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Terapia Intensiva23 outubro 2023

Hidrocortisona no choque séptico

Em 2018, o estudo multicêntrico ADRENAL com 3800 pacientes, mostrou benefício em relação ao uso de hidrocortisona.

Por Leandro Lima

Hidrocortisona no choque séptico: 50 mg de 6/6h ou 100 mg de 8/8h? Durante a evolução de um quadro de choque séptico ocorre uma insuficiência adrenal absoluta (de ocorrência mais rara) ou relativa que acaba por perpetuar essa condição. Desse modo, é razoável a utilização de corticosteroides para pacientes com sepse com o objetivo de restaurar o equilíbrio do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal e melhorar o desfecho de nossos pacientes.

Veja também: Pancreatite aguda: qual o papel da abordagem intervencionista?

O CORTICUS, de 2008, foi um estudo multicêntrico, randomizado, duplo-cego e placebo-controlado com participação de 499 pacientes com choque séptico que comparou o uso de placebo com hidrocortisona 50 mg de 6/6g por 5dias (e desmame gradual com retirada completa depois de 11 dias). A mortalidade em 28 dias [34,3 versus 31,5% no grupo placebo, p = 0,51] foi semelhante nos dois grupos, porém a duração do choque foi menor no grupo hidrocortisona [3,3 versus 5,8 dias]. 

Em 2018, o estudo multicêntrico ADRENAL com 3800 pacientes, mostrou benefício em relação ao uso de hidrocortisona (200 mg/dia por 7 dias) na resolução mais rápida do choque [3 versus 4 dias no grupo placebo, OR 1,32 (IC95% 1,23-1,41; p < 0,001], redução no tempo de ventilação mecânica [6 versus 7 dias no grupo placebo, OR 1,13 (IC95% 1,05-1,22; p < 0,001] e da necessidade de hemotransfusão [37,0 versus 41,7% no grupo placebo, OR 0,82 (IC95% 0,72-0,94; p = 0,004]. Não houve diferença em relação à mortalidade aos 28 dias nos dois grupos [27,9 versus 28,8% no grupo placebo, OR 0,95 (IC95% 0,82-1,1; p = 0,5]. 

Uma metanálise de 2018, utilizando os principais estudos sobre o tema, inclusive os citados até o momento (42 ensaios clínicos randomizados, incluindo 10.194 pacientes) concluiu que em pacientes gravemente enfermos com sepse, o uso de corticosteroides pode resultar em uma pequena redução da mortalidade ao mesmo tempo em que aumenta o risco de fraqueza neuromuscular. 

Os dados disponíveis hoje e inclusive as recomendações sugerem a favor do uso de corticoterapia no choque séptico, mas podemos definir alguns parâmetros para esse uso com o objetivo de facilitar o nosso raciocínio e prescrição. 

hidrocortisona

Indicação 

A Surviving sepsis campaign de 2021 (SSC 2021) traz a seguinte recomendação: 

“Para adultos com choque séptico e necessidade contínua de vasopressor, sugerimos o uso de corticosteroides intravenosos (Recomendação fraca; qualidade moderada de evidência). Observação: O corticosteroide típico usado em adultos com choque séptico é a hidrocortisona IV na dose de 200 mg/dia administrada como 50 mg por via intravenosa a cada 6 horas ou como uma infusão contínua. Sugere-se que seja iniciada após o uso de uma dose de norepinefrina ou epinefrina ≥ 0,25 mcg/kg/min por ao menos 4 horas”.

Dose 

A dose normalmente administrada para o tratamento da sepse varia entre 200 e 300 mg/dia de hidrocortisona por via intravenosa dividida em 50 mg de 6/6h ou 100 mg de 8/8h, o que é compatível com as diretrizes estabelecidas pela Society of Critical Care Medicine (SCCM) e pela European Society of Critical Care Medicine (EISCM), que sugerem uso de doses menores do que 400 mg/dia de hidrocortisona para o manejo do choque séptico. 

Uma coorte retrospectiva de 2021, multicêntrica, comparou 319 pacientes internados em UTIs com diagnóstico de choque séptico recebendo vasopressores e hidrocortisona entre 2013 e 2018 divididos em dois grupos: hidrocortisona em dose baixa (50 mg de 6/6h) e em dose alta (100 mg de 8/8h), tendo como desfecho primário a reversão do choque. A conclusão do estudo foi que a taxa de reversão do choque é semelhante em ambos os grupos, porém o uso de hidrocortisona em dose alta pode reduzir as taxas de recorrência do choque e a necessidade de vasopressores adicionais.  

Duração 

As diretrizes da SCCM e EISCM recomendam uma duração da corticoterapia maior ou igual a três dias, sendo que na maioria dos serviços o uso ocorre entre cinco e sete dias, com retirada gradual (desmame) ou interrupção abrupta. Não há consenso sobre qual deve ser a duração e retirada da corticoterapia e nem estudos robustos o suficiente para enfatizar tais recomendações. 

Saiba mais: Os principais sinais clínicos de choque

Mensagem prática 

Em função da ausência de recomendações específicas na literatura e com base nos achados apresentados anteriormente, podemos sugerir um esquema de uso de corticoterapia para os pacientes em choque séptico visando reduzir o trabalho da equipe multidisciplinar (com menos doses por intervalo de tempo e ausência de necessidade de diluição da hidrocortisona, já que uma ampola tem 100 mg), por uma duração de acordo com o preconizado, porém reduzida, e sem a necessidade de desmame. Lembrando que essa recomendação se baseia em um racional teórico disponível até o momento e que toda conduta deverá ser individualizada em relação ao paciente a que ela se aplica. 

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Referências bibliográficas

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