2025

Caso crítico que o pediatra deve reconhecer: intussuscepção em neonatos

A intussuscepção é uma das principais causas de obstrução intestinal em lactentes e crianças pequenas, ocorrendo mais frequentemente entre 3 meses e 6 anos de idade.
Por Jôbert Neves

Em neonatos, a intussuscepção é uma condição é extremamente rara, representando apenas 0,3% de todos os casos de intussuscepção e aproximadamente 3% das obstruções intestinais neonatais. A raridade da intussuscepção neonatal contribui para o seu diagnóstico tardio, pois sua apresentação clínica muitas vezes se confunde com outras condições neonatais, como a enterocolite necrosante (NEC). O reconhecimento precoce e a intervenção cirúrgica imediata são fundamentais para melhorar os desfechos e reduzir a morbidade e a mortalidade.  Um relato de caso publicado no Journal of Pediatrics & Neonatal Care ilustrou os desafios diagnósticos da intussuscepção neonatal e destacou lições essenciais para pediatras gerais, neonatologistas e cirurgiões pediátricos.  

Apresentação do caso de intussuscepção em neonato

Uma recém-nascida do sexo feminino, com 13 dias de vida, apresentou febre persistente por 11 dias, distensão abdominal progressiva por 5 dias e eliminação de fezes mucossanguinolentas por 2 dias antes da internação. Também apresentava irritabilidade, recusa alimentar e um episódio isolado de vômito não bilioso.  

O parto ocorreu por cesariana de emergência devido à pré-eclâmpsia materna, e a bebê foi alimentada com fórmula devido a dificuldades na amamentação materna, sem outras intercorrências. Ao exame físico, a paciente apresentava sinais de desconforto respiratório, febre (38,4°C), palidez, desidratação, taquicardia e taquipneia. O abdome estava levemente distendido, com uma massa palpável na região lombar direita. 

Os exames laboratoriais iniciais estavam dentro dos limites normais, levando a um diagnóstico preliminar de NEC. No entanto, a persistência dos sintomas e a piora do quadro séptico levaram à realização de novas investigações. Um hemograma repetido no segundo dia mostrou leucocitose, trombocitopenia e uremia. A radiografia abdominal revelou ausência de gás no lado direito do abdome e na pelve, levantando a suspeita de intussuscepção. 

Achados cirúrgicos e evolução 

A paciente foi submetida a uma laparotomia exploradora, que revelou uma intussuscepção ileocecal estendendo-se até o ceco, além de uma intussuscepção íleo-ileal com um segmento ileal gangrenoso. Nenhum ponto patológico de invaginação foi identificado. O segmento gangrenoso foi ressecado e realizada uma anastomose término-terminal íleo-ileal, seguida de lavagem peritoneal copiosa. 

Apesar do suporte pós-operatório intensivo, incluindo hidratação intravenosa, antibióticos de amplo espectro e múltiplas transfusões sanguíneas, a criança evoluiu com sepse grave e falência múltipla de órgãos. Infelizmente, a paciente faleceu no sétimo dia de pós-operatório. 

Discussão 

A intussuscepção neonatal continua sendo um desafio diagnóstico devido à sua apresentação atípica e raridade. Diferente dos casos clássicos em lactentes mais velhos, os neonatos raramente apresentam os sintomas característicos de dor abdominal em cólica, massa abdominal palpável e fezes em “geleia de framboesa”, tópica dessa condição. Em vez disso, os sinais predominantes incluem intolerância alimentar, distensão abdominal, vômitos biliosos e sangramento retal—sintomas frequentemente confundidos com NEC,  muito mais prevalente nesta população.  

O diagnóstico pré-operatório é particularmente difícil em neonatos, pois os achados radiológicos tradicionais podem não ser conclusivos. Neste caso, o atraso no diagnóstico contribuiu para a evolução séptica grave, resultando em um desfecho desfavorável. A ultrassonografia abdominal continua sendo o exame de escolha para o diagnóstico, mas a suspeição clínica deve ser elevada para evitar erros diagnósticos. 

Além disso, a ocorrência de múltiplas intussuscepções, como observado nesta paciente, é extremamente rara em neonatos. A maioria dos casos descritos na literatura envolve uma única localização de intussuscepção, sendo os casos múltiplos mais comuns em adultos e crianças mais velhas. A ausência de um ponto de invaginação patológico reforça a hipótese de que a intussuscepção neonatal pode ser idiopática ou secundária a alterações na motilidade intestinal. 

Mensagem prática  

A intussuscepção neonatal é uma condição rara, mas potencialmente fatal, que exige alta suspeição clínica para diagnóstico precoce. Pediatras devem considerar a intussuscepção em neonatos com sintomas semelhantes à NEC, especialmente quando o curso clínico for menos severo do que o esperado ou quando houver resposta inadequada ao tratamento clínico. A realização precoce de exames de imagem e a intervenção cirúrgica oportuna podem melhorar significativamente as taxas de sobrevida. 

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Referências bibliográficas

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