O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é uma condição complexa do desenvolvimento caracterizada por desafios na comunicação, interação social e comportamento. Além dessas dificuldades principais, muitas crianças com TEA enfrentam uma variedade de comorbidades, entre as quais os sintomas gastrointestinais (GI) são particularmente comuns. Esses sintomas podem impactar significativamente a qualidade de vida e a saúde geral das crianças com TEA.
Durante o Congresso Mundial de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (WCPGHAN 2024) que aconteceu em Buenos Aires na Argentina, esse foi um tópico abordado, explorando os sintomas gastrointestinais mais prevalentes nessas crianças e os desafios enfrentados no diagnóstico dessas condições.
Sintomas gastrointestinais comuns em crianças com TEA:
- Constipação: Isso é frequentemente observado e pode ser devido a uma combinação de hábitos alimentares e atividade física limitada, além do comportamento retentivo. Mas na sua grande maioria, é uma constipação funcional.
- Diarreia: Algumas crianças experimentam diarreia crônica, possivelmente ligada a sensibilidades alimentares ou desequilíbrios na flora intestinal. O consumo excessivo de carboidrato na dieta também pode ser um fator desencadeador da diarreia.
- Dor Abdominal: A dor abdominal não específica é comum e pode ser particularmente difícil de manejar, devido às dificuldades que algumas crianças têm em verbalizar o desconforto.
- Refluxo Gastroesofágico: Isso pode levar a desconforto ou dor crônica, afetando os padrões de alimentação e sono. É um diagnóstico muito difícil de realizar nesses pacientes, quando não há uma manifestação clínica clássica.
Causas Potenciais e fatores contribuintes:
- Preferências alimentares: Crianças com TEA podem ter dietas restritas e/ou seletivas, frequentemente pobres em fibras, o que pode contribuir para sintomas como constipação.
- Eixo Intestino-Cérebro: Estudos emergentes sugerem uma conexão entre a saúde digestiva e condições neurológicas. Desequilíbrios na microbiota intestinal podem desempenhar um papel no TEA.
- Problemas de processamento sensorial: Sensibilidades a texturas e sabores podem levar a comportamentos alimentares atípicos, afetando a saúde GI
Desafios no Diagnóstico:
O diagnóstico de problemas GI em crianças com TEA apresenta desafios únicos:
- Barreiras de comunicação: Dificuldade em expressar desconforto pode dificultar um diagnóstico preciso.
- Sobreposição de sintomas: Problemas GI comuns na infância podem complicar a identificação de problemas GI específicos do TEA.
- Estudos limitados nessa população: Mais pesquisas são necessárias para entender os mecanismos específicos que ligam o TEA e problemas GI.
Impacto no comportamento e desenvolvimento:
- O desconforto GI pode exacerbar problemas comportamentais, como irritabilidade ou agressão, complicando ainda mais o manejo do TEA.
- Pode também afetar o sono, levando à fadiga e impactando o aprendizado e a funcionalidade diária.
- O manejo eficaz dos sintomas GI pode levar a melhorias no comportamento e na qualidade de vida das crianças com TEA.
Conclusão e mensagem prática
Abordar os sintomas GI em crianças com TEA é fundamental para promover o bem-estar geral e o desenvolvimento adequado desses pacientes. Embora os desafios no diagnóstico e manejo persista, o aumento da conscientização e da pesquisa nessa área pode levar a melhores estratégias para aliviar esses sintomas. Por ora, os tratamentos são os mesmos direcionados para as crianças neurotípicas, sem uma abordagem medicamentosa diferente. Uma abordagem multidisciplinar envolvendo pediatras, gastroenterologistas, nutricionistas e especialistas em TEA é crucial para o cuidado personalizado. Melhorar nossa compreensão e manejo desses problemas GI oferece a promessa de melhorar as experiências de vida das crianças com TEA e suas famílias.
Confira a cobertura completa do WCPGHAN 2024.
Autoria

Jôbert Neves
Médico do Departamento de Pediatria e Puericultura da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP), Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela ISCMSP, Título de Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Coordenador Young LASPGHAN do grupo de trabalho de probióticos e microbiota da Sociedade Latino-Americana de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (LASPGHAN).
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