O transtorno afetivo bipolar (TAB) afeta 40 milhões de pessoas no mundo (prevalência global de aproximadamente 2%), caracterizando-se pela alternância de episódios de depressão e mania / hipomania. O quadro normalmente começa na adolescência ou início da idade adulta. O tempo entre o primeiro episódio depressivo e o diagnóstico é de aproximadamente 9 anos.
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Apresentação Clínica e Diagnóstico
Conforme o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5-TR), o diagnóstico de TAB demanda a ocorrência de ao menos um episódio de mania ou hipomania. Mania se caracteriza por um episódio de humor elevado, expansivo ou irritado, associado a grandiosidade, impulsividade, comportamentos de risco, inquietação, aceleração de pensamentos, redução da necessidade de sono, aumento de produtividade, autoestima elevada, comprometimento do julgamento, irritabilidade e agitação que dura no mínimo uma semana e com frequência demanda internação. Hipomania, que associada a ocorrência de episódio depressivo caracteriza o TAB II, pode ser entendido como uma forma branda de mania, que deve durar no mínimo 4 dias consecutivos.
A despeito da mania e hipomania serem as características distintivas do transtorno, normalmente os pacientes buscam ajuda durante um episódio depressivo. Dessa forma, os clínicos devem perguntar sobre episódios prévios de aumento de energia e humor elevado ou irritado em todos os pacientes com depressão. Algumas características clínicas são sugestivas de depressão bipolar, como início e desaparecimento abrupto dos sintomas, episódios mistos, sintomas atípicos como aumento do apetite e hipersonia, sintomas psicóticos e catatonia.
A presença de comorbidades psiquiátricas no TAB é extremamente frequente, sendo as mais comuns os transtornos de ansiedade, transtorno por uso de substância, transtorno de personalidade e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade.
Episódios mistos, onde coocorrem sintomas depressivos e maníacos / hipomaníacos apresentam maior risco de suicídio. O risco de suicídio é significativamente aumentado nos pacientes com TAB, aproximadamente 30-60 vezes maior que a população geral. Aproximadamente 34% dos indivíduos com transtorno bipolar tentam o suicídio e 15% a 20% das pessoas com transtorno bipolar morrem por suicídio. Alguns fatores demográficos são associados às mortes por suicídio: sexo masculino, viver sozinho, ser divorciado, desempregado ou branco, idade < 35 anos e > 75 anos. Pacientes com TAB também morrem mais por doenças cardiovasculares.
Tratamento Farmacológico
Os objetivos do tratamento farmacológico são reduzir a intensidade dos sintomas do episódio de humor em curso e limitar o número e gravidade de episódios futuros. O tratamento do transtorno bipolar tipo I e II é similar, mas poucos estudos focam no tratamento do transtorno bipolar tipo II.
Tratamento de episódios agudos de mania / hipomania
- Interromper medicações que possam estar exacerbando ou prolongando os sintomas (antidepressivos e estimulantes).
- Estabilizadores de humor (lítio e valproato) e antipsicóticos atípicos (quetiapina, asenapina, aripiprazol, paliperidona, risperidona e cariprazina) são as opões de primeira linha. Eventualmente associação entre essas medicações é necessária.
- Frequentemente internação, algumas vezes involuntária, é necessária para tratamento da mania.
Tratamento de episódios agudos de depressão bipolar
- Guidelines sugerem o uso de quetiapina, lurasidona + lítio/divalproato, lítio, lamotrigina, lurasidona como primeira linha para tratamento de depressão bipolar I. Divalproato em monoterapia, cariprazina, fluoxetina+olanzapina e ISRS/bupropiona como adjuvantes são considerados segunda linha.
- Lítio e lamotrigina são considerados segunda linha para depressão bipolar II.
- Lamotrigina é bem tolerada, leva a mínimas alterações no peso e tem boa resposta em monoterapia.
- Antidepressivos são considerados adjuvantes, não devem ser usados em monoterapia e devem ser evitados em pacientes com mudanças frequentes entre mania/hipomania e depressão. Antidepressivos também são contraindicados em episódios mistos. A eficácia dos antidepressivos em TAB é limitada.
- Antipsicóticos atípicos apesar de comprovada eficácia frequentemente levam a ganho de peso.
- Eletroconvulsoterapia (ECT) é reservado para pacientes refratários. Outras indicações para ECT incluem necessidade de resposta rápida, pacientes com quadros graves, grávidas e idosos com baixa tolerabilidade a medicação.
Tratamento de manutenção
- A maior parte dos pacientes precisarão de tratamento de forma continuada.
- Lítio, valproato, lamotrigina, quetiapina, aripiprazol, asenapina e lurasidona são considerados primeira linha. Para TAB II, quetiapina, lítio e lamotrigina são primeira linha.
- Uso de antidepressivos na manutenção não é recomendado.
- Tratamentos que foram efetivos na fase aguda geralmente são continuados.
- Lítio permanece primeira linha de tratamento na maior parte dos guidelines. Seu uso, no entanto, diminuiu nas últimas décadas, graças a sua tolerabilidade e ocorrência de efeitos adversos, incluindo alterações renais (redução da taxa de filtração glomerular) e tireoidianas. Lítio também aumenta os níveis de paratormônio e o cálcio sérico, bem como a taxa de hiperparatireoidismo primário.
- A perda de função tireoidiana e renal causada pelo lítio é permanente.
- Lítio é associado com menores taxas de suicídio que as demais medicações.
- Carmabazepina é segunda linha de tratamento.
- Carbamazepina e valproato devem ser evitados em mulheres em idade reprodutiva pelo risco de malformações congênitas.
- Esquemas terapêuticos complexos favorecem a má adesão.
Outras intervenções
- Fornecer psicoeducação: importância da adesão a medicação, como reconhecer sinais precoces dos episódios de humor, como desenvolver estratégias para lidar com os sintomas e potenciais efeitos adversos das medicações.
- Sempre associar ao tratamento medicamentoso psicoterapia e intervenções psicossociais.
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Curso e prognóstico
- Maior número de episódios está associado a maior comprometimento cognitivo, bem como maior comprometimento de saúde física e mental.
- Estudos prospectivos relataram que pacientes com ambos os tipos de transtorno bipolar apresentam sintomas em aproximadamente metade de todos os dias.
- Pacientes com TAB II apresentam sintomas mais frequentemente que pacientes com TAB I, com predominância de sintomas depressivos.
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