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Neurologia10 outubro 2024

Você conhece a síndrome neuroléptica maligna? 

A síndrome neuroléptica maligna é caracterizada por febre, rigidez muscular e disautonomia, ocorre com a exposição a agentes bloqueadores da dopamina.
Por Danielle Calil

Na metade da década de 1950, houve um grande marco na assistência psiquiátrica com a introdução de antipsicóticos. Essa classe de drogas, com propriedades bloqueadoras de dopamina, é utilizada como terapia para esquizofrenia, além de também serem envolvidas em terapias de outras condições clínicas como delirium, síndrome de Tourrette e disfunção neurogastrointestinal. Ainda nessa época de desenvolvimento desses agentes neurolépticos, o psiquiatra Jean Delay descreveu sobre o risco associado de alterações vegetativas do sistema nervoso central com o uso de haloperidol, mais tardiamente caracterizado como a síndrome neuroléptica maligna. Essa síndrome é composta por manifestações clínicas como febre, rigidez muscular e disautonomia, manifestadas pela exposição de agentes bloqueadores de dopamina, especialmente antipsicóticos.  

Atualmente, a classe de antipsicóticos são amplamente prescritas, seja em contexto ambulatorial ou hospitalar, por médicos de diversas especialidades, além da psiquiatria. Sendo assim, a classe médica se familiarizar com a síndrome neuroléptica maligna, uma potencial complicação de drogas bloqueadoras de dopamina, é imprescindível para uma melhor assistência. Este ano, a New England Journal of Medicine, publica revisão sobre o tema. 

Você conhece a síndrome neuroléptica maligna? 

Epidemiologia 

A síndrome neuroléptica maligna é condição rara, estimada em 0,02 a 3% dos pacientes expostos à droga bloqueadoras de dopamina. Os principais fatores de risco para essa complicação são: desidratação, uso de múltiplos agentes antipsicóticos, dose de drogas elevadas, história prévia de síndrome neuroléptica maligna e aplicação de droga bloqueadora dopaminérgica por via intramuscular. 

Agentes antipsicóticos típicos, como haloperidol e pimozida, possuem quadros mais frequentes e mais graves na síndrome neuroléptica maligna ao comparar com agentes antipsicóticos atípicos. 

Alguns polimorfismos genéticos relacionados com enzimas metabolizadoras de drogas e transportadores de drogas podem proporcionar um aumento no risco da síndrome neuroléptica maligna, embora esses achados tenham sido realizados em amostras pequenas e predominantemente japonesas. 

Manifestações Clínicas e Diagnóstico 

De acordo com o DSM-5, os critérios diagnósticos para síndrome neuroléptica maligna incluem exposição à droga bloqueadora de dopamina, rigidez muscular, febre além da presença de pelo menos 2 achados como: diaforese, disfagia, tremor, incontinência, alteração do nível de consciência, mutismo, taquicardia, labilidade de pressão arterial, leucocitose e elevação da creatina quinase.  

O quadro típico cursa com disautonomia (particularmente no que tange à taquicardia e labilidade pressórica), temperatura axilar acima de 40 ºC e aumento do tônus muscular. A rigidez muscular intensa pode resultar em rabdomiólise, com aumento do nível de creatina quinase. 

O intervalo médio entre a exposição da droga com o surgimento dos sintomas possui duração em torno de 4 dias e a duração média da doença em torno de 9 dias embora haja variabilidade na literatura da duração da síndrome entre 1 e 30 dias. 

Leia também: Diagnóstico e tratamento da hiperprolactinemia [podcast]

Diagnósticos diferenciais 

Há outras condições clínicas que cursam com hipertermia e rigidez muscular, de modo que possam apresentar fenótipo de difícil distinção com síndrome neuroléptica maligna. Um dado que auxilia muito nessa distinção será o contexto clínico no qual o paciente está inserido. 

A hipertermia maligna é um desses diagnósticos diferenciais. Cursa também com hipertermia e rigidez muscular, embora ocorra em contexto de agentes anestésicos. 

A síndrome serotoninérgica é outro diagnóstico diferencial. Nessa condição, relacionada à prescrição de dose alta ou múltiplas drogas de agentes serotoninérgicos, há percurso clínico de disautonomia. Outras manifestações clínicas, encontradas na síndrome serotoninérgica e não na neuroléptica maligna, são: hiperreflexia, clônus, mioclonias e calafrios. 

Catatonia extrema pode também mimetizar a síndrome neuroléptica maligna, principalmente em ambientes de emergência nas quais não há histórico médico pessoal disponível e pode cursar com aumento do nível de creatina quinase. 

Tratamento 

A suspensão da droga bloqueadora dopaminérgica presumidamente responsável pela síndrome neuroléptica maligna é sempre importante quando for possível para o manejo dessa condição. 

Em geral, o tratamento é de suporte e empírico. O cuidado intensivo clínico é recomendado aos sintomas cardinais da síndrome neuroléptica maligna (febre, rigidez muscular e disautonomia) assim como a possibilidade de suplementação com drogas que aumentem atividade dopaminérgica e alguns casos com eletroconvulsoterapia (ECT).  

Quanto aos cuidados intensivos, alguns pacientes podem apresentar síndrome respiratória aguda através da rigidez de músculos das vias aéreas superiores e do diafragma, podendo ser necessário suporte ventilatório invasivo. Profilaxia de úlcera de estresse com inibidor de bomba de próton e profilaxia para trombose venosa profunda também são recomendados. 

A maioria dos casos com taquicardia e flutuação de pressão arterial pode ocorrer sem grandes repercussões em população jovem; contudo, para população idosa, deve-se atentar a potencial isquemia cardíaca principalmente naqueles com história de doença coronariana. Em casos graves de taquicardia e de instabilidade pressórica, é recomendado tratamento com clonidina (agonista alfa-1-adrenoreceptor) ou com clevidipino/nimodipino (ambos bloqueadores de canal de cálcio).  

Em pacientes com febre, a prescrição de analgésicos e dispositivos de refrigeração podem ser necessários para manter a eutermia.  

Considerando o potencial para rabdomiólise, a prescrição de fluidos intravenosos é importante com a finalidade de eutermia e de débito urinário em torno de 200-300 mL/dia. Diálise pode ser considerada em casos refratários. Além disso, a reposição de eletrólitos pode ser necessária, visto que casos graves da síndrome neuroléptica maligna cursam com hipocalcemia, hipomagnesemia, hipo ou hipernatremia, hipercalemia e acidose metabólica. 

A rigidez muscular pode ser tratada através de agentes miorrelaxantes ou de agonistas dopaminérgicos. Em casos leves, esse sintoma pode ser tratado com lorazepam. Por outro lado, para casos mais graves ou refratários, o dantrolene pode ser administrado com a ressalva da necessidade de monitoramento de função hepática caso optado pelo uso. Bromocriptina ou amantadina também são alternativas através da ação como agonistas dopaminérgicos. 

Em casos refratários, na qual há contexto ameaçador para a vida, eletroconvulsoterapia (ECT) é recurso terapêutico possível, com relatos de efetividade para controle dos sintomas. O mecanismo terapêutico subjacente à ECT, contudo, não é esclarecido.

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Referências bibliográficas

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