Um dos fatores essenciais no uso racional de antibioticoterapia é a administração dos medicamentos em posologias adequadas. Se por um lado é necessário atingir concentrações suficientes no local da infecção para que haja tratamento efetivo e para evitar desenvolvimento de resistência, por outro, exposições excessivas a antimicrobianos acarretam o risco de eventos adversos.
Diferentes antibióticos apresentam diferentes características de farmacocinética e farmacodinâmica e diversos fatores podem alterar as concentrações séricas e teciduais alcançadas, resultando em necessidade de ajuste de doses. A presença de disfunção renal e/ou o uso de hemodiálise, por exemplo, é um dos fatores mais conhecidos e estudados.
O peso corporal e obesidade também são capazes de alterar os parâmetros de farmacocinética. Entretanto, seu impacto na posologia dos antibióticos ainda é pouco claro, com poucos estudos sobre o tema. Autores norte-americanos conduziram uma revisão sistemática sobre a farmacocinética dos antibióticos em pacientes obesos e elaboraram diretrizes em relação aos ajustes indicados.
Conceitualização da revisão sobre antibioticoterapia em pacientes obesos
Para essa revisão, os autores adotaram as seguintes definições e parâmetros:
- Os artigos avaliados focaram na farmacocinética de antibióticos em pacientes adultos (≥ 18 anos) com obesidade (IMC > 30 kg/m²) ou obesidade grave (IMC > 40 kg/m²).
- Foram excluídas apresentações de conferências e revisões, mas todos os outros tipos de desenho de estudo foram considerados.
- Probabilidade adequada de atingir a meta de farmacocinética/farmacodinâmica (Pk/Pd) foi definida como mais de 90% dos pacientes alcançando a meta de Pk/Pd no plasma.
- Para betalactâmicos, o alvo mínimo foi definido como concentração livre do fármaco excedendo a concentração inibitória mínima (MIC) do patógeno suscetível em 40 – 100% do tempo.
- Para vancomicina, a área abaixo da curva concentração plasmática x tempo ≥ 400 foi considerada adequada.
- O peso ajustado é calculado pela diferença entre o peso corporal total e o peso ideal multiplicada por um fator de correção (mais comumente 0,4) e somada ao peso ideal.
Recomendações
Baseados nos resultados encontrados, os autores destacam as principais diferenças de Pk encontradas em pacientes com obesidade e as recomendações para ajuste de dose, quando necessário.
Betalactâmicos
- A administração de doses mais elevadas do que as usuais não é recomendada de rotina em pacientes com obesidade e infecções leves ou moderadas.
- Em pacientes críticos com obesidade, devem-se considerar infusões contínuas ou estendidas e monitoração de níveis séricos terapêuticos.
- Em situações de profilaxia cirúrgica, doses mais elevadas ou mais frequentes de cefalosporinas (como a cefazolina) devem ser consideradas em cirurgias com duração maior do que 2 – 3h.
Aminoglicosídeos
- Para otimização das concentrações máximas, recomenda-se que o cálculo das doses seja baseado no peso ajustado.
- Para as doses de manutenção e intervalos, recomenda-se basear-se na função renal e monitorização dos níveis séricos ao invés do peso ajustado.
Vancomicina
- Uma dose de ataque de 20 – 25 mg/kg de peso corporal total (máximo de 3g) é recomendada para pacientes com obesidade e infecção grave.
- As doses de manutenção devem ser individualizadas e guiadas pela monitorização de nível sérico para aumentar a probabilidade de se alcançar os alvos terapêuticos de Pk/Pd sem toxicidade.
- Quando possível, devem-se aplicar modelos populacionais para guiar a posologia.
Linezolida, tedizolida e daptomicina
- Pacientes com obesidade e função renal normal podem necessitar de doses maiores de linezolida, mas não há dados robustos para embasar recomendações.
- Não há recomendação para ajuste de dose em pacientes com obesidade em uso de tedizolida.
- Para daptomicina, não há estratégias de ajuste validadas, mas os autores sugerem basear o cálculo de doses no peso ajustado.
Quinolonas
- Ajuste de doses de fluoroquinolonas baseado em peso corporal não é recomendado. As doses devem ser guiadas por função renal.
- Doses mais elevadas ou mais frequentes devem ser consideradas em pacientes com obesidade e infecções graves de tecidos profundos como forma de alcançar concentrações teciduais adequadas.
Tigeciclina e tetraciclinas
- Os dados disponíveis sugerem que não são necessários ajustes de dose na presença de obesidade para esses antibióticos.
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