Parece que as crianças são menos propensas a serem os primeiros casos de Covid-19 em uma mesma família, segundo o estudo Covid-19 in Children and the Dynamics of Infection in Families, publicado no jornal Pediatrics. O objetivo desse trabalho foi descrever a apresentação clínica dos 40 primeiros casos pediátricos de Covid-19 e a dinâmica de seus agrupamentos familiares em Genebra, Suíça.
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Metodologia do estudo sobre infecção em crianças
Os pesquisadores Klara Posfay-Barbe e equipe identificaram, por meio da rede de vigilância do Hospital da Universidade de Genebra, todos os pacientes com idade inferior a 16 anos com infecção pelo vírus SARS-CoV-2 no período de 10 de março a 10 de abril de 2020. Essa rede de vigilância notifica os especialistas em doenças infecciosas pediátricas da instituição sobre os resultados das amostras nasofaríngeas testadas para SARS-CoV-2 por reação em cadeia da polimerase – transcriptase reversa (RT-PCR). Os dados clínicos dos pacientes foram recuperados através de revisões de prontuários e os pais foram chamados para acompanhamento de pacientes e de contatos domiciliares (household contacts – HHC). Os HHC foram considerados suspeitos se tivessem febre ou sintomas respiratórios agudos, conforme a definição de caso do Swiss Federal Office for Public Health’s.
Resultados
Os pesquisadores descreveram que, entre um total de 4310 casos de SARS-CoV-2, 40 tinham menos de 16 anos de idade, correspondendo a 0,9% dos casos. Um paciente para o qual o acompanhamento telefônico não foi possível foi excluído devido à incapacidade de avaliar a evolução clínica e os sintomas de HHC. O acompanhamento médio das famílias foi de 18 dias [intervalo interquartil (IIQ) 14-28].
Apresentação clínica, diagnóstico e manejo:
- Vinte e nove pacientes (74%) eram previamente saudáveis;
- As comorbidades mais frequentemente relatadas foram:
- Asma (10%);
- Diabetes (8%);
- Obesidade (5%);
- Parto prematuro (5%);
- Hipertensão (3%).
- Sete pacientes (18%) foram hospitalizados na enfermaria;
- A duração mediana de internação foi de 3 dias (IIQ 2 – 4);
- Os motivos para a admissão foram:
– Vigilância de pneumonia viral não hipoxêmica (n = 2);
– Febre sem foco (n = 2);
– Evento com risco de vida aparente (n = 1);
– Evento semelhante à sepse (n = 1);
– Uma criança paucissintomática admitida porque ambos os pais tinham Covid-19 grave (n = 1).
- Nenhum paciente necessitou de internação em unidade de terapia intensiva ou terapias específicas para SARS-CoV-2;
- Os outros 32 pacientes foram tratados ambulatorialmente;
- Todos os pacientes tiveram uma resolução completa dos sintomas no sétimo dia após o diagnóstico.
Agrupamentos familiares
- A avaliação do agrupamento familiar revelou um número t de quatro membros por família (IIQ 3 – 4);
- Entre os 111 HHC das crianças estudadas, houve um predomínio de:
- Mães (n = 39);
- Pais (n = 32);
- Irmãos pediátricos (n = 23);
- Irmãos adultos (n = 8);
- Avós (n = 7).
- HHC adulto foi suspeito ou confirmado com Covid-19 antes do estudo na criança em 79% (31/39) dos casos;
- Em apenas 8% (3/39) dos domicílios, a criança do estudo desenvolveu sintomas antes de qualquer outro HHC;
- 85% (75/88) do HHC adultos desenvolveram sintomas em algum momento, em comparação com 43% (10/23) do HHC pediátrico (p < 0,001);
- 92% (36/39) das mães desenvolveram sintomas, em comparação com 75% (24/32) dos pais (p = 0,04).
Discussão sobre Covid-19 em crianças
Os pesquisadores destacaram que uma criança desenvolveu sintomas antes de qualquer outro HHC em apenas 8% dos domicílios. Esses resultados corroboram dados anteriores que mostram que as crianças são casos-índice em menos de 10% dos grupos familiares de SARSCoV-2. Entretanto, o desenho do estudo não permite determinar que a transmissão criança-adulto ocorreu. Além disso existem algumas limitações. Posfay-Barbe e colaboradores descreveram que a amostra provavelmente não representa o número total de casos pediátricos de SARS-CoV-2 durante esse período. De fato, pacientes com apresentação mais leve ou atípica podem não ter procurado atendimento médico. Por fim, a recordação do início dos sintomas entre os HHS pode ser imprecisa, embora isso pareça uma vez menos provável devido às medidas de confinamento e à ansiedade na comunidade.
Conclusão
Esses resultados são relevantes devido ao amplo rastreamento de contatos domiciliares e à quase ausência de perdas no acompanhamento. Além disso, nos mostra que as crianças não parecem ser o principal veículo de transmissão da Covid-19. Por fim, a triagem estendida de casos suspeitos e o rastreamento completo de contatos são necessários para entender melhor a dinâmica da transmissão domiciliar.
Referências bibliográficas:
- Posfay-Barbe KM, Wagner N, Gauthey M, et al. Covid-19 in Children and the Dynamics of Infection in Families [published online ahead of print, 2020 May 26]. 2020;e20201576. doi:10.1542/peds.2020-1576
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