O que você precisa saber nas colecistectomias desafiadoras
A colecistectomia videolaparoscópica (CVL), umas das cirurgias mais frequentes no dia a dia do cirurgião geral, é um procedimento que pode vir acompanhado por grandes dificuldades, principalmente em casos de colecistite com processo inflamatório avançado ou na presença de variações anatômicas.
Diante dos apuros e armadilhas que esse procedimento trás em situações complicadas, danos à via biliar são frequentes e as lesões desse trato podem ser graves e causar muitos transtornos a saúde do paciente.
Tempo ideal para CVL em colecistite aguda
Colecistectomias complicadas são mais comuns em quadros de colecistite aguda. A maioria das diretrizes atuais recomenda, sempre que possível, resolver o caso com cirurgia tão logo seja diagnosticado. Um procedimento realizado em até 72 horas é o mais indicado, mas também é aceitável realizá-lo em até 7 dias.
Em um amplo estudo coorte retrospectivo, Mestral et al. avaliaram 14.220 pacientes e identificaram que pacientes com quadro de colecistite e que foram operados em até 1 semana apresentaram menor risco de lesões de vias biliares ou morte.
O estudo ACDC, um ensaio clínico randomizado, comparou CVL realizadas em até 24 horas do diagnóstico de colecistite com CVL após 7 a 45 dias e encontrou redução significativa da mortalidade nas colecistectomias precoces (11,8% vs. 34,4%).
Um estudo suíço que também comparou CVL precoce e tardia identificou diferenças significativas nas duas abordagens em relação a conversão para procedimento aberto (12% vs. 28%), complicações pós-operatórias (5,7% vs. 13,0%), necessidade de reabordagem (0,9% vs 3,0%).
Onde estão as dificuldades e as armadilhas
De acordo com Seshadri et al., a maioria das lesões da via biliar ocorrem devido à identificação errônea da anatomia. Nos quadros inflamatórios, a anatomia da via biliar pode estar muito distorcida. Isso sem falar nas variações anatômicas que podem acometer até 25% dos pacientes, de diversas formas. Uma variação bem comum é a inserção do ducto hepático posterior direito na vesícula biliar ou no ducto cístico.
Seshadri et al. cita as quatro “armadilhas” de Strasberg: falha em reconhecer um ducto hepático posterior direito aberrante; dificuldade para identificar o triângulo hepatocístico; desafios da dissecção da vesícula de cima para baixo; inserção paralela do ducto cístico no ducto biliar comum.
Na tentativa de realizar a CVL a qualquer custo, a lesão das vias biliares acontece. Estudos mostram que essas lesões acontecem mesmo com a conversão para cirurgia aberta e, pior, pode até ser mais comum após conversão.
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O que fazer diante de uma colecistecomia difícil?
Existem maneiras de tentar realizar um procedimento com menos riscos. A identificação o triângulo hepatocístico é essencial. Outro fator importante é a visão crítica de segurança – dissecção do terço inferior da vesícula biliar da placa cística; liberação de estruturas aderidas ao triângulo hepatocístico; identificação de apenas duas estruturas biliares entrando na vesícula. Entretanto, nem sempre esses passos são alcançados com segurança.
Pedir ajuda em situações difíceis é sempre um bom caminho. A participação e o auxílio de um cirurgião mais experiente são fundamental para minimizar os riscos de lesão biliar.
Uma estratégia que vem sendo bem difundida é o “bailout”. De acordo com essa orientação, em situações em que há grande processo inflamatório com dificuldade de identificar as estruturas envolvidas com segurança, é melhor seguir com uma colecistectomia parcial do que insistir em uma ressecção completa da vesícula e causar danos à via biliar. É indicado a extração de todos os cálculos e sutura do remanescente da vesícula biliar. Com isso, resolve-se o processo inflamatório e evita uma lesão de via biliar que pode ser muito mais danosa à saúde do paciente.
Outra dica é que, diante da suspeita de lesão de via biliar em que não houver um cirurgião experiente e com expertise em via biliar, o melhor a fazer é colocar um dreno e encaminhar o paciente a um centro com especialista.
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