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Pediatria25 novembro 2024

CBMI 2024 - Ressuscitação volêmica em crianças com choque séptico

A sessão temática “Sepse em pacientes pediátricos”, no CBMI 2024, discutiu em uma das palestras a ressuscitação volêmica do choque séptico pediátrico

Na sessão temática “Sepse em pacientes pediátricos”, o Dr. Fabio Joly (Botucatu/SP) ministrou a palestra “A busca do Santa Graal na ressuscitação volêmica do choque séptico pediátrico”. Buscar o “Santo Graal” é uma expressão que remete a uma busca por algo considerado extremamente valioso, muitas vezes inatingível ou cercado de mistério. 

O palestrante destacou que, até pouco tempo atrás, acreditava-se que a ressuscitação volêmica na pediatria deveria ser bem elevada, começando com bolus iniciais de 20 mL/kg. De acordo, inclusive, com a famosa revisão de 2002 “Clinical practice parameters for hemodynamic support of pediatric and neonatal patients in septic shock”, do renomado pesquisador Joseph Carcillo e seus pesquisadores, essa ressuscitação poderia ser de, geralmente, 40 a 60 mL/kg, mas que poderia atingir volumes tão elevados quanto 200 mL/kg. 

Leia mais: CBMI 2024: Confira a cobertura do Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva

ressuscitação volêmica

Recomendações

As últimas recomendações da Surviving Sepsis Campaign já mostram uma estratégia diferente, mais cautelosa, que varia conforme o cenário em que o paciente se encontra e os recursos disponíveis no local: 

  • Na disponibilidade de cuidados intensivos, é sugerida a administração de até 40-60 mL/kg de fluidos em bolus (10-20 mL/kg em bolus) durante a primeira hora, com base em marcadores clínicos do débito cardíaco (DC). Caso haja o desenvolvimento de sinais de sobrecarga de fluidos, a reposição volumétrica deve ser suspensa; 
  • Quando o local não tem disponibilidade de cuidados intensivos e o paciente não se encontra hipotenso, recomenda-se que os fluidos não sejam administrados em bolus, mas sim por meio de hidratação venosa de manutenção; 
  • Quando não há disponibilidade, no local, de cuidados intensivos e o paciente se encontra hipotenso, sugere-se a administração de até 40 mL/kg de volume em bolus (10-20 mL/kg em bolus) na primeira hora, observando-se marcadores clínicos de DC. Caso haja o desenvolvimento de sinais de sobrecarga de fluidos, a reposição volumétrica deve ser suspensa. 

Os marcadores de DC incluem: frequência cardíaca (FC), pressão arterial (PA), tempo de enchimento capilar (TEC), nível de consciência e débito urinário. Além destes marcadores, a reposição volêmica deve ser baseada também por medição do nível sérico de lactato e por monitoração avançada (quando há disponibilidade). Manifestações clínicas de sobrecarga de fluidos englobam: hepatomegalia nova ou pior evolutivamente, e sinais de edema agudo de pulmão 

Por que expandir um paciente? Podemos ter dois grupos de pacientes: um grupo que responde a volume e outro que não responde (esses pacientes podem não ter benefícios e podem até ter malefícios ocasionados pelo volume excessivo). Com base na lei de Frank Starling, nossos pacientes chegam a um ponto de não responder mais ao volume administrado, podendo haver intercorrências.  

Fluido responsividade

O Dr. Fabio chamou a atenção para a compreensão do conceito de fluido responsividade. Nesse caso, o paciente recebe volume que é administrado até o momento em que ele deixa de ser responsivo. No entanto, hoje já se sabe que não precisamos “esgotar” essa responsividade até chegar ao ponto de perceber que o paciente é fluido tolerante. É importante se atentar para quando o paciente vai precisar, não de volume, mas de drogas vasoativas. O ecocardiograma à beira leito nos auxilia muito nessa questão, em não dar volume em excesso e iniciar precocemente um medicamento vasoativo. Há duas formas de interpretação: prever se o paciente é fluido responsivo ou fazer uma prova terapêutica (avaliar). Conforme recomendações da Surviving Sepsis Campaign, existem evidências de que a forma mais fiel de previsão é por meio do ΔV PIC (variação da velocidade de pico do fluxo sanguíneo aórtico): usando o doppler, mede-se a velocidade do fluxo através da válvula aórtica. Quando ocorre variação na inspiração e na expiração >15%, esse paciente é fluido responsivo. Se o paciente não atingir esse valor, não precisamos investir em volume, podemos já iniciar mais precocemente uma droga vasoativa. Para saber se a droga foi ou não efetiva (avaliar), mede-se o índice cardíaco (IC) antes e depois e vejo se há variação (>10-15%). 

O palestrante também mostrou a recente revisão sistemática com metanálise de Lintz e colaboradores sobre o acúmulo de fluidos em crianças criticamente enfermas (“Fluid accumulation in critically ill children: a systematic review and meta-analysis”). Esse estudo brasileiro mostrou que o acúmulo de fluidos é altamente prevalente entre crianças graves e está significativamente associado a desfechos ruins. Além disso, os pesquisadores ressaltaram que a heterogeneidade significativa observada nos conceitos de acúmulo de fluidos entre os artigos avaliados aponta para um grande desafio de definir essa condição em pediatria. Infelizmente, de acordo com o estudo, o termo “sobrecarga hídrica” é constantemente utilizado como sinônimo de “hipervolemia”, o que pode levar à confusão e, consequentemente, a decisões terapêuticas desacertadas. Para ilustrar essa situação, p Dr. Fabio mostrou o editorial “We should avoid the term “fluid overload”, escrito pelos pesquisadores Jean-Louis Vincent e Michael Pinsky. O termo “sobrecarga hídrica” deve ser evitado quando nos referimos ao paciente com hipervolemia. A sobrecarga hídrica se refere ao paciente que possui complicações devido ao excesso de líquidos, como alterações de sistema nervoso central, alteração de função cardíaca, prejuízo de trocas gasosas (por aumento de líquido intersticial dos pulmões), disfunção renal, disfunção hepática, hemodiluição, dentre outras consequências deletérias ao paciente. 

Veja também: CBMI 2024: Controvérsias no manejo do choque séptico

Com relação ao conceito de fluido tolerância, o Dr. Fabio comentou sobre o escore VEXUS, que avalia o excesso de líquidos no sistema venoso. Este escore é utilizado em pacientes adultos. No entanto, já existe um movimento para se aplicar este escore em crianças. Trata-se de uma medida para ser aplicada à beira-leito, auxiliando rapidamente na tomada de decisões. O artigo “Feasibility and Utility of the Venous Excess Ultrasound Score to Detect and Grade Central Venous Pressure Elevation in Critically Ill Children” (Menéndez-Suso, Rodríguez-Álvarez e Sánchez-Martín, 2023). Para fazer a avaliação, é necessário analisar as veias hepática, porta e renal e suas ondas, no doppler, normais e anormais. Todavia, apesar de ter sido utilizado o padrão de observação de três veias, como é feito na população de adultos, os pesquisadores perceberam que a veia renal, isoladamente, já tem poder de identificação. Então, provavelmente, não haverá necessidade das três veias para a avaliação do VEXUS em pediatria. Mas atenção: o VEXUS não deve ser usado depois de serem esgotadas as quantidades de volume que seriam feitas. O VEXUS deve ser feito em paralelo.  

Mensagens finais 

Diante de um paciente pediátrico com choque séptico, temos que responder duas questões: 

É fluido responsivo? Sim ou não? 

Se sim, já se deve perguntar: 

É fluido tolerante? Sim ou não? 

Se o paciente é fluido responsivo, mas não é fluido tolerante, ele não deve receber volume: o suporte inotrópico deve ser otimizado.  

Se o paciente é fluido responsivo, mas é fluido tolerante, ele pode ter benefício se receber volume. 

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