Logotipo Afya
Anúncio
Neurologia26 setembro 2025

Hematoma subdural crônico: avanços em diagnóstico, tratamento e novas perspectivas

Revisão sobre as características do hematoma subdural crônico, aspectos, apresentação, fisiopatologia, modalidades terapêuticas e o futuro
Por Danielle Calil

O hematoma subdural crônico (HSC) é a condição neurocirúrgica craniana mais frequente entre adultos, cuja incidência tem aumentado de forma significativa devido ao envelhecimento populacional e ao uso disseminado de medicamentos antitrombóticos. As opções convencionais de tratamento são limitadas, com altas taxas de recorrência do HSC apesar da evacuação cirúrgica, além de riscos substanciais de morbidade e mortalidade periprocedimento. Recentemente, a embolização da artéria meníngea média (EAMM) surgiu como um tratamento inovador e promissor para o HSC, especialmente no que diz respeito à prevenção da recorrência e à promoção da reabsorção do hematoma. 

Este ano, a revista Neurology publica estudo de revisão sobre o tema, com discussões sobre aspectos contemporâneos em epidemiologia, apresentação clínica, fisiopatologia, métodos de imagem e modalidades terapêuticas do HSC, além de futuras direções na área.   

Apresentação clínica e diagnóstico do hematoma subdural crônico (HSC) 

A apresentação clínica é variável, indo de casos assintomáticos até estados de coma. Os pacientes podem apresentar sintomas diversos, como: instabilidade da marcha, crises epilépticas, cefaleia, déficit motor focal ou alterações do estado mental. Embora alguns indivíduos com HSC tenham história conhecida de traumatismo craniano e/ou hematoma subdural traumático, muitos não apresentam esse antecedente. Além disso, comorbidades médicas também são comuns, especialmente aquelas associadas a coagulopatias (ex. doenças renais, hepáticas e câncer) e condições que requerem uso de medicamentos antitrombóticos (como doenças cardiovasculares e tromboembolismo). 

O diagnóstico de hematoma subdural crônico é realizado principalmente por tomografia computadorizada (TC), que mostra coleções subdurais iso ou hipodensas em relação à substância cinzenta. Vale destacar que hematomas subdurais predominantemente hiperdensos provavelmente representam hematomas de instalação aguda, que podem corresponder a um processo patológico distinto.  

Não existem critérios diagnósticos formalmente estabelecidos para HSC. Embora a cronicidade seja uma característica marcante, o início do HSC costuma ser insidioso, e um critério temporal para o diagnóstico tem utilidade limitada na prática clínica. Diversos sistemas de categorização foram propostos, sendo o sistema de classificação de Nakaguchi o mais citado. Esse sistema foi desenvolvido para prever taxas de recorrência após o tratamento e divide os HSC em quatro categorias: homogêneo, laminar, separado e trabecular. Os subtipos homogêneos e laminar são considerados “mais recentes”, enquanto os subtipos separados seriam mais crônicos e, portanto, mais propensos a recorrência após o tratamento. Já os subtipos trabeculares estariam associados à resolução do HSC, com baixo risco de recorrência.  

Tratamentos disponíveis e suas evidências 

Os hematomas subdurais crônicos são tratados de forma cirúrgica ou conservadora. De modo geral, pacientes com sintomas neurológicos graves e de rápida evolução (ex. comprometimento do nível de consciência ou déficits motores evidentes) necessitam de evacuação cirúrgica imediata. Por outro lado, para pacientes com sintomas leves e estáveis, não existe atualmente um consenso sobre o manejo ideal. O tamanho do hematoma é frequentemente considerado na seleção de pacientes para cirurgia, sendo que HSCs maiores (espessura ≥10 mm e/ou desvio de linha média ≥ 5 mm) tendem a ser operados, enquanto hematomas menores (espessura < 10 mm ou desvio de linha média < 5 mm) são usualmente acompanhados apenas com observação. 

O tratamento cirúrgico dos HSCs pode ser classificado em três técnicas: irrigação e drenagem por orifício de trépano, trefinação por trépano de rosca (ex. sistema subdural de evacuação – SEPS) e grandes craniotomias. Uma revisão sistemática com metanálise publicada em 2012 revelou que as taxas de mortalidade associadas a esses procedimentos eram elevadas (até 13% para irrigação por trépano, 8% para trefinação por trépano de rosca e 17% para grandes craniotomias), assim como as taxas de complicações cirúrgicas (até 25%, 18% e 25%, respectivamente). 

Quanto ao tratamento conservador, dados iniciais da década de 1970 sugeriam que aproximadamente 40% dos HSCs poderiam se resolver espontaneamente, sem intervenção cirúrgica. No entanto, até 20% dos pacientes inicialmente acompanhados de forma conservadora evoluíam para necessidade de drenagem cirúrgica. Evidências mais contemporâneas sobre manejo conservador são escassos, e as opções de tratamento clínico permanecem limitadas. Atualmente, também não existem diretrizes padronizadas sobre como manejar coagulopatias ou o uso de medicamentos antitrombóticos para esses pacientes.  

Considerando o microambiente pró-inflamatório como pertencente à patogênese do HSC, agentes atuantes em vias inflamatórias vêm sendo investigados. A dexametasona é um exemplo que, apesar de sido associada à menores necessidades de recorrências cirúrgicas, teve relação com piores desfechos clínicos globais. A atorvastatina foi testada em pacientes com HSC não cirúrgicos diante de suas propriedades anti-inflamatórias, em que em ensaio clínico de fase II houve redução significativa do volume do HSC em 8 semanas; ainda assim, ensaios adicionais são necessários para confirmar sua eficácia.   

Ensaios clínicos recentes na área 

A maior inovação terapêutica no HSC é a embolização da artéria meníngea média (EAMM). O racional é interromper o suprimento sanguíneo às neomembranas frágeis, reduzindo a exsudação contínua e favorecendo a absorção do hematoma (considerando principalmente que esta artéria é o principal suprimento vascular da dura-máter).  

Nesse sentido, a EAMM vem sendo estudada como tratamento adjuvante à cirurgia, visando reduzir recorrência, e também como opção isolada para pacientes que não são candidatos à cirurgia (por comorbidades graves ou necessidade de manter uso de antitrombóticos), além daqueles com hematomas menores e sintomas leves (como nos pacientes com escores de 0–2 na escala de Markwalder). 

Vários ensaios clínicos randomizados já foram concluídos para avaliar a EAMM no tratamento dos HSCs, e muitos outros estão em andamento. Recentemente, foram publicados os resultados de três estudos: EMBOLISE, MAGIC-MT e STEM. O estudo EMBOLISE demonstrou redução significativa na recorrência em 90 dias quando EAMM foi associada à cirurgia em comparação com cirurgia isolada (4,1% vs. 11,3%; p = 0,008). Já no MAGIC-MT, a EAMM combinada ao manejo convencional (cirurgia ou observação) não reduziu significativamente as taxas de recorrência ou progressão em relação ao manejo convencional isolado (6,7% vs. 9,9%; p = 0,11), mas foi associada a menor risco de eventos adversos graves como óbito, doença/lesão fatal, deficiência permanente, necessidade de hospitalização prolongada (6,7% vs. 11,6%; p = 0,021). Por fim, o estudo STEM demonstrou que a EAMM combinada ao tratamento convencional (cirurgia ou observação) levou a taxas significativamente menores de falha terapêutica em 180 dias em comparação ao tratamento convencional isolado (15,2% vs. 39,2%; p = 0,0001).  

Futuras direções 

O HSC é uma doença heterogênea, tanto em aspectos radiológicos quanto clínicos. Futuras pesquisas devem buscar biomarcadores radiológicos, como padrões de membranas observados na tomografia de dupla energia, para estratificação de risco e seleção de pacientes para EAMM. Além disso, há necessidade de compreender melhor a influência das comorbidades, especialmente coagulopatias e uso de antitrombóticos, na resposta ao tratamento. 

Outra lacuna importante diz respeito à escolha ideal do agente embólico, já que os estudos atuais usaram diferentes materiais (líquidos, partículas, adesivos). Ensaios comparativos futuros poderão definir a melhor estratégia. Também se faz necessário investigar se a EAMM pode substituir a cirurgia em determinados subgrupos de pacientes, reduzindo a necessidade de intervenções invasivas.  

Mensagem prática 

O hematoma subdural crônico é uma condição em crescimento global, com impacto clínico relevante e manejo historicamente desafiador. A embolização da artéria meníngea média surge como uma terapia promissora, respaldada por ensaios clínicos recentes, capaz de reduzir a recorrência e favorecer a reabsorção do hematoma. A prática clínica deve considerar a EAMM como uma opção cada vez mais sólida, especialmente em pacientes com risco elevado para cirurgia ou em associação ao tratamento convencional.

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Compartilhar artigo

Referências bibliográficas

Newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Anúncio

Leia também em Neurologia