Logotipo Afya
Anúncio
Neurologia4 abril 2023

Tricloroetileno: uma causa invisível para a doença de Parkinson?

Há estudos que fazem essa relação desde 1969, quando um homem foi descrito com Parkinson após 30 anos de exposição ao tricloroetileno.

Por Danielle Calil

A doença de Parkinson (DP) é uma condição neurodegenerativa cuja incidência tem crescido progressivamente ao longo dos anos, destacando para o fato do número de indivíduos acometidos ter dobrado nos últimos 30 anos. Algumas causas genéticas já foram relacionadas à doença assim como alguns fatores (pesticidas específicos e traumatismo intracraniano) já foram identificados como associação. Contudo, há ainda uma alta prevalência de pacientes sem causas ou sem fatores de risco esclarecidos. 

Um artigo publicado em março deste ano pelo Journal of Parkinson’s disease se propõe a descrever uma hipótese de causalidade da substância química tricloroetileno com a doença de Parkinson. 

Leia também: Anticorpos monoclonais para doença de Alzheimer, já estamos lá?

O que é o tricloroetileno? 

O tricloroetileno é um solvente composto por seis átomos sendo incolor, volátil, não inflamável e persistente no ambiente. Inicialmente, foi sintetizado por laboratório em 1864 com início de produção comercial em torno de 1920. 

É encontrado em diversos produtos consumíveis como adesivos, produtos de limpeza, em especial os aerossóis, desengordurantes, removedores de tinta e de manchas, corretivos, entre outros. Além disso, no ramo industrial é utilizado em materiais de higiene a seco, em desengordurantes, em maquinaria, em pintura e revestimento, entre outros.  

A exposição ao tricloroetileno não se limita às pessoas que trabalham com o produto. Há relatos de contaminação aérea (em ambientes fechados e em áreas externas) como também de lençóis freáticos. 

Na década de 70, foi uma substância considerada onipresente. Ao longo dos anos, houve uma redução significativa em produtos domésticos, embora a exposição ocupacional ao tricloroetileno, desde 1990, tenha aumentado em torno de 30% globalmente. Vale constar que a União Europeia (UE) e dois estados dos Estados Unidos (EUA) baniram o uso desse produto, permanecendo apenas a autorização para desengorduramento e limpeza a seco nos EUA e para uso industrial na UE. Ainda assim, o consumo global de tricloroetileno é projetado para aumentar em torno de 3% anualmente. 

Relatos de associação com doença de Parkinson 

Há estudos que relacionam a exposição de tricloroetileno com doença de Parkinson desde 1969, quando Huber descreveu um homem de 59 anos com parkinsonismo que apresentou exposição laboral desse produto por três décadas. 

Em 2008, um estudo produzido por Gash e colaboradores descreveram uma série de casos de 30 trabalhadores de fábrica em que 3 eram mais expostos a essa substância e evoluíram com doença de Parkinson. Já 14, dos 27 trabalhadores menos expostos, também apresentaram algumas características de parkinsonismo. 

Os pesquisadores desse artigo também publicaram sete casos ilustrativos que estabeleciam uma potencial relação dessa substância química com a doença de Parkinson. 

Em estudos com modelo animal, foi observado que o tratamento com tricloroetileno provocou redução seletiva de neurônios dopaminérgicos. Além disso, diversos outros estudos com exposição prolongada a tricloroetileno em ratos e camundongos demonstraram alterações neuropatológicas sugestivas de doença de Parkinson, como, por exemplo, neuroinflamação e processos de fosforilação-agregação de alfa-sinucleína. 

Comentários 

Embora nessas descrições de estudos de literatura seja demonstrado um potencial papel do tricloroetileno na doença de Parkinson, não há ainda provas na doutrina para considerar causalidade do produto nessa doença neurodegenerativa. Até os autores da publicação descrevem que o papel do tricloroetileno na DP está “longe de ser definitiva”. 

Há ainda interferências na prática para estabelecer essa relação de causalidade, como: 

  • Muitos indivíduos não serem conscientes sobre a exposição ao produto;
  • A exposição, quando presente, geralmente não é aferida;
  • Exposições prévias não podem ser aferidas no momento de uma futura avaliação;
  • Em muitos casos, a exposição ocorre concomitante a outros agentes poluentes;
  • Tempo entre a exposição e a manifestação da doença é longo;
  • Existência de fatores genéticos subjacentes que podem aumentar o riso de DP após exposição ao produto. 

Apesar da relação do tricloroetileno com doença de Parkinson ser descrita mais recentemente, já foi constatado que essa substância é danosa para a saúde, com relatos de associação com câncer, risco de aborto espontâneo e contribuição para outros defeitos congênitos. 

Veja ainda: Diagnóstico da síndrome demencial

Mensagem final 

A fim de melhor compreender o papel do tricloroetileno no risco de doença de Parkinson, há a necessidade de conduzir maiores estudos sobre essa relação. Não há ainda dados na literatura que comprovem que o tricloroetileno é uma causa para desenvolvimento dessa doença neurodegenerativa. 

Nessa publicação, há recomendação pelos autores de medidas como informar o público sobre os riscos dessa substância, limpeza de sítios contaminados, aprimorar o monitoramento desse produto no ambiente e defender a proibição futura dessa droga. 

Anúncio

Assine nossa newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Ao assinar a newsletter, você está de acordo com a Política de Privacidade.

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Referências bibliográficas

Compartilhar artigo