A insuficiência cardíaca de fração de ejeção reduzida (ICFEr) é uma condição complexa e progressiva, que sabidamente determina alta morbidade e mortalidade. Atualmente, o desenvolvimento de novas terapias tem permitido o remodelamento do ventrículo esquerdo e a reversão parcial ou completa de sua disfunção. Neste cenário, surge uma nova entidade conhecida como insuficiência cardíaca de fração de ejeção melhorada (ICFEm).
A insuficiência cardíaca de fração de ejeção melhorada (ICFEm)
Habitualmente, este grupo contempla um perfil de pacientes menos sintomáticos e de melhor prognóstico evolutivo. Todavia, pode-se observar uma nova deterioração da função ventricular ao longo do tempo, sem o total conhecimento das razões para esse desfecho, nem o impacto da descontinuidade da terapia médica instituída.
Ainda há muito a ser aprendido sobre a ICFEm. Neste contexto, o estudo publicado na Annals of Medicine em 2025 busca compreender as características e desfechos clínicos dos pacientes portadores de ICFEm, incluindo a necessidade de continuidade do tratamento médico guiado por diretrizes (TMGD).
Metodologia
Trata-se de um estudo retrospectivo, conduzido por pesquisadores do First Affiliated Hospital of Wenzhou Medical University (China), entre janeiro de 2009 e fevereiro de 2023, que incluiu paciente diagnosticados com ICFEr, isto é, cuja fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) era < 40% e que, posteriormente, foram submetidos a um segundo ecocardiograma em um período de pelo menos seis meses.
Em seguida, estes pacientes eram classificados em dois grupos: ICFEm e Não-ICFEm, de acordo com a FEVE.
Os critérios para ICFEm foram:
1) FEVE incial < 40%; e
2) melhora da FEVE > 10%; e
3) FEVE subsequente > 40%.
Os pacientes portadores de ICFEm ainda foram subdivididos: ICFEm transitória para aqueles cuja FEVE caiu para < 40% em pelo menos um ecocardiograma subsequente, ICFEm persistente se a FEVE permanecesse > 40% e ICFE super-melhorada se a FEVE atingisse > 50%.
De acordo com as principais diretrizes médicas atuais, o TMGD fornecido aos pacientes incluía os inibidores da enzima conversora de angiotensina (iECA), bloqueadores dos receptores de angiotensina (BRA), inibidores da neprilisina e dos receptores de angiotensina (INRA), beta-bloqueadores, antagonistas dos receptores mineralocorticoides (ARM) e inibidores dos cotransportadores de sódio-glicose 2 (iSGLT-2). O uso de ISGLT2 teve um significativo aumento do seu uso apenas a partir de 2020, período que passou a ser contemplada nas principais diretrizes.
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Desfechos
Os desfechos primários analisados foram um composto de eventos cardiovasculares maiores (MACE), que inclui mortalidade por todas as causas e internação por mais de 24 horas devido à descompensação da insuficiência cardíaca.
O desfecho secundário foi a recorrência da ICFEr.
Foram incluídos 4.560 pacientes com diagnóstico de ICFEr, dentre os quais 3289 (72,1%) alcançaram ICFEm em um acompanhamento médio de 3,4 anos.
Entre estes pacientes, 941 (28,6%) apresentaram recorrência da ICFEr em um período de aproximadamente 2,3 anos. A análise dos resultados evidencia que dentre os principais fatores para recorrência de ICFEr estão: miocardiopatia isquêmica, doença arterial coronariana, doença renal crônica, dilatação do ventrículo esquerdo e grau de disfunção do ventrículo esquerdo.
Vale destacar: a continuidade do TMGD se associou ao menos risco de queda da FEVE. No estudo houve alta taxa de descontinuidade do tratamento instituído: 70,4% interrromperam o uso de ARM; 59,8% de IECA/BRA/INRA; 53,2% de betabloquedores; 63,8% de iSGLT2.
Conclusão
A ICFEm é uma condição comum na prática clínica. Diante da sua complexidade de fenótipos, existe um vasto campo para entendimento das suas características e dos seus desfechos clínicos. O comportamento da FEVE ao longo do tempo é influenciada por múltiplos fatores. Porém, percebe-se que o TMGD tem um papel fundamental no prognóstico evolutivo e a descontinuação do tratamento pode ter impacto direto na recorrência da ICFEr.
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