No período da tarde, durante o primeiro dia do Congress on Brain, Behavior and Emotions – BRAIN 2025, Ary Gadelha, Professor e Vice-Chefe do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/UNIFESP), fez uma instigante palestra sobre novidades na pesquisa em esquizofrenia. A palestra começou com uma provocação: o professor nos apresentou algumas imagens, questionando as cores que enxergávamos. Diante da divisão da plateia entre duas cores, ele sentenciou: tratava-se da mesma cor. Na sequência mostrou-nos uma imagem abstrata para em seguida revelar o desenho de uma cobra em meio a primeira figura. Retornando à imagem abstrata, mostrou-nos como uma vez vendo a cobra, seria impossível não a ver.
As provocações serviram de mote para a explicação sobre como nosso cérebro trabalha a partir de predições, uma vez que guardar todas as informações não seria eficiente do ponto de vista neural. Assim, a partir do input sensorial no córtex visual primário nosso cérebro tenta fazer predições a partir das informações que conhecemos. Caso alguma discordância ou erro seja identificada, as funções corticais superiores são ativadas para solução do problema.
Percepção da realidade
Do ponto de vista da experiência do real, no entanto, as provocações iniciais continuaram no sentido de questionar a separação tradicional entre sensação e percepção, salientando que vivemos em um mundo percebido e que a percepção varia de acordo com inúmeras questões (no caso das cores do início, a iluminação, por exemplo). Desse modo, como seria possível separar o que é real ou não?
Para tal, ele trouxe a teoria das emoções construídas, proposta por Lisa Feldman Barrett, que não são reações universais e automáticas, mas sim construções do cérebro baseadas em experiências passadas, contexto cultural e interpretações corporais. Assim, o cérebro não reconhece emoções prontas, mas prediz com base na combinação de intercepção, contexto, exterocepção, percepção e representação. Logo, as emoções não são dadas ou inatas, mas são construídas a partir do contexto social.
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Desse modo, a formação da consciência e cognição se dá junto com o mundo externo, interocepção e as possibilidades de interferências construídas a partir da minha história de vida. A tomada de decisão é profundamente ligada às emoções, sendo que lesões no córtex pré-frontal ventromedial (VMPFC) comprometem essa resposta emocional, e a ausência de sinais fisiológicos — como alterações nas condutâncias da pele — pode refletir a perda da capacidade de distinguir o que é real ou não.
Os sistemas da imaginação (pensar em contextos que não estão presentes e em teorias) e da percepção usam as mesmas áreas cerebrais. Para saber que uma simulação não é real, o giro fusiforme avalia a quantidade de estímulos sensoperceptivos (quanto mais estímulos, maior a percepção de realidade).
Na esquizofrenia ocorreria uma alteração da conectividade cerebral (não o mesmo tipo de alteração em todos os pacientes), mas regiões conhecidas como hub seriam mais afetadas, resultando em dificuldade de processamento emocional e cognitivo.
Por fim, o professor trouxe alguns resultados preliminares de pesquisas conduzidas no Laboratório de Neurociências Integrativas – LINC, da UNIFESP. Linhas de pesquisa avaliando a associação entre variabilidade da frequência cardíaca, resposta emocional e resposta ao tratamento da esquizofrenia estão em curso. Outra pesquisa, utilizando rastreamento ocular (olhar é perceber e tomar decisão, ou seja, uma forma de investigar processos cognitivo) como ferramenta de investigação cognitiva, tem mostrado que pacientes com esquizofrenia possuem menor rastreamento visual, culminando em uma menor capacidade de atualizar as predições a luz de novas informações, interferindo nos processos cognitivos.
Mensagem Final
A realidade não é tão óbvia e simples. A vivência de realidade é construída individualmente a partir do sistema neurobiológico, experiências pessoais e ambiente. Compreender essas vivências pode nos ajudar a entender melhor o funcionamento do cérebro e novas possibilidades de intervenção para doenças psiquiátricas, como esquizofrenia.
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