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Terapia Intensiva23 junho 2023

Meropenem em sepse: infusão contínua ou intermitente?

O estudo discutiu se a administração contínua de meropenem traz melhoras significantes no quadro de pacientes enfermos com sepse.
Por Raissa Moraes

Bactérias resistentes causaram mais de 2,8 milhões de infecções nos EUA em 2019 e contribuem por aproximadamente 35900 mortes por ano. Os antibióticos β-lactâmicos são os mais utilizados, para tratamento de infecções por germes resistentes ou não, respondendo por mais de 65% das prescrições intravenosas.

Essa classe de antimicrobiano (ATM) é tipicamente administrada de forma intermitente. Ou seja, sua concentração plasmática atinge um pico alto, porém, devido à meia vida curta, rapidamente há a diminuição da concentração, o que pode diminuir a eficácia e promover seleção de bactérias resistentes.  

Dessa forma, estudos farmacocinéticos sugeriram o prolongamento do tempo de administração para fornecer níveis séricos constantes maximizando o tempo acima da concentração inibitória mínima. Revisões sistemáticas e meta-análises posteriores mostraram que a administração contínua ou prolongada diminuiu a mortalidade em pacientes sépticos, o que resultou no uso em protocolos clínicos e na sugestão de administração prolongada no lugar da intermitente pelas diretrizes da Surviving Sepsis Campaign. Visando um melhor entendimento sobre o assunto, foi realizado o estudo MERCY. 

Saiba mais: Sepse: entendendo o clearance de lactato

Meropenem em sepse: infusão contínua ou intermitente?

Meropenem em sepse: infusão contínua ou intermitente?

Métodos 

Um ensaio clínico multicêntrico (26 hospitais em quatro países – Croácia, Itália, Cazaquistão e Rússia), duplo cego, desenhado para testar a hipótese de que, em pacientes críticos com sepse, a administração contínua de meropenem diminuiria a mortalidade e o surgimento de resistência bacteriana quando comparado a administração intermitente. Todos os pacientes internados em unidade de terapia intensiva (UTI) com sepse ou choque séptico que tiveram prescrição de meropenem foram considerados elegíveis.  

A sepse foi definida como a presença de síndrome inflamatória sistêmica, infecção suspeita ou documentada e escore SOFA dois ou mais. O choque séptico foi definido como hipotensão persistente com necessidade de vasoconstritores para manter pressão arterial média de 65 mmHg ou mais e um lactato maior que 2 mmol/L após ressuscitação volêmica adequada. Os critérios de exclusão incluíram recusa à participação no estudo, terapia anterior com carbapenêmicos, probabilidade de sobrevivência avaliada pelo escore SAPS II baixa (maior ou igual a 65 pontos) e imunossupressão grave.  

Imediatamente após a decisão clínica de prescrever meropenem, mesmo antes da randomização ou função renal, os pacientes receberam uma dose de ataque de 1g e, antes do ATM, foram coletadas culturas: as culturas respiratórias incluíram amostras distais (como lavado broncoalveolar), três amostras de hemoculturas com pelo menos uma não retirada de um cateter vascular e cultura específica do foco infeccioso. Após a coleta das amostras microbiológicas, os pacientes foram randomizados para receber administração contínua de meropenem na dose de 3 g durante 24 horas ou administração intermitente (mais de 30 a 60 minutos) de uma dose igual que foi dividida em 3 bolus diários (ou seja, 1 g a cada 8 horas). 

Resultados 

O resultado primário foi um composto de mortalidade por todas as causas e emergência de bactérias multirresistentes ou extensivamente resistentes no dia 28. Os desfechos secundários incluíram dias vivos e livres de antibióticos no dia 28, dias vivos e livres da UTI no dia 28 e mortalidade por todas as causas no dia 90. 

Entre 5 de junho de 2018 e 9 de agosto de 2022, 607 pacientes foram randomizados (303 para receber meropenem contínuo e 304 intermitente), com idade média de 64 anos, sendo 33% do sexo feminino. Todos os pacientes foram admitidos em UTIs e a maioria dos pacientes foi submetida a ventilação mecânica invasiva. O choque séptico esteve presente em 369 pacientes (61%) e os 238 restantes (39%) apresentaram sepse. O tempo médio desde a admissão hospitalar até a randomização foi de 9 dias e a duração mediana da terapia com meropenem foi de 11 dias. 

Em 70% dos pacientes em administração contínua e 64% intermitente, o foco infeccioso foi identificado e eram principalmente trato respiratório inferior, trato gastrointestinal e genitourinário. 74% dos pacientes receberam antibióticos adicionais, sendo os glicopeptídeos os mais prescritos. Em 28% dos pacientes no grupo de administração contínua e em 30% dos pacientes no grupo de administração intermitente, um patógeno causador nunca foi identificado. As espécies bacterianas gram-negativas mais frequentemente identificadas foram Klebsiella, Pseudomonas e Escherichia coli. 

Aos 28 dias, não houve diferença estatisticamente significativa no resultado primário: 142 (47%) pacientes no grupo de administração contínua e 149 (49%) no intermitente morreram ou experimentaram o surgimento de resistência (risco relativo, 0,96 [95% CI, 0,81 a 1,13], P  = 0,60). Assim, os resultados do estudo atual sugerem que a administração contínua de meropenem não melhora os resultados clinicamente relevantes em pacientes gravemente enfermos com sepse, incluindo mortalidade a longo prazo. 

Leia também: Meropenem ou piperacilina-tazobactam para tratar infecções urinárias complicadas?

Conclusão e mensagem prática 

Os pesquisadores sugeriram ainda que o método de administração do meropenem deve levar em consideração outros fatores, como viabilidade, disponibilidade de linha intravenosa, problemas com a estabilidade do medicamento, custos e questões logísticas. Além disso, não foi possível identificar subgrupos específicos nos quais a administração contínua possa ser o alvo de futuros ensaios clínicos. 

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Referências bibliográficas

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