O câncer colorretal (CCR) pediátrico é uma condição rara, com incidência estimada de 1–2 casos por milhão. Apesar disso, observa-se um aumento de casos em jovens nas últimas décadas. O diagnóstico é frequentemente tardio, devido à apresentação clínica inespecífica e à baixa suspeita por parte dos profissionais de saúde. Muitos casos estão associados a síndromes genéticas como a Síndrome de Lynch (LS), a Deficiência Constitucional de Reparação de Mismatch (CMMRD), e doenças inflamatórias intestinais como a colite ulcerativa.
Na tentativa de melhor elucidar as evidências sobre essa condição, foi realizada uma busca sistemática na base PubMed em março de 2025, com o termo “pediatric colorectal cancer” e filtro de publicações do último ano. Foram identificados 414 artigos, dos quais 10 foram selecionados por atenderem aos critérios de inclusão: estudos com dados originais sobre pacientes pediátricos (0–19 anos), com foco em perfil molecular, diretrizes de triagem e estratégias terapêuticas. Veja os resultados em destaque abaixo:

Resultados
- Características clínicas: Os sintomas mais comuns foram dor abdominal, distensão, vômitos, hematochezia, obstrução intestinal e intussuscepção. O tempo médio até o diagnóstico foi de 8 a 10 semanas, com muitos casos já em estágio avançado (III–IV).
- Perfil molecular: O CCR pediátrico apresenta assinaturas genéticas distintas em relação ao CCR adulto. Há maior prevalência de mutações em RNF43, PIK3CA, ATR, CDK6 e KMT2D, com menor frequência de mutações em APC. A deficiência de MMR e instabilidade de microssatélites (MSI-H) são comuns em casos associados a LS e CMMRD.
- Triagem e vigilância: Diretrizes atualizadas recomendam triagem precoce em crianças com risco genético, com colonoscopia iniciando entre 6 e 15 anos, dependendo da síndrome. Ferramentas como testes de MSI, imunohistoquímica (IHC) e perfis de metilação (ex.: mR-124) estão sendo integradas à avaliação de risco.
- Tratamento: A ressecção cirúrgica é o tratamento principal. Quimioterapia adjuvante (FOLFOX, CAPOX) é usada em estágios II/III. Terapias-alvo (bevacizumabe, cetuximabe) e imunoterapia (pembrolizumabe) são exploradas em casos avançados com MSI-H. A cirurgia guiada por fluorescência com verde de indocianina (ICG-F) mostrou benefícios em ressecções precisas.
Conclusão
O câncer colorretal pediátrico é molecularmente distinto do CCR adulto, com implicações importantes para o diagnóstico, triagem e tratamento. A alta prevalência de mutações em RNF43 e alterações epigenéticas como a metilação de mR-124 indicam caminhos promissores para terapias-alvo e biomarcadores de triagem. A presença frequente de síndromes hereditárias reforça a necessidade de triagem genética precoce e vigilância intensiva.
A abordagem terapêutica ainda se baseia em protocolos adultos, mas há evidências crescentes da necessidade de estratégias específicas para a faixa etária pediátrica, incluindo o uso de tecnologias como cirurgia guiada por fluorescência e terapias personalizadas baseadas em perfil genético.
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Mensagem prática
Pediatras devem manter alta suspeita clínica em crianças e adolescentes com sintomas gastrointestinais persistentes, especialmente dor abdominal, sangramento retal e perda de peso. É essencial considerar a possibilidade de CCR mesmo em pacientes jovens, principalmente se houver histórico familiar de câncer ou doenças genéticas associadas.
A triagem genética deve ser iniciada precocemente em pacientes com síndromes como FAP, LS, PJS e CMMRD. A integração de biomarcadores epigenéticos e testes moleculares pode auxiliar na detecção precoce e na personalização do tratamento. O encaminhamento rápido para avaliação especializada e abordagem multidisciplinar é fundamental para melhorar os desfechos clínicos.
Autoria

Jôbert Neves
Médico do Departamento de Pediatria e Puericultura da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP), Pediatria e Gastroenterologia Pediátrica pela ISCMSP, Título de Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Coordenador Young LASPGHAN do grupo de trabalho de probióticos e microbiota da Sociedade Latino-Americana de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (LASPGHAN).
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