A dermatomiosite (DM) é uma forma de miopatia autoimune sistêmica (MAS) que cursa, principalmente, com acometimento cutâneo e muscular, devido à inflamação crônica desses tecidos. Como manifestações, podemos observar fraqueza muscular proximal, simétrica e progressiva, associada a diversas lesões cutâneas (pápulas de Gottron e heliótropo são as mais específicas).
A principal intervenção terapêutica na dermatomiosite é a corticoterapia, com boa resposta inicial em grande parte dos pacientes. No entanto, alguns deles podem ser refratários a essa intervenção ou se manter dependentes de doses elevadas de corticoide, mesmo após adição de imunossupressores ao esquema de tratamento.
A imunoglobulina endovenosa (IVIG) vem sendo utilizada de maneira off label nesse contexto, com boas respostas em estudos observacionais ou pequenos estudos controlados. Nesse sentido, com o objetivo de fornecer dados mais robustos a respeito dessa aplicação da IVIG, Aggarwal et al. desenvolveram um estudo com boa qualidade metodológica com o objetivo de avaliar a eficácia e a segurança da IVIG na DM refratária em pacientes adultos.
Métodos
Trata-se de um ensaio clínico randomizado, multicêntrico, de fase 3, prospectivo, duplo cego, controlado por placebo, com grupos paralelos. Esse estudo foi patrocinado pela indústria farmacêutica que forneceu a IVIG.
Os pacientes incluídos foram aqueles com 18 a 80 anos, diagnóstico de dermatomiosite pelos critérios de Bohan e Peter e refratários à corticoterapia e imunossupressores. A refratariedade foi definida como uso de até dois imunossupressores por, no mínimo, três meses. As doses deveriam estar estáveis há, pelo menos, quatro semanas. Pacientes em uso de prednisona >20 mg/dia, ciclofosfamida, biológicos e corticoide tópico foram excluídos.
Os pacientes foram randomizados para receber IVIG 2g/kg a cada quatro semanas ou placebo, durante 16 semanas, na proporção de 1:1. Após esse período, os pacientes foram seguidos por até 40 semanas, na fase de extensão aberta do estudo.
O desfecho primário de eficácia analisado foi o escore de melhora total (Total Improvement Score – TIS) de pelo menos 20 (TIS ≥20 foi chamado de melhora pelo menos mínima) na semana 16. Esses escore é composto por uma série de variáveis utilizadas para avaliar atividade muscular e cutânea na dermatomiosite. Diversos desfechos secundários, incluindo eventos adversos, foram analisados.
Resultados
Dos 95 pacientes incluídos, 47 receberam IVIG e 48 receberam placebo. A maioria dos pacientes era do sexo feminino e branca, com idade média de 52 anos.
Na semana 16, 79% dos pacientes que receberam IVIG atingiram TIS ≥20 (pelo menos uma melhora mínima) vs. 44% dos pacientes no grupo placebo. Isso levou a uma diferença de 35% entre grupos (IC95% 17-53%, p<0,001). Nesse momento, o TIS médio no grupo IVIG foi superior ao do grupo placebo. Diversos desfechos secundários, incluindo as melhoras moderadas e maiores também foram superiores no grupo IVIG. Os níveis de CK, no entanto, não diferiram entre os grupos.
Um dado interessante é que, após a semana 16, os pacientes do grupo placebo sofreram crossover para a IVIG e apresentaram melhoras equiparáveis aos pacientes que receberam a IVIG desde o início, demonstrando que a medicação foi, de fato, eficaz.
Ao longo das 40 semanas de seguimento, 282 eventos adversos relacionados ao tratamento foram identificados no grupo IVIG, a maioria leve. No entanto, foram identificados 9 eventos adversos graves, sendo 6 deles eventos tromboembólicos.
Comentários
Esse estudo é o maior e com melhor qualidade metodológica a avaliar o uso da IVIG nos pacientes com DM refratária ao uso de corticoides e imunossupressores.
Por se tratar de uma doença muito rara, torna-se difícil a reprodução desse estudo em outros cenários. No entanto, as observações encontradas nesse estudo estão em concordância com a percepção de uso clínico da medicação.
É válido destacar que o uso da IVIG aumentou o risco de eventos tromboembólicos. Sendo assim, a prescrição criteriosa deve ser feita, e o médico prescritor deve estar sempre vigilante para esses efeitos colaterais do tratamento.
Como conclusão, os autores evidenciaram que a IVIG é uma medicação eficaz no tratamento da dermatomiosite refratária, porém com risco de eventos adversos, em especial os tromboembólicos.
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