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Terapia Intensiva12 setembro 2025

Infecções fúngicas invasivas em pacientes críticos

Estudo avaliou a incidência das infecções fúngicas invasivas nos pacientes da UTI, identificou os fatores de risco e fez análise do tratamento e dos desfechos clínicos.
Por Lavínia Barcellos

As infecções fúngicas invasivas (IFI) representam um dos maiores desafios da prática clínica em unidades de terapia intensiva (UTI). Apesar de menor prevalência comparada às infecções bacterianas, torna-se importante sua discussão devido à alta mortalidade, dificuldade diagnóstica e impacto sobre os custos durante a internação. 

Há um crescimento de populações de risco no cenário de UTI, como pacientes submetidos a terapias imunossupressoras, cirurgias complexas, uso de antibióticos de amplo espectro e dispositivos invasivos. Dessa forma, há um aumento significativo da incidência de tais infecções, sendo os fungos do gênero Candida e Aspergillus os principais agentes etiológicos, com perfis distintos de apresentação clínica e letalidade. 

Neste artigo vamos analisar um estudo que tem como objetivo avaliar a incidência das IFI nos pacientes da UTI, identificação dos fatores de risco, análise do tratamento e dos desfechos clínicos.  

Sobre o estudo 

O estudo em questão é uma revisão sistemática e meta-análise, que tem como base dados extraídos de 34 estudos observacionais realizados entre 1999 e 2024. O objetivo principal do estudo foi avaliar a prevalência global de infecções fúngicas invasivas (IFI) em pacientes críticos internados em UTIs. Além disso, o estudo também buscou identificar os fatores de risco, analisar o tratamento utilizado e os desfechos clínicos. 

A prevalência de IFI foi de 5% (IC 95%: 3-7%) entre os pacientes críticos internados nas UTIs. O estudo incluiu mais de 2.000 pacientes que desenvolveram infecção fúngica invasiva confirmada por critérios clínicos, microbiológicos e laboratoriais. 

Leia mais: Infecções fúngicas invasivas no CTI 

Pergunta PICO 

  • P (População – População): Pacientes adultos internados em unidades de terapia intensiva (UTI), em estado crítico, com risco ou diagnóstico de infecção fúngica invasiva (IFI).
  • I (Intervenção – Intervenção): Tratamento antifúngico sistêmico (equinocandinas, azólicos ou anfotericina B), iniciado de forma empírica ou dirigida conforme o agente identificado.
  • C (Comparação – Comparação): Pacientes críticos sem IFI ou pacientes com IFI que receberam antifúngico tardio ou inadequado.
  • O (Outcome – Desfechos): Incidência de IFI, espécies isoladas, distribuição dos sítios de infecção, resposta terapêutica, mortalidade hospitalar, tempo em ventilação mecânica e duração da internação em UTI. 

Para entender os resultados e analisar o estudo, torna-se importante compreender a fisiopatologia das infecções fúngicas invasivas: 

Primeiramente, no ambiente da UTI normalmente há uma quebra da barreira de defesa do hospedeiro, muitas vezes caracterizada pela presença de dispositivos de invasão como cateteres venosos centrais, nutrição parenteral, ventilação mecânica e procedimentos. Dessa forma, há um favorecimento para a infecção fúngica, até mesmo em corrente sanguínea. 

Além disso, no contexto do paciente crítico, vemos uso extensivo de antibióticos de amplo espectro, o que acaba suprimindo a microbiota bacteriana e criando espaço para proliferação fúngica. Ainda, outras medicações como corticoides e quimioterápicos e condições como doenças imunossupressoras e hematológicas contribuem para deficiência na imunidade celular, o que é um fator de risco em si para desenvolvimento de aspergilose invasiva.  

Dentro de todo esse contexto, com uso intensivo de diferentes terapêuticas e tendência à resistência, observamos ainda uma pressão seletiva, levando ao surgimento de cepas mais resistentes o que dificultam cada vez mais o manejo. 

O resultado desse processo é a invasão tecidual e disseminação hematogênica, podendo ocasionar repercussões sistêmicas graves, sepse e falência de múltiplos órgãos. 

Diagnóstico 

Como proposta para intervenção, temos principalmente o diagnóstico precoce dessa condição, já que o estudo em questão mostra que a mortalidade aumenta exponencialmente quando há atraso da terapia. 

Observamos uma série de questões que podem atrasar o diagnóstico como a baixa sensibilidade das hemoculturas, manifestações clínicas inespecíficas, tempo prolongado para confirmação microbiológica, necessidade de biomarcadores que não estão amplamente disponíveis e achados radiológicos inespecíficos. 

Dessa forma, o tratamento empírico é observado na maioria dos pacientes, o que apesar de necessário em muitos casos, pode contribuir para uso excessivo dos antifúngicos. 

Tratamento descrito no estudo 

O tratamento foi conduzido com antifúngicos sistêmicos, escolhidos de acordo com o perfil clínico do paciente e, quando disponível, com base na identificação microbiológica. 

  1. Equinocandinas (caspofungina, micafungina, anidulafungina): usadas como primeira escolha na candidíase invasiva, especialmente em pacientes críticos instáveis. Apresentaram boa resposta inicial e foram frequentemente de-escalonadas para fluconazol quando havia estabilidade clínica e identificação do agente sensível. 
  2. Azólicos (voriconazol, fluconazol, posaconazol): voriconazol foi o antifúngico de eleição para aspergilose invasiva. Fluconazol foi utilizado em pacientes menos graves ou como terapia de consolidação. 
  3. Anfotericina B lipossomal: reservada para casos graves, infecções por fungos raros ou quando há resistência documentada. 

Resultados observados 

A revisão sistemática e meta-análise identificou 34 estudos, envolvendo 655.169 pacientes críticos internados em UTIs. A análise demonstrou que a prevalência global de infecções fúngicas invasivas (IFI) entre esses pacientes foi de 5% (IC 95%: 3–7%), evidenciando que, embora relativamente pouco frequentes, essas infecções têm grande impacto clínico. A heterogeneidade entre os estudos foi elevada (I² = 99,9%; p < 0,01), refletindo variações metodológicas, populacionais e regionais. 

Distribuição por gênero de fungo 

  • Aspergillus spp.: prevalência de 10% (IC 95%: 5–18%).
  • Candida spp.: prevalência de 3% (IC 95%: 1–5%).
  • Outros fungos (como Cryptococcus e Fusarium): prevalência de 5% (IC 95%: 1–5%). 

Para contextualizar os dados de prevalência da meta-análise, trazemos achados do AURORA Project, estudo observacional prospectivo realizado em 18 UTIs do sul da Itália durante 18 meses, que registrou 105 episódios de infecções fúngicas invasivas em 5.561 pacientes: 

  • Mortalidade hospitalar global nas IFI: 42,8 %
  • Mortalidade nas infecções por fungos filamentosos (moldes): 61,5 %
  • Todas as infecções por leveduras foram candidemias, com predominância de C. non-albicans (59,8 %) — sendo C. parapsilosis a espécie mais comum (61,8 %). 

Esses dados reforçam que, além de sua frequência, as infecções fúngicas invasivas apresentam alta mortalidade, especialmente quando causadas por fungos filamentosa (moldes), destacando a relevância clínica das IFI em UTIs. Os achados do estudo reforçam que as infecções fúngicas invasivas são menos frequentes que as bacterianas, mas muito mais letais.  

Para lembrar… 

– As infecções fúngicas invasivas (IFI) acometem cerca de 5% dos pacientes críticos em UTI, com grande impacto clínico devido à alta mortalidade.

Candida spp. é o agente mais frequente, principalmente C. non-albicans, com C. parapsilosis sendo a espécie mais comum nas candidemias.

– Infecções por Aspergillus spp. (fungos filamentosos) apresentam maior mortalidade hospitalar.

– Protocolos de diagnóstico precoce, terapia antifúngica adequada e vigilância epidemiológica são fundamentais para reduzir a mortalidade e melhorar os desfechos clínicos. 

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Referências bibliográficas

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