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Terapia Intensiva12 fevereiro 2024

Efeitos hemodinâmicos essenciais da noradrenalina

Estudos experimentais e clínicos têm demonstrado que a noradrenalina, em pequenas doses, pode se associar a maior estabilidade hemodinâmica.

Por Leandro Lima

O entendimento de conceitos fisiológicos básicos é fundamental para que se possa intervir racionalmente sobre os distúrbios fisiopatológicos que acometem os nossos pacientes. Nesse aspecto, vamos discutir os efeitos hemodinâmicos essenciais atribuídos à noradrenalina  

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Os vasos sanguíneos são dotados de dois receptores adrenérgicos: α1 e α2, que medeiam, em resposta ao estímulo catecolaminérgico, a vasoconstrição. No leito arterial, a vasoconstrição reduz o fluxo sanguíneo, com a possibilidade de gerar hipóxia tecidual. Entretanto, no leito venoso, a resposta ao estímulo dos adrenoceptores é variável, e depende do conceito de volume não estressado e volume estressado.  

Volume Não estressado (Vu) Estressado (Vs) 
Pressão transmural (PTM) Ausente Presente 
Participação ativa na circulação Ausente Presente 

A administração dos agonistas α-adrenérgicos tipicamente aumenta a PTM, mobilizando e convertendo o volume não estressado (Vu) em volume estressado (Vs). Como a densidade de receptores α-adrenérgicos é maior nas veias do que nas artérias, doses baixas de agonistas atuam mais intensamente no leito venoso. Dessa forma, espera-se, a partir da vasoconstrição venosa, um incremento do volume circulante, com aumento do retorno venoso e, por conseguinte, do volume sistólico e do débito cardíaco.   

De fato, o efeito hemodinâmico dos agonistas α-adrenérgicos no leito venoso depende de uma característica preliminar – o status-volêmico antes da sua administração. Em pacientes hipovolêmicos, espera-se o aumento do tônus simpático basal, com vasoconstrição das veias. Nesse cenário, a administração de noradrenalina pode acentuar a vasoconstrição drástica de veias e artérias, promovendo hipóxia tecidual e reduzindo o débito cardíaco, ainda que o efeito isolado sobre a pressão arterial sistêmica seja positivo.   

Duas analogias interessantes ajudam a elucidar esse conceito: a primeira é de que não conseguimos dar a partida em um automóvel sem combustível; e a segunda é de que não adianta ligar a bomba hidráulica de um poço artesiano que se encontra vazio. Por fim, uma premissa fundamental: pressão arterial sistêmica não guarda correlação direta com o débito cardíaco e com a perfusão tecidual.  

Em contrapartida, vamos caminhar para uma situação oposta, em que o tônus simpático basal encontra-se reduzido. Nesse cenário, espera-se um grande volume não estressado venoso. Na presença de má perfusão tecidual, a administração endovenosa de cristaloides não necessariamente se converterá em incremento do débito cardíaco, a menos que o volume não estressado tenha sido convertido a volume estressado. Caso esse processo não ocorra, a expansão volêmica será de utilidade limitada e contribuirá para a sobrecarga volêmica, especialmente problemática entre portadores de insuficiência renal e insuficiência cardíaca.   

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mão de médico injetando noradrenalina

Conclusão e mensagens práticas  

A utilidade dos conceitos farmacodinâmicos apresentados pode ser exemplificada a partir dos seguintes exemplos:  

  • No choque hipovolêmico, a administração isolada de noradrenalina, na ausência de expansão volêmica, promoverá incremento drástico do tônus simpático sobre o leito venoso e arterial, agravando a hipoperfusão e comprometendo o débito cardíaco.  
  • Estudos experimentais e clínicos têm demonstrado que a noradrenalina, em pequenas doses, pode se associar a maior estabilidade hemodinâmica no período perioperatório, permitindo a administração de menor volume de fluidos, com o potencial de amenizar a sobrecarga volêmica e as suas complicações;  
  • A pressão arterial sistêmica, uma meta hemodinâmica clássica da terapia intensiva, não guarda correlação direta com a perfusão periférica e o débito cardíaco. Na prática, um paciente normotenso às custas de doses elevadas de catecolaminas pode estar tendo o seu quadro agravado pelo suporte vasopressor. Nesses cenários, devemos considerar, caso a caso, outras intervenções, como a expansão volêmica na presença de fluido-responsividade; hemotransfusão em casos de anemia grave; associação de hidrocortisona endereçando à insuficiência adrenal relativa; correção de distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-básicos que possam estar prejudicando a resposta às catecolaminas e a contratilidade cardíaca; instituição de inotrópicos, vasodilatação ou dispositivo de assistência no choque cardiogênico. 

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Referências bibliográficas

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