O vírus sincicial respiratório (VSR) é uma das principais causas de doenças respiratórias graves em lactentes, no momento, sem tratamento medicamentoso eficaz disponível. A única terapia que foi aprovada pela Food and Drug Administration para o tratamento da infecção por VSR é a ribavirina aerossol, mas a sua eficácia é limitada, além de ter um perfil de segurança desfavorável e potenciais efeitos teratogênicos relacionados. Já o palivizumabe, um anticorpo monoclonal contra VSR, recebeu aprovação restrita para a prevenção da infecção por VSR em bebês de alto risco. Neste contexto, as discussões sobre potenciais terapias para manejo medicamentoso das infecções causadas pelo VSR, sempre ganham espaço.
O ziresovir (AK0529) é um inibidor potente e seletivo da proteína F do VSR, administrado por via oral. Estudos pré-clínicos indicaram que este medicamento é um bom candidato para uma fase clínica eficaz. Um ensaio fase 2 com 72 participantes de 1 a 24 meses de vida mostrou que o tratamento com ziresovir reduziu a carga viral do VSR e os sinais e sintomas em comparação ao placebo, sem preocupações de segurança.
Para ampliar as evidências atuais, um ensaio clínico multicêntrico de fase 3 na China foi realizado para avaliar a eficácia e a segurança da terapia com ziresovir em crianças de 1 a 24 meses (com ajuste para prematuridade) hospitalizadas por infecção por VSR confirmado por métodos virológicos dentro de 36 horas antes do recebimento da primeira dose da medicação ou placebo e com peso corporal de 2,5 a 20,0 kg. Além disso, os participantes também precisavam ter um escore clínico de bronquiolite de Wang de pelo menos 5 (em uma escala de 0 a 12, com escores mais altos indicando maior gravidade dos sinais e sintomas) no momento da primeira administração de ziresovir ou placebo e ter recebido a primeira dose dentro de 7 dias após o início dos sintomas da infecção por VSR. Já os principais critérios de exclusão foram a positividade para o vírus da imunodeficiência humana, infecção concomitante pelo vírus influenza ou pneumonia bacteriana, e doenças conhecidas ou suspeitas de imunodeficiência primária.
A dose de ziresovir ou placebo foi estabelecida de acordo com o peso corporal do paciente: 10 mg para os que pesavam de 2,5 a 5,0 kg, 20 mg para os que pesavam mais de 5,0 kg até 10,0 kg, e 40 mg para os que pesavam mais de 10,0 kg até 20,0 kg. O ziresovir ou placebo foi administrado a cada 12 horas, durante 5 dias, seguidos de um período de acompanhamento de segurança de 9 dias.
Dentre os resultados encontrados, destacam-se os seguintes:
Participantes
- População de intenção de tratar: 244 participantes
- População de segurança: 302 participantes
Resultados da pontuação clínica
- Redução na pontuação clínica de bronquiolite de Wang no dia 3:
- Ziresovir: redução de −3,4 pontos (IC 95%: −3,7 a −3,1)
- Placebo: redução de −2,7 pontos (IC 95%: −3,1 a −2,2)
- Diferença: −0,8 pontos (IC 95%: −1,3 a −0,3)
- P-valor: 0,002 (significativo)
Carga viral de VSR
- Redução na carga viral de VSR no dia 5:
- Ziresovir: −2,5 log10 cópias por mL
- Placebo: −1,9 log10 cópias por mL
- Diferença: −0,6 log10 (IC 95%: −1,1 a −0,2)
Eventos adversos
- Incidência de eventos adversos:
- Ziresovir: 16%
- Placebo: 13%
- Eventos adversos mais comuns:
- Diarreia: 4% (ziresovir) vs. 2% (placebo)
- Elevação nos níveis de enzimas hepáticas: 3% (ambos os grupos)
- Erupção cutânea: 2% (ziresovir) vs. 1% (placebo)
Mutações resistentes
- Mutações associadas à resistência identificadas em 15 participantes (9%) no grupo do ziresovir.
Discussão e conclusão
Os resultados deste ensaio clínico evidenciam que o ziresovir demonstrou uma melhora clínica significativamente maior e uma diminuição acentuada na carga viral em comparação com o placebo, com reduções significativas no escore clínico de bronquiolite de Wang em 48 horas. Os efeitos antivirais observados, com diminuições notáveis na carga viral em apenas 3 dias, corroboram o mecanismo de ação do ziresovir como um inibidor da proteína F. Apesar da incidência de eventos adversos ter sido similar entre os grupos ziresovir e placebo, a presença de algumas reações adversas e a emergência de mutações de resistência em participantes tratados necessitam de atenção.
Vale ressaltar que a dependência do escore clínico de bronquiolite de Wang, que ainda não foi totalmente validado para o VSR, e a limitação geográfica do ensaio, realizado exclusivamente na China, podem restringir a generalização destes achados. Entretanto, os dados indicam que o ziresovir possui um potencial significativo no tratamento de infecções por VSR em lactentes, o que justifica investigações adicionais em ensaios internacionais para confirmar esses resultados em populações mais amplas.
Autoria

Jôbert Neves
Médico do Departamento de Pediatria e Puericultura da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP), Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela ISCMSP, Título de Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Coordenador Young LASPGHAN do grupo de trabalho de probióticos e microbiota da Sociedade Latino-Americana de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (LASPGHAN).
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