Uma das apresentações mais aguardadas dos congressos americanos é o year-in-review (ano em revisão). Nela, algum grande nome da reumatologia resume os estudos que ele julga como os mais importantes publicados no último ano. Durante a edição de 2022 do congresso da American College of Rheumatology (ACR), a professora Carol Lanford, da Cleveland Clinic, foi a responsável por fazer essa seleção.
Neste texto, vou trazer os pontos mais importantes destacados por ela na sua aula. Vários desses trabalhos já foram abordados de forma mais detalhada no Portal PEBMED.
GLORIA trial: prednisolona em baixas doses
O primeiro estudo selecionado foi o GLORIA trial, que avaliou o uso de prednisolona em baixas doses no tratamento da artrite reumatoide (AR) do idoso (> 65 anos). Nesses estudo, os pacientes foram randomizados para receberem 5 mg/dia ou placebo, pelo período de 24 meses. Trata-se de um estudo randomizado, com alocação 1:1 e avaliação a cada 3 meses. Além disso, foi realizada imagem no baseline e ao final dos 24 meses. Com relação aos resultados, os autores observaram um valor valor de DAS28 (diferença de -0,37, em relação aos pacientes sem prednisona) e uma redução no dano estrutural (diferença no escore de Sharp/van der Heijde de -1,7). No entanto, isso ocorreu às custas de um incremento de 24% no risco de eventos adversos. Dessa maneira, devemos considerar esse tradeoff na hora de indicar o uso de corticoide prolongado nessa população.
ORAL Survaillance: tofacitinibe para pacientes com e sem risco cardiovascular
Um outro estudo comentado foi uma subanálise do estudo ORAL Survaillance, que já foi comentado aqui no nosso Portal. Em resumo, o estudo inicialmente publicado em 2021 demonstrou que o tofacitinibe não foi capaz de demonstrar sua não inferioridade em relação ao anti-TNF em pacientes com AR moderada a grave, no que diz respeito a risco cardiovascular e neoplasias. Nessa análise de subgrupo, os autores tentaram verificar se esse risco seria diferente entre pacientes com e sem fatores de risco cardiovascular. De fato, foi observado que os eventos cardiovasculares ocorrem principalmente em pacientes com fatores de risco ou com doença aterosclerótica estabelecida. Com isso, temos um dado adicional para melhor tomada de decisão na hora de tratar os pacientes com AR.
Além disso, houve destaque para as aprovações crescentes do uso de inibidores da JAK no tratamento das espondiloartrites. Atualmente, temos as seguintes drogas em estudo/aprovação:
- Espondiloartrite axial não radiográfica: upadacitinibe (aprovado pelo FDA);
- Espondilite anquilosante: tofacitinibe (aprovado pelo FDA) e upadacitinibe (aprovado pelo FDA);
- Artrite psoriásica: tofacitinibe e upadacitinibe (aprovado pelo FDA);
- Psoríase: deucravacitinibe (aprovado pelo FDA).
MIRROR: metotrexato e pegloticase no tratamento da gota
O estudo MIRROR avaliou a associação entre o metotrexato e a pegloticase no tratamento da gota avançada com tofos. No entanto, como a pegloticase não está disponível no Brasil e não tem previsão de entrada, fica apenas o registro dessa menção.
Um outro estudo que cobrimos previamente no Portal e estava dentre os artigos selecionados foi o ProDERM. Nele, foi avaliado o uso da imunoglobulina intravenosa 2 g/kg a cada 4 semanas por 16 semanas, em pacientes com dermatomiosite refratária. Vale destacar que a medicação foi eficaz em atingir um TIS ≥ 20% e reduzir a dose de corticoide. No entanto, isso ocorreu às custas de um aumento no risco trombótico. Sendo assim, podemos utilizar essa medicação no tratamento dos casos refratários, mas devemos estar bastante vigilantes com relação à ocorrência de eventos trombóticos nesses casos.
Com relação ao lúpus eritematoso sistêmico (LES), foram apresentados alguns estudos. O primeiro deles foi relacionado ao uso de CAR-T cells em uma série de pacientes. A ideia nesses casos é fazer um tratamento ablativo prévio com infusão das CAR-T cells anti-CD19 (células T com receptor antigênico quimérico), capazes de manter os níveis de linfócitos B CD19+ persistentemente suprimidos, levando à melhora da atividade de doença. Apesar de promissores, esses estudos ainda são preliminares. Além disso, foram apresentados dados do obinutuzumabe, um medicamento anti-CD20 muito mais potente que o rituximabe, e do iberdomide, um medicamento que age nas vias Ikaros e Aiolos (reduzindo a atividade de linfócitos B e das vias do interferon do tipo I), ambos favoráveis.
SEMAPHORE: tocilizumabe no tratamento da polimialgia
Por fim, um outro estudo destacado foi o SEMAPHORE, também previamente discutido aqui no Portal, que avaliou o uso do tocilizumabe no tratamento da polimialgia reumática refratária aos corticoides.
Comentários
A apresentação da professora Carol Langford foi bastante abrangente e destacou estudos de grande relevância para o avanço da reumatologia. Como vários deles foram discutidos previamente aqui no Portal PEBMED, sugiro a leitura desses textos para maior detalhamento em relação à metodologia e resultados mais completos.
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