A qualidade da comunicação em uma consulta pode ser confundida com a capacidade do médico de explicar informações corretamente e de maneira compreensível ao paciente. No entanto, essa é apenas uma pequena fração do que uma boa comunicação representa dentro de um atendimento médico.
A comunicação em uma consulta pressupõe troca – entre paciente e profissional: e é na escuta que talvez esteja o maior segredo para tornar essa troca mais efetiva e satisfatória.
Nesse sentido, saber realizar uma escuta ativa e ser capaz de fazer o tipo de pergunta certa, na hora certa, permite que informações relevantes surjam, o que faz toda a diferença para que a comunicação cumpra o seu papel de auxiliar o médico a ajudar o paciente.
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Escuta ativa
Escutar ativamente é mais do que apenas ouvir. É necessário permitir que o paciente fale, sem interrupções, no início da consulta, trazendo a queixa com suas próprias palavras, como demonstrar interesse legítimo pelo o que ele traz, via contato visual e linguagem não verbal – ex.: acenar com a cabeça, manter o corpo voltado para o paciente, expressões faciais que demonstrem acompanhar o relato – e valorizar o que é trazido.
A experiência do paciente com sua queixa nem sempre estará relacionada apenas aos fatos biomédicos, mas é dela que se extrai as verdadeiras informações que auxiliarão o médico a saber como, de fato, poderá ajudar o paciente. E a pressa em interromper o paciente para fazer perguntas pode enviesar o raciocínio clínico para uma direção errada e impedir a obtenção de informações importantes.
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Questionar o paciente
No entanto, fazer perguntas é essencial durante a entrevista clínica e saber o tipo de pergunta a ser feita em cada momento é necessário para que a comunicação ocorra de maneira fluida e verdadeiramente alinhada com o motivo da consulta. Existem três tipos de perguntas que podem ser elaboradas ao investigar uma queixa ou aprofundar um relato do paciente: perguntas abertas, focadas e fechadas.
Pergunta aberta
Após dar o espaço para que o paciente traga o seu relato, escutando ativamente, as perguntas a serem feitas a seguir devem ser abertas. Ou seja, mais focadas na experiência que o paciente tem com a queixa do que no conhecimento fisiopatológico que o médico tem sobre ela. Ex.: “Me conte um pouco mais sobre essa dor de cabeça” é um bom exemplo de como realizar essa abordagem inicial, pois permite que o paciente traga livremente os aspectos mais relevantes dessa dor.
Perguntar diretamente sobre o tipo de dor ou sobre fatores de piora ou melhora, por exemplo, pula uma etapa importante da investigação e direciona o paciente a responder questões que talvez não sejam realmente importantes em seu quadro. É possível até que possam ser dadas respostas que não sejam precisas ou totalmente verdadeiras, já que surgiram como uma necessidade focada no médico e não na experiência do paciente com o sintoma.
Assim, iniciar com com perguntas abertas vai justamente permitir identificar os pontos a serem investigados mais a fundo e, ao mesmo tempo, aqueles que não surgiram espontaneamente e que vão precisar ser abordados.
Pergunta focada
O passo seguinte na investigação dos sintomas deve ser começar a focar as perguntas, tornando-as mais específicas. No caso de uma dor de cabeça, após a pergunta aberta, não se deve perguntar diretamente se a dor é acompanhada de náuseas, por exemplo. Em vez disso, neste momento, a pergunta deve ser algo como “Quando você sente essa dor de cabeça, você sente algum outro sintoma junto?”.
A investigação passa a estar focada naquele aspecto semiológico da dor (sintomas associados), mas sem indicar os sintomas em específico que poderiam estar associados – o que poderia acabar “sugestionando” o paciente.
Pergunta fechada
Por fim, após esgotadas as perguntas focadas, as perguntas passam a ser formuladas bem mais a partir do conhecimento clínico do médico. Pode ser, por exemplo, que o paciente com queixa de dor de cabeça não tenha conseguido descrever bem o tipo de dor, quando perguntado de maneira aberta e focada, mas que o médico suspeite que possa ser uma enxaqueca (por estar associada à fotofobia e ser recorrente, por exemplo).
Neste momento, pode-se perguntar, de maneira fechada: “Você diria que a sua dor é do tipo que fica ‘latejando’ na cabeça?”. O raciocínio clínico já está bem mais alinhado ao que de fato está acontecendo com o paciente e bem mais focado em uma certa hipótese diagnóstica, o que eleva o valor preditivo positivo de cada informação específica que surge.
Ao contrário, respostas “sim” e “não”, logo no início da investigação, possuem baixo valor preditivo positivo e, por isso, as respostas devem vir mais baseadas no que o paciente “sente” do que no que o médico “sabe”: que é o que as perguntas abertas tendem a gerar.
Conclusão
Saber escutar e saber perguntar são dois aspectos importantíssimos na qualidade da comunicação dentro da consulta médica. A investigação de queixas e de sintomas deve iniciar-se o mais aberta possível, com escuta atenta e empática, que permita o surgimento inicial das informações mais relevantes.
As perguntas, em seguida, devem caminhar em um ritmo progressivo de especificidade, iniciando abertas, passando a focadas e terminando fechadas.
Desse modo, para além de saber expressar adequadamente ao paciente as informações médicas, o médico possibilita ao paciente expressar verdadeiramente as informações da sua singular experiência com a doença, o que permite o cuidado da pessoa, e não apenas o tratamento de uma queixa.
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