O câncer de pulmão é a principal causa de morte relacionada com câncer no mundo e estima-se que sua incidência aumente em 65% até 2035. Quando a doença está localmente avançada, apresenta critérios de irressecabilidade ou é do tipo não pequenas células em estágio limitado geralmente indica-se radioterapia torácica em altas doses, combinada ou não com quimioterapia.
A radioterapia apresenta alguns riscos, sendo os principais relacionados com o coração. Esses podem ocorrer pela proximidade do coração com o local a ser irradiado ou em decorrência da dose de radiação utilizada.
Diversos estudos já tentaram identificar os melhores preditores de cardiotoxicidade após a radioterapia os que avaliaram pacientes com câncer de mama e linfoma mostraram aumento de eventos cardíacos como pericardite aguda, derrame pericárdico, pericardite constritiva, cardiomiopatia, insuficiência cardíaca, estenose ou insuficiência valvar e arritmias.
Como a quantidade de radiação para o câncer de pulmão é maior que para câncer de mama e linfoma, estudos específicos para essa população são necessários. Além disso, pacientes com câncer de pulmão têm maior quantidade de fatores de risco cardiovasculares, o que pode torná-los mais vulneráveis e o que gera dúvidas em relação ao acometimento cardíaco ser decorrente das próprias características do paciente ou secundário a radioterapia.
Assim, foi feita uma revisão sistemática e metanálise para avaliar o risco de doença cardíaca em pacientes tratados com radioterapia para câncer de pulmão.
Métodos do estudo e população envolvida
Foi estudo de revisão sistemática e metanálise realizado com estudos longitudinais, prospectivos ou retrospectivos, observacionais ou ensaios clínicos controlados e randomizados que incluíram pacientes adultos com diagnóstico de câncer de pulmão submetidos a radioterapia em altas doses e sua métricas cardíacas dose-volume. Os desfechos foram eventos cardíacos de qualquer tipo após a radioterapia.
Resultados
Foram incluídos 21 estudos, sendo 20 sobre pacientes com câncer de pulmão não pequenas células e apenas um com câncer de pulmão pequenas células. O tipo de estudo mais comum foi de coorte retrospectiva, sendo apenas dois de coorte prospectiva. Não foram encontrados ensaios clínicos controlados e randomizados. O seguimento foi de 20,4 meses a 8,8 anos.
A maioria dos estudos teve qualidade média a baixa e risco de viés moderado a alto. Apenas dois estudos utilizaram critérios estatísticos para definir os melhores preditores. Todos os outros escolheram preditores de forma arbitrária.
A incidência de eventos cardíacos, desfechos e seguimento tiveram grande variação entre os estudos. A maior incidência de eventos cardíacos foi de 32% em um estudo de coorte que teve seguimento de 36 meses e a menor incidência foi de 10% em um estudo com seguimento de nove meses. Os eventos mais comuns foram derrame pericárdico, arritmias, incluindo fibrilação atrial, insuficiência cardíaca e síndrome coronariana aguda.
A exposição de todo o coração foi o achado mais associado a eventos cardíacos e foi o melhor preditor de eventos após a radioterapia. A probabilidade de um evento cardíaco aumentou de 1 a 7% por Gray de dose cardíaca média após ajustes para possíveis confundidores e essa associação foi positiva, com HR 1,04 (IC 95% 1,03-10,6).
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Comentários e conclusão: radioterapia e DCV
Esse estudo mostrou que parece haver uma relação dose-resposta positiva entre exposição do coração a radioterapia e eventos cardíacos, com maiores doses de radiação induzindo maior risco de eventos cardíacos adversos, como derrame pericárdico, arritmias, insuficiência cardíaca e síndrome coronariana aguda.
Um preditor importante foi a dose cardíaca média de radiação, com o risco de eventos aumentando em 4% para cada Gray de dose média adicional, o que está condizente com a literatura disponível.
A variação na definição dos eventos cardíacos e tempo de seguimento entre os estudos foi ampla e reforça a necessidade de uniformização. Porém, as análises foram consistentes, sem influência de um estudo isoladamente comparado aos outros.
Esta análise incluiu apenas estudos retrospectivos e os resultados são apenas geradores de hipótese, já que não é possível inferir causalidade. Assim, mais estudos, principalmente prospectivos, são necessários para confirmar esses resultados e identificar pontos de atuação para reduzir o risco de complicações cardiovasculares relacionados a radioterapia.
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