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Neurologia11 fevereiro 2025

Quando suspeitar de síndrome de túnel do carpo secundária à hanseníase neural? 

Estudo analisou o padrão de comprometimento do nervo mediano na hanseníase por meio do estudo da condução nervosa e avaliação ultrassônica
Por Danielle Calil

O Brasil é o segundo país com maior índice de casos de hanseníase no mundo. Trata-se de doença infecciosa, causada pela bactéria Mycobacterium leprae, na qual pode gerar danos ao sistema cutâneo e nervoso do indivíduo. 

A hanseníase representa a etiologia infecciosa principal de casos de neuropatias periféricas. O acometimento dos nervos periféricos na hanseníase é heterogêneo, variando conforme apresentação clínica, gravidade, extensão do envolvimento a depender da resposta imunológica do paciente. Na maioria dos casos, a neuropatia hansênica é predominantemente sensitiva e com padrão de mononeuropatia múltipla. 

A síndrome do túnel do carpo (STC) clássica é comum, causada pela compressão do nervo mediano dentro do canal carpal, que é formado por ossos carpais e pelo flexor retinaculum. Algumas patologias são associadas à STC, como: diabetes mellitus, artrite reumatoide e hipotireoidismo.  

Leia também: Abordagem diagnóstica da hanseníase

Há casos descritos de síndrome do túnel do carpo relacionadas à hanseníase neural. Entretanto, a alta prevalência de STC clássica é possivelmente uma razão para não ser diretamente relacionada a causas infecciosas. Nesse contexto, em 2024, a revista brasileira Arquivos de Neuropsiquiatria publicou estudo que se propõe a fornecer insights para considerar STC secundária à hanseníase através de exames de eletroneuromiografia e ultrassonografia de nervos.  

Como foi o estudo? 

Trata-se de estudo brasileiro, observacional, transversal, comparando dois grupos: 15 pacientes diagnosticados com STC secundária à hanseníase e 14 pacientes com STC clássica. Os critérios de elegibilidade para o grupo com hanseníase consistiam: diagnóstico de hanseníase neural primária com evidencia clínica de dano sensitivo-motor no território do nervo mediano. Para tal, os participantes deveriam apresentar neuropatia periférica associada à ausência de lesões cutâneas e baciloscopia negativa em esfregaço cutâneo, mas com evidência histopatológica de infecção por M. leprae em biópsia do nervo periférico. Ambos os grupos foram submetidos à eletroneuromiografia e à ultrassonografia de nervo periférico pelos mesmos investigadores.  

Entre os 29 pacientes avaliados, a amostra apresentou idade média de 42,9 anos e majoritariamente feminina (55,2%). A maioria dos participantes de ambos os grupos tinham acometimento bilateral do nervo mediano (92,8% em STC clássica e 80% em STC secundária à hanseníase), totalizando 27 nervos afetados em cada grupo. Todos os participantes do estudo eram sintomáticos, isto é, apresentavam sintomas de parestesias em território do nervo mediano. 

Na ultrassonografia de nervo, através da área de secção transversa (AST) do segmento do túnel carpal (Mt), verificou que 63% dos nervos com STC clássica e 74,1% com STC hansênica estavam espessados. Já a AST do segmento proximal ao túnel carpal (Mpt) apresentou espessamento em apenas 3,7% no grupo STC clássica e 96,3% no grupo STC hansênica (p < 0,0001), com uma média de 6,6 e 17, respectivamente (p < 0,001). 

No exame de eletroneuromiografia, 88,9% dos nervos do grupo com STC hansênica e apenas 7,4% do STC clássico apresentaram redução da velocidade de condução no antebraço distal (p < 0,0001), com média de 41 m/s e 53 m/s respectivamente (p < 0,0001).  

Quando suspeitar de síndrome de túnel do carpo secundária à hanseníase neural? 

Mycobacterium leprae em paciente. Imagem de CDC/Arthur E. Kaye

Comentários: síndrome de túnel do carpo secundária à hanseníase neural

Esse estudo brasileiro se propôs a investigar características fornecidas por exames complementares que possam auxiliar na distinção entre síndrome do túnel do carpo clássico versus secundária à hanseníase. Embora esses exames complementares não ofertem o diagnóstico etiológico da neuropatia periférica, ao serem associados à avaliação clínica, proporcionam dados que auxiliam a pensar em uma etiologia em detrimento de outra. 

A presença de espessamento neural isoladamente no nível do túnel carpal não foi suficiente para realizar o diagnóstico diferencial entre ambas as condições nesse estudo, mas a presença de espessamento neural e desmielinização nos segmentos proximais ao túnel carpal favoreceu o diagnóstico para hanseníase. Ainda que a ultrassonografia e a ENMG não forneçam informações etiológicas acerca da distinção das duas etiologias em questão, a característica do espessamento neural e da desmielinização observados em segmentos próximos ao túnel do carpo favoreceu o diagnóstico para hanseníase nesse estudo.  

Saiba mais: Neuropatia autonômica em pacientes com diabetes

Uma boa contribuição desse artigo é fornecer dados para o diagnóstico diferencial de neuropatias hipertróficas, o que pode ser desafiador, principalmente em áreas endêmicas de hanseníase como o Brasil. 

Mensagem prática 

Exames de ultrassonografia e eletroneuromiografia são boas ferramentas na investigação de neuropatia hansênica. Em casos de acometimento do nervo mediano, presença de espessamento neural e de desmielinização em segmentos proximais ao túnel do carpo podem favorecer a consideração para a etiologia hansênica.

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