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Carreira5 agosto 2025

Caso clínico: Uma prescrição diferente

Paciente com diagnóstico de prurido crônico que, apesar da extensa investigação etiológica e tratamento medicamentoso, ainda persistia.

Na série especial “Histórias de Cuidado: Relacionamento médico-paciente”, compartilhamos relatos de médicos sobre casos que vivenciaram em sua rotina e como lidaram com cada situação de forma gentil e empática.

O objetivo é explorar a Medicina sob uma perspectiva mais subjetiva, revelando as nuances do cuidado com o paciente.

Boa leitura!

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médico consolando um paciente em um relacionamento de empatia

Caso Clínico

Eu tinha acabado de pegar mais um café para iniciar os atendimentos daquela tarde com um ambulatório bem cheio. Estiquei um pouco a coluna e os braços, me preparando para abrir o prontuário eletrônico e ver qual era o próximo paciente que eu precisava chamar. Mal sabia que era ele, aquele paciente que vinha me deixando preocupada há alguns meses.

Ele tinha o diagnóstico de prurido crônico. Apesar da extensa investigação etiológica que fizemos e tratamento medicamentoso, ele continuava com essa queixa. Introduzi, nas últimas consultas, o tema da saúde mental e o quanto era importante essa avaliação multidisciplinar, com a psiquiatria e psicologia e ele tinha aderido à psicoterapia e aos antidepressivos prescritos.

Então, naquele dia, entrou pontual como sempre. Silencioso, cabisbaixo, com um semblante desanimado. Logo imaginei que não tinha melhorado nada das suas queixas e me senti impotente. A gente sempre acha que é sobre a gente, né?

Leia mais: Caso clínico: Essa não é uma história sobre prurido

Apesar das escoriações na pele facilmente visualizadas, o humor deprimido que ele apresentava era o que mais preenchia as lacunas do meu cérebro. E daquela sala apertada.

Nós começamos a conversar sobre o dia a dia dele, que se resumia em dormir, fazer as tarefas de casa e assistir TV. Perguntei se sempre foi assim. Ele disse que não: “Em outros tempos, eu costumava pintar quadros de aquarela, mas faz tempo que não pego em um pincel.” Essa fala saiu tímida, quase como um pedido de desculpas.

Não hesitei. Na receita, além dos emolientes, anti-histamínicos e orientações habituais, eu prescrevi algo novo:

“Pintar 1 quadro até a próxima consulta.”

Fiquei receosa de como esse item seria recebido, mas ele leu. E foi a primeira vez que o vi sorrir.

Na consulta seguinte, ele trouxe a foto do quadro novo, que era lindo, por sinal. Ele era muito talentoso. Mas ele também trouxe algo mais. Percebi um novo tom, um semblante melhor, um brilho diferente. O prurido também havia melhorado bastante. Apesar da receita que se mantinha a mesma, algo dentro dele havia se modificado.

Entendi que prescrever é mais do que indicar medicamentos. É promover saúde e bem-estar. E que há momentos que o que cura está na reconexão do paciente consigo.

A coceira passou.

Ele voltou a pintar.

Eu voltei a trabalhar e… retomei a aula de canto.

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