O vasoespasmo cerebral é uma das complicações mais relevantes e desafiadoras após uma hemorragia subaracnoidea aneurismática (HSAa). Sua importância reside no fato de ser uma causa potencialmente tratável de deterioração neurológica tardia, com impacto direto nos desfechos funcionais dos pacientes.
O termo “vasoespasmo” refere-se classicamente ao estreitamento arterial visível em exames angiográficos. No entanto, clinicamente, ele é definido por deterioração neurológica retardada e isquemia cerebral tardia (ICT), que podem surgir dias após o evento inicial, geralmente entre o 4º e o 14º dia. Estima-se que entre 20% e 40% dos pacientes desenvolvam vasoespasmo sintomático, e até metade das mortes em sobreviventes iniciais estejam relacionadas com essa complicação.
O que sabemos até agora?
O manejo do vasoespasmo envolve medidas profiláticas, vigilância clínica e neuromonitoramento, além de intervenções terapêuticas indicadas conforme evolução clínica. O nimodipino oral (60 mg a cada 4 horas por 21 dias) deve ser administrado de forma universal a todos os pacientes com HSAa, independentemente do grau clínico ou presença de vasoespasmo. É a única intervenção farmacológica com benefício comprovado na redução da incidência de ICT e melhora funcional.
Já a hipertensão induzida é uma estratégia terapêutica, indicada apenas em pacientes com sinais clínicos ou radiológicos de isquemia cerebral tardia, como rebaixamento do nível de consciência, novos déficits focais ou hipoperfusão em exames como tomografia por perfusão (CTP). Esses são os principais “triggers” clínicos para iniciar a intervenção.
Importante: a hipertensão só deve ser induzida após o tratamento definitivo do aneurisma, seja por clipagem cirúrgica ou embolização endovascular, a fim de evitar o risco de ressangramento. Uma vez tratado o aneurisma, visa-se atingir uma pressão arterial média (PAM) entre 90 e 110 mmHg, utilizando vasopressores como norepinefrina, sempre com monitorização rigorosa de perfusão cerebral e sinais de sobrecarga hemodinâmica. Em casos refratários ou com vasoespasmo severo detectado em imagem, podem ser necessárias intervenções endovasculares, como angioplastia com balão (em grandes vasos proximais) ou infusão intra-arterial de vasodilatadores (ex: milrinona, verapamil).
Incertezas
A relação entre vasoespasmo angiográfico e ICT não é direta. Muitos pacientes com vasoespasmo não apresentam sintomas, enquanto outros desenvolvem ICT sem vasoespasmo visível em exames. Isso evidencia que mecanismos adicionais — como disfunção microvascular, inflamação, formação de microtrombos e despolarizações corticais, são igualmente relevantes.
Além disso, estudos com terapias direcionadas, como o antagonista da endotelina clazosentan, não demonstraram benefício clínico robusto. O uso rotineiro da hipertensão induzida também é debatido, especialmente após os resultados negativos do estudo HIMALAIA. Biomarcadores e genótipos de risco seguem promissores, mas carecem de padronização e validação.
Mensagem prática: Vasoespasmo após Hemorragia Subaracnoidea Aneurismática
Todo paciente com HSAa deve iniciar nimodipino o quanto antes. A vigilância neurológica intensiva é essencial, principalmente entre os dias 4 e 14. Em pacientes despertos, alterações como sonolência, lentificação de fala ou sinais focais sutis devem acender o alerta para ICT. Em pacientes sedados ou com exame neurológico limitado, o uso de Doppler transcraniano, CTP, EEG contínuo e neuromonitorização neurológica multimodal (ptiO₂, microdiálise) permite identificação precoce de hipoperfusão.
Se houver suspeita de ICT e o aneurisma estiver tratado, a indução de hipertensão pode ser iniciada, seguida, se necessário, de abordagem endovascular. O foco não deve ser apenas reverter o vasoespasmo visível, mas preservar o cérebro em risco com medidas oportunas, integradas e individualizadas.
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