Infusão intermitente ou prolongada de betalactâmicos em pacientes com sepse?
Revisão sistemática comparou a eficácia clínica de infusão intermitente vs. prolongada de betalactâmicos em pacientes com sepse.
Quadros de sepse e choque séptico são uma importante causa de morte no mundo. A antibioticoterapia adequada e precoce, em conjunto com medidas de suporte, é um dos pilares para o tratamento dessas condições. Os betalactâmicos, por seu amplo espectro de ação e sua atividade bactericida, são amplamente utilizados nesse contexto. Por serem tempo-dependentes, espera-se que a administração por meio de infusões prolongadas ou contínuas apresente vantagens em relação à posologia clássica de infusões intermitentes, pois permitiriam alcançar concentrações séricas mais estáveis de droga livre e maior tempo em que essas concentrações ficariam acima da concentração inibitória mínima (CIM ou MIC) bacteriana.
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Entretanto, as infusões prolongadas de antibióticos podem apresentar alguns desafios, como a necessidade de bombas de infusão e equipos específicos e a estabilidade de antibióticos em temperatura ambiente. Além disso, os reais benefícios dessa estratégia apresentam resultados conflitantes em estudos publicados. Uma nova revisão sistemática procurou comparar a eficácia clínica de infusão intermitente vs. prolongada de betalactâmicos em pacientes com sepse.
Dados da nova revisão
Os critérios de inclusão para os estudos que compuseram a revisão sistemática foram: pacientes adultos, com 18 anos ou mais, diagnosticados com sepse e recebendo antibióticos betalactâmicos para infecção, grupo de intervenção com administração de betalactâmicos por infusão prolongada, grupo controle com administração de betalactâmicos por infusão intermitente e análise de desfecho de mortalidade por todas as causas ou cura clínica. Somente foram incluídos ensaios clínicos randomizados e que foram publicados em língua inglesa.
Foram excluídos estudos que não tinham sepse ou choque séptico como foco, com tipo diferentes de antibióticos entre os grupos de intervenção e de controle ou que não apresentavam dados clínicos de desfecho.
O desfecho primário foi mortalidade por todas as causas em 28 ou 30 dias. Mortalidade hospitalar ou na unidade de terapia intensiva (UTI) também foram usadas como desfecho. Desfechos secundários incluíram cura clínica, duração de tratamento, emergência de resistência bacteriana, tempo de permanência em UTI, tempo de hospitalização, mortalidade por todas as causas em 90 dias, mortalidade hospitalar por todas as causas e mortalidade em UTI.
Resultados
Após os processos de inclusão e exclusão, nove trabalhos foram incluídos na meta-análise, com dados de 1.762 indivíduos. A definição de sepse e choque séptico variou entre os estudos, que foram publicados entre 2006 e 2023. Meropenem foi o betalactâmico utilizado na maioria dos estudos. Somente 1 estudo avaliou estratégia de infusão prolongada, com todos os demais utilizando infusões contínuas nos grupos de intervenção. Cinco estudos foram considerados como tendo risco alto de viés.
No geral, a mortalidade encontrada no grupo de infusão prolongada foi de 23,5% (206/877) e de 28,7% (254/885) no grupo de administração intermitente. Os dados agrupados mostraram uma redução significativa no risco de mortalidade por todas as causas em 30 dias com administração de infusão prolongada em comparação com infusão intermitente (RR = 0,82; IC 95% = 0,70 – 0,96; p = 0,01). A realização de uma análise sequencial experimental (trial sequencial analysis ou TSA) identificou risco de os resultados serem falso positivos e que mais estudos seriam necessários para obter uma reposta em relação à mortalidade.
A análise dos dados agrupados também mostrou que infusão prolongada de betalactâmicos esteve associada à redução significativa na mortalidade hospitalar (RR = 0,76; IC 95% = 0,60 – 0,96; p = 0,02) e em UTI (RR = 0,74; IC 95% = 0,57 – 0,95; p = 0,02). Somente 2 estudos apresentaram dados em relação à mortalidade em 90 dias e o resultado não mostrou diferença entre o grupo de infusão prolongada e o grupo de infusão intermitente (RR = 0,98; IC 95% = 0,84 – 1,15; p = 0,82).
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Na maioria dos sete estudos que abordaram cura clínica, esta foi definida como resolução completa de todos os sinais e sintomas relacionados à infecção. Quatro estudos avaliaram esse desfecho ao final do tratamento, porém 3 o fizeram entre 7 e 14 dias e 2, em 14 dias. Os resultados indicaram que a infusão prolongada poderia melhorar significativamente a cura clínica (RR = 1,26; IC 95% = 1,11 – 1,43; p = 0,0005). Não houve diferença entre os grupos em relação ao tempo de duração do tratamento, tempo de hospitalização ou tempo de permanência na UTI. Somente 2 estudos apresentaram informação sobre emergência de resistência bacteriana, ambos sem diferença entre os grupos.
Na análise por subgrupos, os resultados mostraram que, quando as doses totais diárias de antibióticos nos dois grupos eram consistentes, a estratégia de infusão prolongada mostrou-se superior (RR = 0,84; IC 95% = 0,71 – 0,99; p = 0,04). Entretanto, quando não eram, não houve diferença significativa (RR = 0,76; IC 95% = 0,49 – 1,20; p = 0,25). A análise de sensibilidade — após a exclusão de um estudo que não utilizou dose de ataque no grupo de infusão prolongada — mostrou resultados semelhantes ao da análise principal (RR = 0,83; IC 95% = 0,71 – 0,97; p = 0,02).
Mensagens práticas
- Os resultados dessa revisão sistemática com meta-análise mostraram que a administração de betalactâmicos por meio de infusão prolongada ou contínua em pacientes com sepse ou choque séptico resultou em redução de mortalidade em 30 dias.
- Contudo, tais resultados foram considerados como tendo baixo nível de certeza e a análise sequencial indica que mais estudos são necessários para confirmar essa conclusão.
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