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Cardiologia7 agosto 2024

Hipertensão resistente: como diagnosticar e tratar

Confira indicações importantes para conduta frente a Hiperaldosteronismo primário, hipertensão renovascular e mais.

A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é o principal fator de risco para doenças cardiovasculares e tem impacto em morbimortalidade, pois é fator de risco para acidente vascular cerebral (AVC), doença coronariana e doença vascular periférica.  

Quando a pressão arterial (PA) não é controlada mesmo com uso de três classes de anti-hipertensivos em doses máximas, incluindo um diurético, ou com uso de quatro ou mais classes, é chamada de hipertensão resistente. O risco de complicações cardiovasculares e renais desses pacientes é muito maior que dos pacientes com HAS não resistente. 

Para o diagnóstico desta condição é necessário excluir outras causas de resistência ao tratamento, como não aderência, efeito do jaleco branco e medidas realizadas de forma inadequada. Recentemente foi publicada uma revisão sobre o assunto, com enfoque em diagnóstico e tratamento. Os principais pontos seguem abaixo. 

Paciente com hipertensão maligna aferindo a pressão arterial.

Epidemiologia 

A prevalência varia entre 12 e 18% de todos os pacientes com HAS, porém este dado parece superestimado, já que os estudos não costumam excluir pacientes com resistência ao tratamento. 

Diagnóstico e avaliação 

A avaliação se inicia com a medida adequada da PA, com técnica correta. A medida ambulatorial da PA (MAPA) ou medida residencial da PA (MRPA) auxiliam na exclusão do efeito do jaleco branco. 

A não aderência corresponde a 25-50% dos casos investigados e deve sempre ser excluída. Um contribuinte importante é a polifarmácia e um estudo que avaliou a presença de medicação na urina dos pacientes encontrou maior taxa de não aderência de acordo com maior número de medicações. 

Todos os pacientes devem ser investigados para causas secundárias de HAS e as principais causas são hiperaldosteronismo primário (10% dos pacientes no geral e em 25% dos com hipertensão resistente) e hipertensão renovascular, mais rara e que pode resultar de displasia fibromuscular ou doença aterosclerótica.  

Algumas outras causas menos frequentes são coarctação de aorta, feocromocitoma, síndrome de Cushing, deficiência de 11beta-hidroxilase, hiperplasia adrenal congênita, resistência primária ao cortisol, tumores produtores de deoxicorticosteroide, hipo ou hipertireoidismo, hiperparatireoidismo primário e acromegalia. 

Hiperaldosteronismo primário 

Ocorre por produção de aldosterona de forma inapropriada, como consequência de hiperplasia difusa do córtex adrenal, doença nodular cortical adrenal, adenomas e raramente carcinoma adrenal. Isso leva a aumento do volume de fluido intravascular e hipertensão, com redução da renina. Pode haver acometimento de apenas uma ou das duas adrenais e existem formas genéticas e familiares, decorrentes de mutações específicas que geram hipertensão grave na infância.  

O excesso de aldosterona gera efeitos pró-inflamatórios e pró fibróticos, disfunção endotelial e consequente aumento de fibrilação atrial (FA), AVC, infarto agudo do miocárdio (IAM), hipertrofia ventricular esquerda (HVE), disfunção diastólica e endurecimento de grandes artérias, com remodelamento dos vasos. 

A apresentação clássica é de hipertensão com hipocalemia e adenoma em adrenal. Porém, a apresentação mais comum é com potássio normal. Algumas diretrizes recomendam investigar todos os pacientes com HAS abaixo dos 40 anos, outras recomendam também investigar os que tem HAS grave, apneia do sono, história familiar de HAS ou AVC antes dos 40 anos, HAS com FA e familiares de pessoas com hiperaldosteronismo primário.  

A investigação é feita com dosagem de aldosterona e renina simultaneamente e o resultado de renina suprimida com aldosterona aumentada é positivo. 

O tratamento cirúrgico é o melhor tratamento para adenoma unilateral. Anti-hipertensivos são indicados para doença bilateral ou quando o paciente não é candidato a cirurgia. A medicação de escolha é um antagonista do receptor mineralocorticoide (ARM), como espironolactona ou eplerenone, em doses crescentes até que a renina deixe de ficar suprimida. Pode ser necessário associar diuréticos tiazídicos ou bloqueadores de canal de cálcio. 

Hipertensão renovascular 

A maioria dos casos é causada por doença aterosclerótica, já a fibrodisplasia é menos comum, mas curável e encontrada em pacientes mais jovens. O tratamento de escolha é o farmacológico, além de controle de hipertensão, lipídios e cessação de tabagismo.  

A avaliação com imagem auxilia na decisão de intervenção com angioplastia com balão ou stent e geralmente é recomendada quando há hipertensão acelerada, resistente ou maligna que não responde ao tratamento com anti-hipertensivos em dose otimizada, quando há piora de função renal, insuficiência cardíaca congestiva ou edema pulmonar agudo de repetição. 

Tratamento da hipertensão resistente 

O tratamento adequado reduz o risco cardiovascular e de mortalidade. Redução de 10mmHg da PA sistólica ou 5mmHg da diastólica reduz o risco de AVC em 40%, de doença coronária isquêmica em 30% e a redução de 5mmHg de PA sistólica reduz o risco de eventos cardiovasculares maiores em 10%. 

Os fatores relacionados a estilo de vida como obesidade, ingesta de sal, álcool, sedentarismo e dieta ruim também devem ser tratados. A perda de peso baixa a PA em 4,5/3,2 mmHg e a restrição de sal para < 1500mg/dia também parece ter efeito benéfico. A associação de dieta e atividade física reduz ainda mais a PA. 

Algumas medicações ou drogas que aumentam a PA e devem ser suspensas se possível. Estas são anti-inflamatórios, anticoncepcionais orais, hormônios para reposição hormonal, cocaína, anfetamina, descongestionantes nasais, antitussígenos e antidepressivos, além de alguns agentes quimioterápicos. 

Sempre deve-se investigar a não aderência e otimizar o tratamento medicamentoso, com associação de medicações em comprimidos únicos, com doses fixas e posologia confortável.  

As classes de medicações recomendadas são IECA ou BRA, bloqueador de canal de cálcio e diuréticos de longa ação, como tiazídicos, clortalidona ou indapamida. Caso a PA se mantenha alta, pode-se adicionar um ARM como quarta droga. Se houver disfunção renal, um quelante de potássio, como patiromer, pode possibilitar o uso do ARM. 

Se apesar disso, a PA persistir aumentada, pode-se associar mais um anti-hipertensivo da classe dos betabloqueadores, alfa-bloqueadores, alfa-agonista e vasodilatadores diretos como hidralazina.  

Novas medicações foram desenvolvidas nos últimos anos: antagonistas de endotelina, inibidores da aldesterona sintase, novos antagonistas da aldosterona e inibidores da produção de angiotensinogênio por interferência no RNA. 

– Antagonistas da endotelina: foram avaliados em estudos de fase II e III e podem ser usados em pacientes com doença renal crônica, já que não induzem hipocalemia, porém apresenta alguns efeitos colaterais relevante. O aprocitentan foi aprovado pelo FDA para pacientes com hipertensão resistente, em conjunto com outros anti-hipertensivos.  

– Novos ARM: o finerenone não induz hipercalemia como espironolactona e eplerenone, porém seu efeito anti-hipertensivo é mais fraco. O esaxerenone é aprovado para hipertensão primária no Japão e parece ser melhor que eplerenone. 

– Inibidores da aldosterona sintase: bloqueiam os efeitos da aldosterona. São o baxdrostat, lorundrostat e desfadrostat, sendo o primeiro o mais bem estudado e há um estudo de fase III em andamento. 

– Inibidores da síntese de angiotensinogênio: agem por meio de modificações moleculares que inibem a translação do RNA e siRNA, resultando em degradação do RNAm alvo e reduzindo a síntese de angiotensinogênio. Os estudos com essas medicações ainda são de fase I e II, porém mostraram resultados animadores. 

– Bloqueador do receptor de angiotensina associado a inibidor da neprilisina: utilizado para IC, também é aprovado em alguns países para tratamento de hipertensão de difícil controle.  

Tratamento invasivo 

O procedimento mais eficaz e seguro é a denervação renal por cateter, que interrompe o tônus simpático por meio de ablação dos nervos renais. O estímulo simpático aumenta a reabsorção de sódio e secreção de renina, aumentando a PA. 

Em 2009 um estudo que realizava ablação por radiofrequência mostrou queda da PA em 6 meses e a denervação renal passou a ser recomendada por algumas diretrizes, porém um estudo posterior não mostrou diferença em relação ao placebo.  

Uma outra tecnologia testada foi a denervação renal por ultrassom e três estudos controlados e randomizados mostraram redução da PA com a técnica em pacientes com hipertensão leve. Um outro estudo avaliou esta técnica em pacientes com hipertensão resistente e também mostrou redução da PA. 

Comparando-se os dois procedimentos a PA foi mais reduzida no grupo que realizou a denervação renal por ultrassom comparado a radiofrequência. Os dois procedimentos são seguros no seguimento mais prolongado de três anos, com ocorrência de estenose de artéria renal extremamente baixa e redução da PA mantida ao longo do tempo. Alguns pontos ainda a definir são os preditores de resposta e quais terão mais benefício do procedimento. 

A denervação com utilização de álcool desidratado como agente neurolítico também se mostrou eficaz em um estudo mais recente. 

As diretrizes europeia, americana e asiática concordam em recomendar a denervação como potencial tratamento adjunto da hipertensão para pacientes com hipertensão resistente. O FDA indica como tratamento para pacientes que não tiveram melhora com modificação do estilo de vida e medicação anti-hipertensiva.  

Pode ser que em algum momento passe a ser indicada para pacientes não aderentes a tratamento medicamentoso ou que prefiram o procedimento ao uso de medicação. 

Outras modalidades de tratamento 

– Modulação do barorreceptor carotídeo: alguns dispositivos têm como alvo a ativação do baroreceptor carotídeo, testado em um estudo pequeno. Houve redução sustentada da PA, porém as custas de aumento de eventos adversos graves, não sendo recomendado atualmente. 

– Terapia de neuromodulação cardíaca: envolve a programação de uma sequência de intervalos atrioventriculares curtos e longos, realizado por meio do marcapasso. Este procedimento reduziu a PA em 6 meses de seguimento e será testado em um estudo randomizado com 500 pacientes. 

Comentários e conclusão 

Hipertensão resistente continua prevalente e um dilema clínico, já que é de difícil tratamento, leva a aumento do risco de eventos cardiovasculares, porém muitas vezes resulta de resistência ao tratamento. Existem diversos estudos randomizados que mostraram benefício de ARM e antagonistas de endotelina, além de estudos avaliando novas classes de medicação e diferentes dispositivos para controle de HAS resistente, com possibilidade de novidades nos próximos anos. 

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Referências bibliográficas

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