O exantema súbito, conhecido também como roséola infantil ou sexta doença, é uma infecção viral comum nos primeiros anos de vida, causada pelo herpes-vírus humano 6 (HVH) e, menos frequentemente, pelo HVH-7. Cerca de 90% dos casos de exantema súbito ocorrem em crianças com menos de dois anos de idade.
A roséola é uma infecção universalmente distribuída responsável por cerca de 10 a 45% das doenças febris em bebês. Devido à febre alta e à capacidade do vírus de atravessar a barreira hematoencefálica (BHE), cerca de 15% das crianças podem apresentar convulsões febris agudas. É uma doença autolimitada, cujo diagnóstico é clínico e o tratamento é baseado em medidas de suporte e de sintomas.
O HVH-6 provavelmente permanecerá latente em pacientes imunocompetentes, mas pode ser uma das principais causas de morbidade e mortalidade em pacientes imunossuprimidos.
Neste artigo, revisamos os principais aspectos clínicos e terapêuticos do exantema súbito em crianças.
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Etiologia da roséola
O principal agente causador do exantema súbito é o HVH-6, um vírus de ácido desoxirribonucleico (DNA), pertencente à família Herpesviridae, subfamília betaherpesvirinae e gênero Roseolovirus. Está intimamente relacionado ao citomegalovírus humano (CMV) e ao HVH-7. Este grupo de betaherpesvírus é conhecido por ter menos tropismo celular do que outros membros da família Herpesviridae.
O HVH-6 contém um genoma de DNA linear de fita dupla, flanqueado por repetições terminais diretas que contêm reiterações de um hexanucleotídeo, GGGTTA. Acredita-se que essas reiterações desempenham um papel na manutenção do genoma viral em células infectadas de forma latente.
Epidemiologia da roséola
O exantema súbito é uma doença infecciosa viral cuja transmissão ocorre, provavelmente, por perdigotos. O período de incubação varia de 5 a 15 dias, ocorrendo o contágio durante a fase de viremia, sobretudo no período febril da doença.
Na imensa maioria dos casos, acomete crianças pequenas entre seis meses e seis anos de idade, com predomínio em menores de dois anos. Este padrão etário sugere que existe uma determinada proteção devido a anticorpos maternos e que o vírus tenha elevada prevalência na comunidade, pois quase todas as crianças já possuem imunidade quando atingem a fase pré-escolar.
A transmissão costuma ocorrer em ambientes fechados, como escolas e creches. Todavia, mesmo crianças que não frequentam esses locais podem ter contato com o vírus em outras situações, como na própria casa ou em festas infantis, por exemplo. Inclusive, as crianças podem ter contato com o agente viral, mas não desenvolver as manifestações clínicas da doença.
Cerca de 50 a 60% das crianças são soropositivas para HVH-6 aos 12 meses de idade e quase 100% da população pediátrica está infectada aos três anos.
A idade média de aquisição é de nove meses e a infecção primária pelo HVH-7 geralmente ocorre um pouco mais tarde, sendo adquirida em uma idade mediana de 26 meses, e mais de 90% de soroprevalência é alcançada aos seis a dez anos de idade.
A infecção primária por HVH-6 é a causa mais comum de visitas hospitalares associadas à febre em bebês e é responsável por 20% das febres em crianças de seis a 12 meses de idade, bem como um terço das convulsões febris em crianças de até dois anos.
Sazonalidade e transmissão do exantema súbito
Uma característica do exantema súbito é que surge principalmente nos meses de primavera e de outono.
Durante a pandemia de Covid-19, embora a incidências de doenças infecciosas adquiridas tenha diminuído em muitos países, um estudo realizado no Japão, em Niigata, mostra que a incidência de exantema súbito antes (2016–2019) e durante a pandemia (2020) não diferiu substancialmente, embora os pacientes no segundo semestre de 2020 fossem mais velhos do que os de 2016-2019.
Esses achados sugerem que a roséola pode ser transmitida principalmente entre os membros da família, não na comunidade.
Patogênese da infecção pelo HVH-6
O herpesvírus humano 6 (HVH-6) replica-se mais comumente nos leucócitos e nas glândulas salivares durante a infecção primária e, portanto, estará presente na saliva.
Pesquisas mostraram que altos níveis de metaloproteinase 9 e inibidor tecidual de metaloproteinases 1 no soro de bebês infectados com HVH-6 podem levar à disfunção da BHE que, por sua vez, pode ajudar a causar convulsões febris. A invasão precoce do sistema nervoso central (SNC) pelo vírus também foi demonstrada.
Subtipos do vírus HVH-6 e persistência latente
Existem duas subespécies virais: HVH-6A e HVH-6B.
O HVH-6B é conhecido como o vírus causador da roséola na infância, enquanto doenças específicas associadas ao HVH-6A ainda não foram identificadas.
Após a invasão primária, o HVH-6B infecta persistentemente os leucócitos do hospedeiro e pode reativar se o hospedeiro desenvolver um estado severamente imunossupressor. Isso significa que o paciente saudável adquire imunidade duradoura e não apresentará novos episódios da doença futuramente. Entretanto, pacientes imunossuprimidos podem desencadear novo episódio.
Ambas as variantes entram na célula via interação com CD46. O HHV-6B está envolvido no processo de fusão à membrana celular por um mecanismo indefinido, o nucleocapsídeo é transportado através do citoplasma e o genoma do DNA viral é liberado no nucleoplasma em complexos de poros nucleares.
Foi demonstrado que o HVH-6 se replica de forma mais eficaz em células T CD4+. O HVH-6 permanece latente em linfócitos e monócitos após uma infecção primária aguda com as glândulas salivares e tecido cerebral que abrigam infecção persistente por HVH-6.
Quadro clínico da roséola
O roséola se inicia subitamente, com febre elevada e contínua e é considerado uma das causas mais frequentes de convulsão febril. Nesta fase, é comum observar extrema irritabilidade e anorexia. Apesar da febre alta, o paciente não apresenta toxemia. Achados comuns incluem linfonodomegalia cervical e hiperemia de cavum.
Manifestações clínicas associadas
Durante o quadro febril, as crianças podem permanecer ativas e em bom estado geral. No entanto, também podem desenvolver outras manifestações clínicas, como mal-estar, conjuntivite, edema orbital, inflamação das membranas timpânicas, linfadenopatia, abaulamento da fontanela, diarreia, tosse e outros sintomas do trato respiratório superior.
Manchas uvulopalatoglossais também conhecidas como manchas de Nagayama, são pápulas eritematosas encontradas no palato mole e na úvula que são vistas em dois terços dos pacientes com exantema súbito.
Características do exantema cutâneo
Após 3 a 5 dias de febre, surge o exantema de forma súbita, assim como a cessação da febre que também ocorre abruptamente. O exantema é caracterizado pela presença de lesões maculopapulares rosadas de 2,0 a 5,0 mm de diâmetro.
Um halo pálido pode ocorrer ao redor das máculas e pápulas em alguns casos. Inicialmente, as lesões aparecem no tronco e se disseminam para cabeça e extremidades, sendo tipicamente não pruriginosas, esbranquiçadas e podem persistir de um a dois dias. A erupção cutânea dura um período curto, variável de algumas horas a dois a três dias. Por fim, desaparece sem descamação ou hiperpigmentação da pele.
Diagnóstico da roséola
O diagnóstico da roséola é clínico.
Exames laboratoriais não são necessários, mas às vezes são realizados durante a fase febril da doença para descartar outros diagnósticos. Pode haver leucocitose, com normalização da contagem de leucócitos durante um período de sete a dez dias após a doença.
A indicação da infecção primária se dá somente com a identificação do HVH-6 ou HVH-7 no sangue periférico. Testes para a identificação de anticorpos podem ser efetuados. Contudo, a análise dos resultados deve ser muito cautelosa, devido à possibilidade de infecções crônicas com reativações, as quais podem acontecer com quaisquer herpes-vírus.
Diagnóstico diferencial da roséola
Apesar da roséola ser caracterizada por uma apresentação clínica clássica, ele pode ser confundido com outros exantemas virais febris da infância, como sarampo, rubéola e escarlatina.
Outros diagnósticos diferenciais incluem infecções por enterovírus e adenovírus, que podem causar febre e erupção cutânea.
Além disso, o exantema súbito pode ser difícil de distinguir de uma reação alérgica medicamentosa em crianças, pois medicamentos, como antibióticos, são frequentemente administrados durante o período febril, e a erupção pode aparecer coincidentemente logo depois. Ademais, essas reações podem mimetizar o exantema súbito na morfologia e distribuição troncular.
Por isso, uma anamnese detalhada pode ajudar a diferenciar as duas condições. Por fim, a síndrome de hipersensibilidade induzida por drogas (drug-induced hypersensitivity syndrome – DIHS) e a síndrome DRESS associada (reação a drogas com eosinofilia e sintomas sistêmicos – drug reaction with eosinophilia and systemic symptoms) pode se apresentar com febre prodrômica, edema periorbital e erupção morbiliforme nas semanas após a exposição inicial à droga, embora a DRESS geralmente se apresente em uma idade mais avançada do que o exantema súbito e evolua com falência de múltiplos órgãos, não comumente vista na infecção pelo HVH-6.
Tratamento da roséola
Não existe um tratamento específico para o exantema súbito. A maioria dos casos é leve e autolimitada.
Dessa forma, o tratamento é de suporte com repouso, manutenção da ingestão de líquidos e antitérmicos para controle da febre. Não há necessidade de antialérgicos, pois a erupção não é pruriginosa. Não há vacinação ou terapia antiviral para a fase aguda do exantema súbito até o momento.
Complicações associadas a roséola
A infecção primária por HVH-6 pode estar associada a uma grande variedade de complicações potenciais, incluindo miocardite, rabdomiólise, trombocitopenia, síndrome de Guillain-Barré e hepatite.
A presença de DNA de HVH-6 no órgão alvo ou outros fluidos corporais como evidência de infecção ativa por HVH-6 tem sido usada por muitos relatos de casos e pequenos estudos de caso.
Segundo Cristoforo e colaboradores (2020), os profissionais devem ter em mente a associação entre HVH-6 e fontanela abaulada. Esse conhecimento pode evitar exames desnecessários, incluindo punções lombares, antibióticos e hospitalizações para bebês em bom estado geral com sinais e sintomas consistentes com exantema súbito.
O exantema súbito é tipicamente uma doença autolimitada e não ameaçadora; no entanto, pode causar encefalite, meningite e óbito. P
O acompanhamento clínico é essencial, assim como o aconselhamento familiar sobre as possíveis complicações e sequelas dessa condição aparentemente benigna. Mais pesquisas são essenciais para entender e confirmar completamente a patogênese da hipertensão intracraniana em associação com o exantema súbito.
Encefalopatia e convulsões febris
Em um survey realizado em 2009 no Japão, Yoshikawa e colaboradores estimaram que 61,9 casos de encefalite associada ao exantema súbito por HVH-6 ocorram a cada ano no país.
Kasai e colaboradores (2021) relataram o caso de uma menina de 12 meses com encefalopatia aguda com convulsões bifásicas e difusão tardia reduzida (EACD) devido à infecção primária por HVH-6.
Ela foi tratada com sucesso para a EACD, incluindo controle de temperatura direcionado e administração de vitamina B1, B6 e L-carnitina. Embora a carga viral do HHV-6 em seu líquor fosse alta (12.000 cópias/mL), ela se recuperou totalmente sem o uso de agente antiviral.
*Este conteúdo foi atualizado em: 31/10/2025 pela equipe editorial do Portal Afya.
Autoria

Roberta Esteves Vieira de Castro
Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra
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