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Pediatria24 novembro 2025

PERINATO 2025 - UTI Neurológica Neonatal

A palestra abordou conceitos de Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) Neurológica. Confira!

No 27° Congresso Brasileiro de Perinatologia (PERINATO 2025), realizado entre os dias 19 e 22 de outubro, no Rio de Janeiro, o Dr. Gabriel Fernando Todeschi Variane (SP) mostrou o conceito de Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) Neurológica. Segundo o palestrante, recém-nascidos (RN) críticos apresentam elevado risco de óbito e, quando sobrevivem, há um risco alto de paralisia cerebral, cegueira ou surdez, deficiência cognitiva e transtornos de comportamento. Além disso, ele destacou que o “impacto deste modelo de assistência não é apenas de prevenir lesões cerebrais, mas também de criar uma cultura de excelência que posiciona as famílias no absoluto centro dos cuidados”. 

Desafios que levaram à criação do conceito de cuidados neurocríticos neonatais (CNN) 

  • Mais de 25% dos bebês em UTIN apresentam risco neurológico significativo; 
  • Cerca de 30% dos RN com encefalopatia hipóxico-isquêmica (EHI) moderada ou grave ainda evoluem para morte ou deficiência, mesmo na era da hipotermia terapêutica (HT); 
  • A incidência global de hemorragia peri-intraventricular (HPIV) grave em RN prematuros extremos ainda permanece elevada; 
  • A maioria das crises epilépticas neonatais é subclínica, sendo detectável somente com neuromonitorização contínua; 
  • Infelizmente, muitos centros ainda não possuem protocolos integrados ou equipes treinadas em protocolos específicos com foco em fisiologia cerebral neonatal. 

Essas questões culminam em alta variabilidade assistencial, com consequentes diagnósticos tardios e, portanto, maior risco de lesão permanente, o que justifica a criação de UTIN neurológicas. 

Veja também: Neobrain Brasil 2019: panorama da hipotermia terapêutica no país

 O que é uma UTIN neurológica? 

Baseada em cuidados focados no cérebro, a UTIN neurológica consiste em um setor que integra equipe treinada com tecnologia especializada e protocolos bem estabelecidos em CNN e tem foco explícito em prevenção, detecção e manejo precoce de lesões cerebrais. Além disso, envolve cuidados desde a medicina fetal, sala de parto e UTIN, até o seguimento pós-alta. Para ilustrar, o Dr. Gabriel mostrou o artigo Neurocritical care for neonates (Glass et al., 2010), que descreveu a primeira UTIN neurológica na Universidade da Califórnia. Após essa data, outras publicações também começaram a divulgar esse conceito.  

Pilares de uma UTIN neurológica 

  1. Equipe interdisciplinar especializada: suporte integrado a pacientes e famílias, neonatologistas com foco neurocrítico, neurologistas neonatais, enfermeiros de terapia intensiva, medicina fetal, médicos do seguimento ambulatorial, neurorradiologistas, neurocirurgiões, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e equipe multiprofissional; 
  2. Equipamentos e tecnologia especializada para monitoramento cerebral: dispositivos de HT, ultrassonografia de crânio, tomografia computadorizada de crânio, ressonância magnética cerebral de crânio, EEG contínuo (cEEG), EEG amplitude-integrado (aEEG), EEG, NIRS (espectroscopia no infravermelho próximo) e monitorização multimodal (hemodinâmica, ventilatória e metabólica vinculada à função cerebral). O monitoramento cerebral deve ser realizado continuamente à beira do leito, juntamente com outros métodos de avaliação neurológica, e pode promover avaliação em tempo real da função e oxigenação cerebral; 
  3. Protocolos e fluxos: EHI, crises epilépticas neonatais, AVC neonatal, leucomalácia periventricular, cuidados perinatais, HT, indicações de monitoramento, neuroproteção em Prematuros (bundle de prevenção de HPIV e hidrocefalia pós-hemorrágica, método Canguru,  controle de dor e estresse), ventilação / infecção / nutrição, cuidados centrados na família;
  4. Seguimento ambulatorial: reabilitação precoce, desenvolvimento, neurologia, neurocirurgia, medicina física e reabilitação, oftalmologia, audiologia, fonoaudiologia, fisioterapia e terapia ocupacional (TO). 

Vídeo EEG / aEEG 

O vídeo EEG / aEEG consiste em um monitor de função cerebral em tempo real e demonstra mudanças na função cerebral ao longo do tempo: a evolução do padrão EEG tem associação prognóstica. O Dr. Gabriel destacou que o uso de vídeo EEG / aEEG é necessário para a detecção de convulsões, pois 80–90% das convulsões neonatais não têm correlação clínica. Além disso, fármacos anticonvulsivantes causam uncoupling, isto é, desconexão entre a atividade eletrográfica das crises epilépticas em um EEG e a ausência de sintomas clínicos correspondentes. Dessa forma, o monitoramento cerebral melhora a acurácia da detecção de crises epilépticas neonatais: o diagnóstico impreciso tem consequências importantes, pois os RN com crises subclínicas são subtratados sem monitoramento e os que possuem atividade suspeita sem componente eletrográfico podem ser expostos a medicamentos desnecessários e potencialmente lesivos. 

NIRS 

O NIRS permite a avaliação contínua, em tempo real, não invasiva da oxigenação de tecido regional (rSO₂) e seus sensores podem ser colocados para avaliar a oxigenação cerebral e somática (renal e mesentérica).  

Independentemente da oxigenação sistêmica (SpO₂), a oxigenação cerebral ou somática pode ser inadequada e os valores do NIRS têm correlação precoce com outros indicadores de má perfusão sistêmica (lactato elevado, perfusão periférica alterada, extremidades frias, baixo débito urinário). Ademais, indica a eficácia do tratamento ou a necessidade de intervenções adicionais, como alterações no ventilador, diuréticos, alteração na dose de prostaglandina (PGE), necessidade de transfusão de sangue e intervenção cirúrgica precoce, por exemplo.  

Como estruturar uma UTIN Neurológica? 

  1. Espaço/unidade física dedicada: modelo adequado para instituições acadêmicas excepcionalmente grandes e envolve um espaço físico dedicado para RN que necessitam de CNN;  
  1. Equipe dedicada de CNN que oferece manejo diário direto: modelo de gestão diária de cuidados intensivos por meio de uma equipe dedicada; 
  1. Consultoria: modelo mais frequente e envolve uma equipe de cuidados clínicos separada, que faz consultoria e dá suporte para equipe da UTIN. Consiste em um serviço integrado à UTIN, criando um sistema de encaminhamento one-stop que agiliza a comunicação e o cuidado entre as especialidades. 

Fases de implantação 

  1. Formação da equipe primária: neonatologia, neurologia, enfermagem, radiologia; 
  2. Mapeamento de recursos e estrutura necessária; 
  3. Foco primário: EHI e crises, protocolos de HT, monitoramento cerebral, treinamento de enfermagem e acompanhamento pós-alta; 
  4. Expansão de escopo: cardiopatias congênitas, malformações do sistema nervoso central, acidente vascular encefálico, infecções; 
  5. Expansão da equipe: neurocirurgia, medicina fetal, fisioterapia, TO, nutrição;  
  6. Colaboração com outros centros 

 Governança e Qualidade 

  • Metas e métricas clínicas para cada patologia; 
  • Auditorias de EEG; 
  • Revisão de casos críticos; 
  • Educação continuada. 

Impacto de programas de CNN 

A implantação de serviços de CNN pode transformar o cuidado e melhorar desfechos: 

  • Redução da mortalidade (EHI, prematuros extremos); 
  • Redução de lesão cerebral: menos HPIV, menos leucomalácia, menos lesões por EHI; 
  • Maior precisão diagnóstica e detecção de crises e redução do uso desnecessário de anticonvulsivantes; 
  • Menor variabilidade assistencial com protocolos padronizados; 
  • Diminuição do tempo de internação e melhor uso de recursos; 
  • Melhora dos desfechos no neurodesenvolvimento em longo prazo; 
  • Maior engajamento interdisciplinar e integração com famílias.  

Confira os destaques do PERINATO 2025!

Autoria

Foto de Roberta Esteves Vieira de Castro

Roberta Esteves Vieira de Castro

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra

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