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Oncologia9 fevereiro 2024

Emagrecimento é um sinal de alarme acurado para malignidades?

Avaliação com 157.474 profissionais de saúde, acompanhados entre 1978 e 2016, verificou a relação entre emagrecimento e malignidade

Por Leandro Lima

Na prática clínica cotidiana é comum nos depararmos com pacientes em que constatamos a perda de peso não intencional. A síndrome consumptiva, geralmente definida por emagrecimento de ao menos 5% em seis meses, nos leva a preocupações diversas, entre as quais o desenvolvimento de malignidades, especialmente entre os indivíduos com mais de 60 anos.

O questionamento levantado, portanto, é o seguinte: qual a real chance de estarmos presenciando os pródromos de uma doença oncológica? A preocupação oncológica é corroborada pelo fato de que as doenças malignas respondem por um a cada cinco mortes nos EUA, com dados brasileiros semelhantes.

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Emagrecimento como sinal de malignidade

Análise recente

O estudo publicado em janeiro de 2024 no JAMA por Wang e colaboradores retrata a análise de uma coorte prospectiva americana que contemplou 157.474 profissionais de saúde, acompanhados entre 1978 e 2016, com tempo médio de seguimento de 28 anos e alocados a partir dos 40 anos nos estudos NHS e HPFS.

A mediana de idade foi de 62 anos, com predomínio de mulheres (71,1%) e da etnia branca (95,2%). Em um seguimento de 1,64 milhão de pessoas-ano, foram diagnosticados 15.809 novos casos de câncer, com uma taxa de incidência de 964 casos/100.000 pessoas-ano.

Os fatores de confusão para o emagrecimento buscaram ser elucidados a partir da identificação de comorbidades (DM2 descompensado, IAM recente, insuficiência cardíaca, doenças inflamatórias intestinais e depressão) e da intencionalidade do emagrecimento, abordada por questionários sobre a qualidade da dieta e a prática e intensidade de atividade física.

Outras variáveis analisadas incluíram a história familiar de malignidades, tabagismo, etilismo, índice de massa corporal, status de menopausa e terapia de reposição hormonal.

Observou-se que o emagrecimento recente, instalado nos últimos dois anos e superior a 10%, se associou a maior incidência de malignidades diagnosticadas no período de 12 meses subsequentes em comparação à ausência de emagrecimento: 1.362 vs. 869 casos/100.000 pessoas-ano (diferença entre grupos de 493 casos/100.000 pessoas-ano — IC 95%: 391 a 594, P < 0,001).

No grupo de baixa intencionalidade de emagrecimento, definido pela ausência de melhora da qualidade da dieta ou intensificação da prática de atividade física, a perda ponderal superior a 10% associou-se de forma mais robusta com o diagnóstico de neoplasias malignas em comparação ao grupo controle: 2.687 vs. 1.220 casos/100.000 pessoas-ano (diferença entre grupos de 1.467 casos/100.000 pessoas-ano — IC 95%: 799 – 2.135, P < 0,001).

Entre os pacientes com diagnóstico estabelecido de malignidade, 5% apresentaram emagrecimento superior a 10% e 15% apresentaram emagrecimento além de 5% do peso corporal nos 2 anos precedentes. O tempo médio entre o relato de mudança do peso e o diagnóstico oncológico foi de 6 meses.

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O risco absoluto anual de diagnóstico de malignidade foi de 3,2% (IC 95%: 2,4 – 4%) entre os pacientes com emagrecimento superior a 10% e baixa intencionalidade de emagrecimento, em comparação a 1,3% (IC 95%: 1,2 – 1,3%) no grupo sem perda ponderal recente (diferença entre os grupos: 1,9% – IC 95%: 1,1 – 2,7% – P < 0,001). O tabagismo potencializou o risco de malignidades entre os pacientes com emagrecimento (P < 0,05).

Os cânceres mais prevalentes no cenário de síndrome consumptiva foram os do trato gastrointestinal alto (esôfago, estômago, fígado, trato biliar ou pâncreas), hematológicos (linfoma não Hodgkin, mieloma múltiplo e leucemia), colorretal e pulmonar, nessa ordem. Por sua vez, não foi identificada associação estatística significativa entre emagrecimento e cânceres de mama, urogenitais, do sistema nervoso central ou melanoma. O emagrecimento não distinguiu entre os pacientes acometidos por doença localizada ou metastática (21,5% vs. 25,8%).

Conclusão e mensagens práticas 

  • O emagrecimento recente, especialmente o não intencional, se associou a risco significativamente maior de diagnóstico de malignidades nos 12 meses subsequentes, com destaque para os cânceres do trato gastrointestinal superior;
  • Apesar da impossibilidade de generalização dos dados para a população brasileira, os achados reforçam a necessidade de se considerar a investigação de malignidades diante de síndrome consumptiva, especialmente entre os tabagistas. Entretanto, destaca-se que a taxa anual de malignidade foi de 3,2% no subgrupo de maior risco, o que nos leva a contestar a custo-eficácia de uma avaliação exaustiva para malignidades nesse cenário;
  • As principais limitações do estudo incluíram a obtenção de dados por meio de questionários aplicados com intervalos temporais grandes (bianuais); o peso ter sido exclusivamente obtido por meio de autorrelatos; a ausência de discriminação da velocidade de emagrecimento; e ter se tratado apenas de profissionais de saúde americanos, que têm um maior nível de atenção sobre os sinais de alarme para malignidades e maior facilidade de acesso aos serviços de saúde.

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