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Terapia Intensiva12 março 2025

Relação entre aumento de troponina e mortalidade na sepse 

Estudo analisou a associação entre os níveis séricos iniciais de hs-cTn e o risco de mortalidade em pacientes diagnósticados com sepse
Por Juliana Avelar

De acordo com a definição atual, sepse é uma disfunção orgânica com risco de vida causada por uma resposta desregulada do hospedeiro à infecção. Já sabemos que a lesão miocárdica aguda ocorre frequentemente em pacientes com sepse, mas o papel prognóstico da elevação da cTn ainda não está claro. A lesão miocárdica aguda na sepse é multifatorial, envolvendo dano inflamatório direto aos cardiomiócitos e um desequilíbrio entre a oferta e a demanda de oxigênio no miocárdio (infarto do miocárdio tipo 2), podendo até mesmo levar ao infarto do miocárdio tipo 1. 

Hoje vamos resumir uma revisão sistemática que avaliou a associação entre os níveis séricos iniciais de hs-cTn e a mortalidade em curto prazo de pacientes admitidos na UTI ou no departamento de emergência devido por sepse, de acordo com os critérios Sepsis-3. 

Critérios de elegibilidade 

Estudos primários observacionais e intervencionistas foram considerados elegíveis se incluíssem pelo menos dez eventos em pacientes adultos diagnosticados com sepse pelos critérios Sepsis-3, sepse grave pelos critérios Sepsis-1 ou Sepsis-2, ou choque séptico por qualquer um dos critérios acima. 

A elegibilidade foi ainda restrita a estudos que especificassem a utilização de qualquer teste hs-cTn nas primeiras 24 horas e cujo limite de detecção relatado fosse considerado de alta sensibilidade (ou seja, < 5 ng/L).  

Foram incluídos 17 estudos, abrangendo um total de 6.242 pacientes. A idade média dos pacientes variou entre 57 e 73,3 anos. O percentual de homens foi entre 52% e 70%. 

O acompanhamento da mortalidade foi de 28 a 30 dias em 10 estudos, até a alta da UTI em dois estudos e intra-hospitalar em cinco estudos. A taxa de mortalidade em curto prazo variou entre 16,9% e 53,8%. O momento da coleta da troponina foi descrito como realizado durante o primeiro dia em três estudos e na admissão nos demais. 

Meta-análise 

No modelo não ajustado para a razão de chances de mortalidade, um total de 1.064 indivíduos morreram entre 3.935 pacientes, resultando em uma taxa de mortalidade de 27%. A OR combinada para hs-cTn elevada foi de 1,78, sugerindo que indivíduos com troponina elevada apresentaram 78% mais chances de morte. 

No modelo ajustado, foram incluídos 1.216 eventos entre 4.336 pacientes, com uma taxa de mortalidade de 28%. O modelo ajustado não mostrou uma associação significativa entre hs-cTn elevada e mortalidade. 

Discussão 

Esta revisão sistemática com meta-análise avaliou a associação entre hs-cTn e mortalidade de curto prazo em pacientes com sepse na UTI/emergência. Embora os pacientes que não sobreviveram tenham apresentado um aumento significativo nos níveis iniciais de hs-cTn, esse aumento provavelmente resultou em pouca ou nenhuma diferença na mortalidade após o controle de fatores de confusão. 

Os resultados diferiram de meta-análises anteriores, que consistentemente demonstraram uma associação significativa entre cTn e mortalidade na sepse. No entanto, dois desses estudos foram publicados antes da definição Sepsis-3 e incluíram poucos estudos utilizando hs-cTn; além disso, os três estudos não incluíram exclusivamente pacientes com disfunção orgânica, que é um critério obrigatório na definição atual de sepse. Apenas uma meta-análise anterior relatou uma estimativa de efeito ajustada para fatores de confusão. 

Além disso, a sensibilidade do ensaio de cTn pode afetar significativamente a capacidade prognóstica do biomarcador. Por exemplo, Røsjø et al. relataram uma associação significativa não ajustada para hs-cTnT, mas não para cTnT de 4ª geração e mortalidade. Assim, as diferenças entre os resultados dessa revisão sistemática e os de revisões anteriores podem ser explicadas pela inclusão de pacientes mais gravemente doentes e pela maior sensibilidade dos ensaios de cTn desse estudo atual. 

Considerando que a elevação da cTn é comum em pacientes com choque séptico e que os níveis plasmáticos de hs-cTn foram mais altos em não sobreviventes do que em sobreviventes, isso confirma que a lesão miocárdica é uma condição precoce e frequente em pacientes sépticos que posteriormente sofrem deterioração clínica. Consequentemente, um valor plasmático elevado de hs-cTn em um paciente séptico deve alertar os médios para um maior risco de desfechos adversos.  

Embora a associação entre hs-cTn elevado e mortalidade tenha deixado de ser significativa na meta-análise das estimativas ajustadas, isso pode refletir que a elevação do hs-cTn na sepse está relacionada com disfunção orgânica global e não apenas com lesão miocárdica isolada. Assim, mesmo sem uma associação independente com a mortalidade, os níveis de hs-cTn são um biomarcador valioso para identificar pacientes com maior risco de desfechos adversos e podem desempenhar um papel importante na estratificação de risco clínica.  

Limitações 

A falta de especificação do limite de detecção do ensaio de hs-cTn em muitos estudos foi uma limitação para a seleção dos estudos nessa revisão. Além disso, a disparidade nos pontos de corte de normalidade do hs-cTn entre os estudos primários pode impactar drasticamente as medidas de efeito. 

Por fim, uma limitação importante na meta-análise dos modelos ajustados é a discrepância no conjunto de fatores de confusão e a omissão de variáveis relevantes em algumas regressões dos estudos primários. 

Vale destacar que condições cardiovasculares crônicas podem afetar os níveis basais de troponina de alta sensibilidade em pacientes sépticos. No entanto, a maioria dos estudos nesta revisão sistemática excluiu pacientes com doença cardiovascular preexistente para minimizar fatores de confusão. Pesquisas futuras devem explorar como as condições cardiovasculares preexistentes modificam o valor prognóstico da troponina de alta sensibilidade na sepse. 

Conclusões 

Esta revisão sistemática mostrou que níveis elevados de hs-cTn em pacientes sépticos estão associados a um aumento no risco de mortalidade de curto prazo, destacando sua utilidade como um biomarcador amplamente disponível para a classificação de risco na sepse. 

No entanto, após o controle de fatores de confusão, a associação entre a elevação precoce do hs-cTn e a mortalidade de curto prazo foi atenuada, sugerindo que hs-cTn não está independentemente associada ao risco de mortalidade na sepse sob a definição atual. 

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Referências bibliográficas

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