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Psiquiatria27 março 2025

Ansiedade no TEA: identificação e diferenciação de sintomas ansiosos em autistas

Os transtornos de ansiedade estão entre as comorbidades mais prevalentes e incapacitantes associadas ao transtorno do espectro autista (TEA).
Por Tayne Miranda

Os transtornos de ansiedade estão entre as comorbidades mais prevalentes e incapacitantes associadas ao transtorno do espectro autista (TEA). Aproximadamente 40% das crianças em idade escolar sofrem de um transtorno de ansiedade, o que é quase o dobro da prevalência de ansiedade em crianças sem TEA, com uma tendência de piora no curso do tempo. Em alguns estudos as apresentações tradicionais de ansiedade estiveram associadas a maiores habilidades de linguagem, bem como a preditores conhecidos de ansiedade em jovens sem TEA, como um estilo cognitivo mais ansioso e hipersensibilidade sensorial.

Saiba mais: AAP 2024: Manejo da ansiedade em crianças com TEA 

símbolo do autismo

Clínica associada

Entre as pessoas com TEA o nível de estresse e ansiedade associados a características clínicas do transtorno podem variar intensamente. Para alguns, as dificuldades relacionadas à mudança de rotina podem ser debilitantes e fonte de medo e preocupação, enquanto para outros as interações sociais malsucedidas podem desencadear estresse, preocupação e solidão.

Uma questão importante na prática clínica é a diferenciação se os sintomas ansiosos apresentados são secundários a uma reação proporcional às dificuldades inerentes ao TEA ou são frutos de uma comorbidade psiquiátrica que merece uma intervenção específica. Outra questão relevante diz respeito às diferenças na apresentação dos sintomas ansiosos na população com TEA.

Medos ligados a estímulos sensoriais, como sons altos e sintomas fóbicos diante de situações e objetos inusitados são muito descritos na literatura para pacientes com TEA. Estudos também descrevem a presença de esquiva social incapacitante, bem como sofrimento social e nervosismo em jovens com TEA, que apresentam pouca percepção ou preocupação com a rejeição social, o que não representaria o critério diagnóstico de transtorno de ansiedade social.

Na literatura há uma sugestão que sintomas ansiosos típicos, que estão de acordo com as descrições diagnósticas do Manual Estatístico e Diagnóstico de Transtornos Mentais – DSM estão associados com as habilidades verbais e coeficiente intelectual (QI), enquanto sintomas atípicos ligados às principais características do TEA, como evitação social, ansiedade em torno de mudanças na rotina, compulsividade e fobias simples não exigem as habilidades cognitivas e de linguagem associadas a outros transtornos de ansiedade. Desse modo, os sintomas atípicos não seriam relacionados às habilidades intelectuais e de linguagem e estão ligados a convergência dos sintomas de TEA e ansiedade.

Estudo relevante

Connor Morrow Kerns e colaboradores conduziram um estudo para avaliar os sintomas atípicos nos pacientes com TEA e sua correlação com QI e linguagem. 31% da amostra apresentou ansiedade tradicional e atípica, 15% ansiedade atípica, 17% ansiedade tradicional e 37% nenhum sintoma ansioso. Nessa amostra, não houve uma associação entre habilidade intelectual e ansiedade, o que sugere que a relação entre QI e ansiedade deve-se a uma maior habilidade de comunicação das suas sensações e percepções em jovens com alto funcionamento.

Os pensamentos automáticos negativos foram associados à ansiedade em jovens com TEA e a hiperssensibilidade foi associada com aumento de ansiedade em jovens com e sem TEA. Os resultados são consistentes com as hipóteses de que o aumento da excitação fisiológica predispõe os jovens com TEA a problemas de ansiedade e que os sintomas tradicionais de ansiedade podem ser mais difíceis de reconhecer ou menos prevalente em jovens com comprometimento de linguagem mais graves.

Os sintomas ansiosos não estiveram ligados a maior gravidade do TEA e os resultados não endossam a noção que sintomas atípicos refletem transtornos ansiosos tradicionais em pacientes com pior funcionamento.

Sintomas atípicos podem refletir uma forma mais difusa de ansiedade e foram independentemente associados com maior sintomatologia do TEA, sintomas tradicionais de ansiedade e mais pensamentos ansiosos automáticos. Os resultados endossam o entendimento que sintomas atípicos de ansiedade são qualitativamente distintos dos sintomas típicos e potencialmente ligados a dificuldades comuns, mas não exclusivas, de pacientes com TEA.

Considerações

Essas descobertas são consistentes com a sobreposição e associação de ansiedade e comportamentos repetitivos e restritos no TEA e apoiam hipóteses de que ansiedade significativa pode surgir em torno de interesses restritos e que comportamentos restritos e repetitivos representam uma resposta de enfrentamento mal-adaptativa.

Uma questão adicional que precisa ser melhor estudada diz respeito a se tais sintomas atípicos estão restritos às pessoas com TEA ou aparecem em vários diagnósticos ligados a características cognitivas, de regulação emocional e habilidades sociais, bem como esses sintomas respondem aos tratamentos farmacológicos e cognitivo-comportamentais existentes.

Leia também: Transtorno do espectro autista (TEA): a suspeita através das primeiras manifestações

Como os sintomas atípicos se expressam

 

Ansiedade Atípica 

Exemplos 

Ansiedade em torno da rotina, novidades e interesses restritos, sem que haja uma preocupação generalizada Preocupação antecipatória ou medo ligado a pequenas mudanças da rotina ou na programação diária, preocupação excessiva em perder o acesso a interesses especiais ou em infringir regras 

 

Medos específicos incomuns, na ausência de uma sensibilidade generalizada a barulhos ou estímulos sensoriais Medo de bebês chorando, tosse, jingles, teias de aranha, canção de feliz aniversário, supermercados, bolhas, balões, espinhos, fogo 

 

Medo social, em jovens que não têm consciência do julgamento social Sintomas somáticos em ambientes sociais, esforços desesperados para escapar e evitar ambientes onde outras pessoas estão presentes, aumento de comportamento autolesivo e agressivo em ambientes sociais 
Comportamento compulsivo/ritualístico, na ausência de um desejo claro de evitar sofrimento ou um resultado temido Rituais em refeição, rituais verbais, insistência no uso de frases específicas, insistência em que os computadores sejam desligados, portas fechadas, mangas arregaçadas, sapatos mantidos no carro 

 

Adaptado de Kerns CM, Kendall PC, Berry L, Souders MC, Franklin ME, Schultz RT, Miller J, Herrington J. Traditional and atypical presentations of anxiety in youth with autism spectrum disorder. J Autism Dev Disord. 2014 Nov;44(11):2851-61. doi: 10.1007/s10803-014-2141-7. 

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Referências bibliográficas

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