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Neurologia18 outubro 2024

Trombose de seio cavernoso: como reconhecer e proceder 

A trombose do seio cavernoso (TSC) é uma condição grave que apresenta uma alta taxa de morbidade e mortalidade.
Por Danielle Calil

A revista American Journal of Emergency Medicine, nesse ano, realiza uma série de publicações com temas de doenças de baixa prevalência e alto risco encontrados no departamento de emergência. Um dos temas selecionados é a trombose de seio cavernoso (TSC). Embora seja condição rara, o médico deve ter conhecimento sobre quando suspeitá-la mediante a sua alta morbimortalidade. 

Trombose de seio cavernoso: como reconhecer e proceder 

Imagem de freepik

Epidemiologia e fisiopatologia 

A trombose de seio cavernoso resulta da formação de um coágulo no seio cavernoso. Possui incidência em torno de 2-13 casos a cada milhão de pessoas-ano. Afeta mais comumente adultos entre 20 e 50 anos com uma predominância levemente maior em homens. 

Geralmente há duas formas para o surgimento de TSC: séptica (mais comum) e asséptica. Nos casos sépticos, a trombose de seio cavernoso é resultante de infecção local como sinusite, infecção facial, tromboflebite ou embolo séptico. A maioria dos casos infecciosos é decorrente de infecção bacteriana (envolvendo Staphylococcus aureus em 70% dos casos, Streptococcus pneumoniae em 20%, espécies orais anaeróbicas em < 10% dos casos e bacilos gram-negativos em 5%), ainda que casos virais e fúngicos (este último principalmente em imunocomprometidos) possam ocorrer. As causas assépticas são variadas, podendo contemplar: trombofilias, cirurgias/traumas oculares ou maxilo-faciais, doenças sistêmicas (autoimunes), tumores intracranianos e medicamentosos. Ainda assim, em 25-30% dos casos a TSC pode possuir fonte indeterminada. 

Houve uma mudança do prognóstico dessa condição ao longo do tempo. Considerando as causas sépticas relacionadas à trombose de seio cavernoso, a mortalidade dessa condição recentemente caiu de 80-100% antes da introdução de antibióticos para 11-30%. 

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Manifestações clínicas 

As manifestações clínicas de TSC são heterogêneas. Um dos principais sintomas é cefaleia, em até 90% dos casos, com padrão típico unilateral e localização retrobulbar ou frontotemporal. Sintomas sistêmicos como febre podem ocorrer em 94% dos casos ainda que de modo intermitente. 

Manifestações oculares como edema periorbital, quemose, proptose e oftalmoplegia também podem estar presentes no quadro clínico. Em casos graves, pode ocorrer cegueira diante de elevada pressão intraocular ou trombose associada. 

Manifestações neurológicas podem ocorrer como crises epilépticas, confusão mental e déficits neurológicos focais. Entre os déficits focais, é importante destacar a oftalmoplegia, presente em 50-88% dos casos, diante da compressão de nervos relacionados à motricidade ocular extrínseca (nervo oculomotor, troclear e abducente), além de perda sensitiva em áreas inervadas pelo nervo trigêmeo também diante de compressão. Esses déficits ocorrem porque os nervos cranianos III, IV, V e VI possuem segmentos que atravessam o seio cavernoso, tornando-os suscetíveis à compressão nesse local. 

Diagnóstico 

Em casos de suspeita clínica, a realização de tomografia de crânio de órbita e crânio com contraste intravenoso tardio pode ser realizado na emergência. A detecção da trombose de seio cavernoso ocorrerá mediante defeitos de falha de enchimento do contraste no seio cavernoso na neuroimagem (representando a identificação de trombo).  

Mesmo não sendo sempre disponível em diversos ambientes de emergência, a modalidade de ressonância de crânio com contraste venoso (RMV) apresenta maior sensibilidade (aproximadamente 95%) para detecção de trombose de seio cavernoso. Portanto, a RMV pode identificar melhor a presença de trombos em todas as fases da doença, sendo recomendada especialmente quando a TC não confirma o diagnóstico e há alta suspeita clínica. 

Além disso, exames laboratoriais podem auxiliar na elucidação diagnóstica. Hemograma com leucocitose com predominância de polimorfonucleados e marcadores inflamatórios elevados (PCR e VHS) podem ocorrer. Hemoculturas são positivas em até 70% dos casos e devem ser colhidas antes de iniciar a antibioticoterapia. Análise liquórica é recomendada para casos em que haja suspeita concomitante de meningite ou encefalite.  

A trombose de seio cavernoso pode apresentar diagnósticos diferenciais como celulite orbitária, meningite/encefalite, fístula carótida-cavernoso, sinusite, entre outros. 

Tratamento 

A trombose de seio cavernoso possui limitação de evidências robustas para seu manejo. Grande parte das recomendações, inclusive, são decorrentes de estudos retrospectivos e opinião de especialistas. 

Sendo assim, o tratamento contempla ressuscitação volêmica para os casos que possuam sepse, antibioticoterapia de amplo espectro para os casos sépticos, anticoagulação e avaliação de especialistas (otorrinolaringologia, neurocirurgia, oftalmologia) mediante complicações clínicas. 

A antibioticoterapia para casos sépticos de TSC inclui ceftriaxona 2 g IV ou cefepime 2 g IV em combinação com vancomicina 20 mg/kg IV. Se houver suspeita de infecção dentária ou sinusal, deve-se adicionar metronidazol 500 mg IV para cobrir anaeróbios orais. 

O papel da anticoagulação na trombose de seio cavernoso apresenta evidências controversas ainda que seja bem utilizado. Os benefícios propostos da anticoagulação nessa condição incluem prevenção de propagação de coagulo, redução de inflamação, inibição plaquetária, auxílio na penetração do antibiótico no trombo. Alguns estudos apontam redução de mortalidade com o uso da anticoagulação, enquanto outros não. Ainda assim, há dados que reforçam que sua intervenção é provavelmente segura e com potencial na redução de morbimortalidade. Ao realizar início dessa terapia, a duração recomendada ocorre em torno de 4-6 semanas, podendo durar até 3 meses. 

Corticosteroides em geral são controversos para essa condição, sendo apenas recomendados em casos de insuficiência adrenal. 

Intervenção cirúrgica é raramente realizada mediante a dificuldade técnica considerando a localização anatômica em casos infecciosos de TSC. As intervenções cirúrgicas podem incluir esfenoidectomia, mastoidectomia, etmoidectomia, descompressão orbitária, entre outros.

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Referências bibliográficas

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