A insuficiência cardíaca (IC) aguda geralmente leva à necessidade de atendimentos de urgência, uso de medicações endovenosas e frequentemente resulta em internações hospitalares, com grande impacto em mortalidade e custos para o sistema de saúde. O manejo inicial se baseia em uso de diuréticos e tratamento da causa da descompensação, além do início e otimização de medicações que mudam o prognóstico do doente o mais precoce possível. Recentemente as medicações da classe dos iSGLT2 mostraram grande benefício no tratamento crônico da IC e diversos estudos avaliaram sua relevância na IC aguda, mostrando melhora da congestão, porém com evidência limitada de melhora de sobrevida nesse contexto.
A maioria desses estudos foi limitado pelo pequeno número de pacientes e centros. Assim, recentemente foi feita uma metanálise para avaliar a eficácia e segurança do início precoce dos iSGLT2 em pacientes internados por IC aguda.
Métodos do estudo e população envolvida
Para a metanálise foram incluídos estudos controlados e randomizados que avaliaram o início de iSGLT2 (dapagliflozina, empagliflozina ou sotagliflozina) em pacientes internados por IC aguda.
Os desfechos de eficácia foram morte por todas as causas, reinternações por IC e morte cardiovascular ou eventos de IC (avaliações de urgência ou internações não programadas). Os desfechos de segurança foram a ocorrência de insuficiência renal aguda (IRA), cetoacidose, infecções do trato urinário, hipotensão e hipoglicemia.
Resultados
Foram incluídos na análise final sete estudos clínicos controlados e randomizados, com um total de 2320 pacientes. Desses, cinco eram duplo cego, dois eram abertos; 4 eram multicêntricos e 3 unicêntricos. Todos tinham baixo risco de viés.
O início mais precoce da medicação mostrou redução significativa na mortalidade por todas as causas (OR 0,71; IC95% 0,55-0,92) e nas reinternações por IC (OR 0,73; IC95% 0,57-0,94), sem diferença no desfecho composto morte cardiovascular ou eventos de IC.
Em relação aos desfechos de segurança, não houve maior ocorrência de IRA, hipoglicemia, hipotensão, cetoacidose e infecções do trato urinário.
Ao se realizar análise de sensibilidade, o benefício para mortalidade por todas as causas e reinternações por IC foi mantido e observou-se também benefício em mortalidade cardiovascular ou eventos de IC. Os desfechos de segurança continuaram sem diferença. Os resultados foram consistentes para o subgrupo de pacientes que iniciou o iSGLT2 antes da alta, com benefício ainda mais significativo neste contexto.
Comentários e conclusão: início precoce de iSGLT2
Este é o maior estudo de metanálise que avaliou eficácia e segurança do início precoce de iSGLT2 em pacientes internados por IC aguda, independente de fração de ejeção do ventrículo esquerdo ou presença de diabetes. O uso precoce da medicação foi associado a redução de desfechos e o início antes da alta mostrou melhora ainda mais significativa, o que reforça que o início deva ser o mais precoce possível.
O início precoce também é uma oportunidade de fornecer o tratamento recomendado, pois quando não iniciado na internação leva a maior chance de não ser iniciado posteriormente. O medo da ocorrência de eventos adversos costuma ser a razão de postergar o início do tratamento na internação, porém vimos que essa prática é segura e não aumenta a ocorrência desses eventos.
Algumas limitações deste estudo são o tempo variável tanto da duração da intervenção quanto do seguimento, o pequeno número de estudos randomizados, que aumenta a heterogeneidade, e algumas definições inconsistentes, como a de IRA. Além disso, esses estudos excluíram pacientes com doença renal avançada e cinco dos estudos excluíram pacientes em choque cardiogênico, sendo que esses resultados não podem ser extrapolados para estas populações.
Assim, podemos concluir que o início precoce de iSGLT2 na IC aguda melhora a mortalidade e taxas de reinternação, podem ser prescritos antes da alta com segurança e devem ser oferecidos para a maioria dos pacientes com IC aguda.
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