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Cardiologia25 novembro 2024

Anticoagulação precoce versus tardia após AVCi em pacientes com FA 

Estudo investigou o início precoce em comparação com o início tardio da anticoagulação em pacientes com AVCi associado à FA
Por Juliana Avelar

A fibrilação atrial (FA) está presente em pelo menos 20% dos pacientes com AVC isquêmico e é frequentemente a causa do evento. Os anticoagulantes orais diretos (DOACs) são eficazes na redução do risco de AVC isquêmico em pessoas com FA, mas os grandes estudos excluíram pacientes com AVC agudo, o que gera incertezas sobre o melhor momento para iniciar o tratamento anticoagulante após um AVC. A introdução precoce da anticoagulação pode reduzir o risco de recorrência do AVC isquêmico, mas também pode aumentar o risco de transformação hemorrágica, resultando em maior mortalidade ou incapacidade.  

Devido à falta de evidências de alta qualidade, as diretrizes são divergentes sobre quando se deve iniciar a anticoagulação. Algumas orientações sugerem a regra dos 1-3-6-12 dias, baseada na gravidade do AVC, enquanto outras defendem o adiamento por até 2 semanas, especialmente em casos de AVC extensos. 

Embora alguns estudos randomizados e observacionais indiquem que a anticoagulação precoce pode ser segura e eficaz, sem aumento significativo no risco de hemorragia, ainda não há consenso definitivo sobre a segurança ou superioridade desse tratamento em comparação com a anticoagulação iniciada de forma mais tardia.  

Anticoagulação precoce versus tardia após AVCi em pacientes com FA 

Imagem de freepik

Estudo: anticoagulação precoce versus tardia

O estudo OPTIMAS (Optimal Timing of Anticoagulation After Acute Ischaemic Stroke) teve como objetivo estabelecer a segurança e eficácia da anticoagulação precoce com DOACs em uma população mais ampla de pacientes com AVC isquêmico agudo associado à fibrilação atrial, visando fornecer dados mais robustos sobre o tema. 

Metodologia 

Trata-se de um ensaio clínico randomizado controlado, multicêntrico, de fase 4, com intervenção aberta. O estudo foi realizado em 100 hospitais no Reino Unido, com o objetivo de comparar o início precoce de anticoagulação com DOACs (dentro de 4 dias após o início do AVC) com a iniciação tardia (7–14 dias após o início do AVC) em pacientes com FA e AVC isquêmico agudo. 

Foram incluídos pacientes > 18 anos com FA e AVC isquêmico > 24h, com TC ou RM excluindo hemorragia intracraniana ou diagnósticos diferenciais. 

Os pacientes tinham em média 78 anos e a maior parte (63%) recebeu apixabana, seguido de edoxabana (30%). 

A mediana da pontuação NIHSS na admissão foi 5, o que é superior à mediana observada para todos os AVCs no último levantamento nacional de AVC no Reino Unido.  24,6% dos participantes tinham AVC moderado a grave (pontuação NIHSS >10) na admissão hospitalar, e 14,6% na randomização. 

Leia também: Melhor profilaxia em pacientes oncológicos com AVC criptogênico: AAS ou apixabana?

Critérios de exclusão 

  • Coagulopatias ou trombocitopenia grave;
  • Hemorragia intracraniana grave relacionada ao AVC; 
  • Contraindicações ao uso de DOAC (clearence creatinina <15, cirrose, interações medicamentosas significativas). 
  • Contraindicações ao uso de anticoagulação, como gravidez, lactação, ou alergia aos DOACs. 

O desfecho primário foi um composto de recorrência de AVC isquêmico, hemorragia intracraniana sintomática, embolia arterial sistêmica dentro de 90 dias após a randomização. 

 Os desfechos secundários de eficácia incluíram: Incidência dos componentes individuais do desfecho primário, mortalidade por todas as causas e mortalidade cardiovascular dentro de 90 dias, incidência de tromboembolismo venoso, estado funcional, capacidade cognitiva e qualidade de vida em 90 dias.  

Resultados 

Entre 5 de julho de 2019 e 31 de janeiro de 2024, 3.648 participantes foram incluídos. Os participantes foram aleatoriamente designados para dois grupos: 

  • Grupo de iniciação precoce de DOACs (≤ 4 dias após o AVC): 1.824 participantes.
  • Grupo de iniciação tardia de DOACs (7–14 dias após o AVC): 1.824 participantes. 

 No grupo de iniciação precoce, a média de tempo de início de DOAC foi de 3,1 dias. No grupo de iniciação tardia, o tempo médio foi de 8,3 dias. 

As proporções de participantes que apresentaram o desfecho composto de AVC isquêmico recorrente, hemorragia intracraniana ou embolia sistêmica foram semelhantes entre os grupos que receberam anticoagulação oral precoce e tardia.  

A anticoagulação precoce com DOAC foi não inferior à anticoagulação tardia com relação à margem de não inferioridade pré-especificada de 2 pontos percentuais. 

A proporção de participantes com hemorragia intracraniana sintomática dentro de 90 dias foi muito baixa (23 casos) e não foi influenciada pelo tempo de anticoagulação. Isso sugere que iniciar o DOAC precocemente após um AVC isquêmico agudo associado à fibrilação atrial em pacientes sem contraindicações conhecidas é seguro, no que diz respeito à hemorragia intracraniana sintomática. 

Os resultados do estudo são consistentes com outros ensaios sobre a iniciação precoce de DOACs, como os estudos TIMING, ELAN e START. 

Esses resultados são diferentes das recomendações atuais da maioria das diretrizes de adiar a anticoagulação após AVC isquêmico agudo com fibrilação atrial por até 14 dias. 

Não se encontrou interação significativa entre tratamento de reperfusão (como trombólise intravenosa ou trombectomia mecânica) e a iniciação precoce de DOAC, com uma estimativa de benefício potencial para esse subgrupo. Isso sugere que a iniciação de DOACs pode ser segura dentro de 4 dias após essas intervenções. 

O tamanho do infarto foi identificado como um fator de risco para a recorrência de AVC em pacientes com fibrilação atrial. Porém, não houve evidências de que o tempo de iniciação do DOAC interagisse com o tamanho do infarto, o que sugere que o tamanho do infarto não deve ser um fator decisivo para a decisão de iniciar anticoagulação precoce. 

A utilização de critérios baseados em imagem para inclusão foi evitada para reduzir a complexidade do estudo, embora o tamanho do infarto continue sendo considerado um fator de risco importante. 

Limitações do estudo 

  • A diversidade no início do tratamento dentro dos primeiros 4 dias, que foi decidido de forma individualizada pelos médicos, o que não permitiu a definição da melhor janela temporal para se iniciar a anticoagulação.
  • A baixa incidência de hemorragia intracraniana sintomática (apenas 23 eventos) limitou o poder estatístico para analisar com mais precisão o impacto do tempo de iniciação de DOACs sobre esse desfecho. 

Conclusões: anticoagulação precoce versus tardia após AVCi em pacientes com FA 

O estudo OPTIMAS reforça a segurança de se iniciar DOACs precocemente (dentro de 4 dias após o AVC) para pacientes com fibrilação atrial e AVC isquêmico agudo, sem aumento significativo no risco de hemorragia intracraniana sintomática. Além disso, não há necessidade de se atrasar o início da anticoagulação, mesmo em pacientes com AVC de moderado a grave, desafiando as orientações tradicionais que recomendam adiar o tratamento por até 14 dias após AVC.  

Saiba mais: Confira a nova diretriz da AHA/ASA em profilaxia primária de AVC 

Futuras análises de imagem cerebral no estudo poderão investigar mais profundamente o impacto da transformação hemorrágica do infarto no momento da iniciação de DOACs, incluindo o tamanho do infarto e biomarcadores de doença vascular cerebral. 

O CATALYST, uma meta-análise que está em andamento, ajudará a fornecer estimativas mais precisas sobre os efeitos do tempo de iniciação de DOACs na hemorragia intracraniana e na recorrência de AVC isquêmico.

Autoria

Foto de Juliana Avelar

Juliana Avelar

Médica formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Cardiologista pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia

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